Frank Jorge esclarece o que é, afinal, esse tal de rock gaúcho

TEXTO Daniel Sanes

FOTOS Demétrio Pereira

“É difícil comparar Los Hermanos e Fresno. Não desmerecendo Fresno, mas eles pegam um público adolescente, e acho difícil isso mudar”

Jorge Otávio Pinto Pouey de Oliveira, mais conhecido como Frank Jorge, dispensa apresentações. Ou pelo menos deveria dispensar.

Mais conhecido como vocalista e baixista da Graforréia Xilarmônica, o coordenador do curso de Produtores e Músicos de Rock da Unisinos recebeu a reportagem do Nonada para uma entrevista que acabou virando um papo informal. O assunto? Música, claro. Rock, de preferência.

Mesmo já tendo concedido inúmeras entrevistas – algumas até desagradáveis, como você poderá notar em uma das respostas dele – , este colorado convicto esbanja simpatia. E jogo de cintura para conversar com a gente, atender o telefone, afagar o cachorro Sushi e brincar com a filha caçula, Glória, de seis anos – além dela, Frank é pai de dois rapazes: Rafael, de 19, e Érico, de 12.

E pensar que esse cara simples, família – casado com a também simpatissíssima Daniela – criou um dos hinos do rock gaúcho (“Amigo Punk”). Bom, se você ainda não sabia de quem se tratava, agora já sabe, não? Caso contrário, vá correndo para a Wikipedia, e depois volte aqui.

Nonada – O termo rock gaúcho acabou meio que virando um rótulo. Tu achas que com o fato de bandas como Cachorro Grande e Pública terem saído daqui isso não existe mais?

Frank Jorge – Eu acho que tem uma questão histórica que é boa de apontar, mesmo que possa não ser a única resposta pra a expressão “rock gaúcho”: o lançamento, em 1985, do disco Rock Grande do Sul. Veio depois daquele boom nacional, com Blitz, Paralamas do Sucesso… Daí a [gravadora] RCA veio conferir o Festival de Rock do Unificado aqui em Porto Alegre, no Gigantinho. Eles viram que tinha uma cena e resolveram contratar as cinco bandas da coletânea  – Replicantes, Engenheiros do Hawaii, TNT, De Falla e Garotos da Rua – e uma sexta, o Nenhum de Nós. Tudo bem, existia rock gaúcho antes, com Liverpool, Bixo da Seda, Almôndegas, Saracura… Como em qualquer lugar do mundo, sempre teve rock no Rio Grande do Sul, nos anos 60, 70… Mas acho que foi a partir dessa data, o ano de 1985, com o Rock Grande do Sul, que teve início essa expressão, rock gaúcho. Mas era um rock que não tinha uma cara só, eram bandas autorais, muito diferentes uma da outra.

Nonada – Os estilos, as vertentes, podiam ser diferentes. A ligação entre as bandas era o fato de serem daqui.

Frank Jorge – Sim. E daí, com o passar do tempo, o rock gaúcho ficou muito vinculado, pra mim, ao rock da segunda metade dos anos 80. Daí tu encaixas outras bandas que também despontaram e um outro aspecto que representa um pouco o rock gaúcho: são bandas que não se radicaram no Rio ou em São Paulo, ficaram aqui. Júlio Reny, Tequila Baby… O Wander Wildner, mesmo sendo um cara que circula muito, por mais que seja trovador solitário, folk, brega, seja o que for que o chamem, pra mim é rock gaúcho. Mas tem bandas da década de 90, e daí já é uma outra safra – Comunidade Ninjitsu, Acústicos & Valvulados, Ultramen… Já é mais difícil dizer se isso é rock gaúcho ainda ou não é. E nos anos 2000 eu acho que isso foi pro brejo, porque tem muita banda circulando pelo Brasil em festivais, que nem toca tanto no Rio Grande do Sul, não tem tanta visibilidade ou toca em rádio. Superguidis, por exemplo: é meio despropositado chamar Superguidis de rock gaúcho, o som deles tem influência dos anos 90, de Guided by Voices, Pixies, Sonic Youth. Então acho que o tema vai ficando complexo. Eu gosto de fazer uma outra leitura: as bandas que saem daqui, que surgem e conseguem se erradicar em outros estados, estabelecem nexo com agências, com grupos de comunicação, têm uma agenda nacional de shows, acho que usam menos ainda esse rótulo. Para elas, o que importa é sua produção musical e sua relação com o mundo de um modo geral. Eu diria que Cachorro Grande tem um pouco isso de tentar se ver não como rock gaúcho, e a Fresno, mais ainda. Até esses tempos fui completamente mal interpretado numa entrevista. Uma questão que o professor Muniz Sodré falou no Observatório da Imprensa, de quando acontece de o cara falar um tempão com um jornalista para deixar tudo bem claro e o cara acaba às vezes usando só uma parte.

Nonada – Descontextualiza tudo. Por isso eu tô gravando essa entrevista. (risos)

Frank Jorge – É (risos). Aconteceu isso recentemente com a Zero Hora, eu falei a uma jovem repórter que eu achava ingênuo o cara que sai de um lugar tentar negar sua identidade, por mais que o som dele seja universal, sintonizado com tendências. Tá, só ouve Muse e Korn, mas morava em, sei lá… Lagoa Vermelha. O teu som pode não ter nada a ver com Lagoa Vermelha, Passo Fundo, Porto Alegre, mas de algum modo isso tá na tua identidade. E eu falei pra ela que achava um tanto ingênuo um artista negar seus referenciais culturais, sua origem. Só que do jeito que saiu na matéria ficou ruim, os caras de ingênuos não têm nada, tem até um caráter super-empreendedor. Tenho uma relação tri boa com a Cachorro, mas o que o falei saiu distorcido. Por sorte, não deu nenhum problema. A partir do que eu falei, a jornalista comentou com o pessoal da Fresno, e eles disseram: “não, mas a gente até tem relação com o Rio Grande do Sul, a gente convidou o Neto Fagundes pra participar de um show nosso”. Tipo, o cara não entendeu, né! (risos) Hoje eu tenho uma postura mais madura, esclarecida, de saber reconhecer o mérito dos outros, uma coisa que não se tem na “gurizice”. Tenho um grande reconhecimento por essas bandas, mas não vamos entrar na linguagem musical… Eu tenho muito respeito, amizade com o pessoal da Cachorro – e pela Fresno, da mesma maneira. São bandas que realmente extrapolaram um pouco essa discussão.

 “O pessoal tem acesso a tanta informação, equipamento, know-how, mas, mesmo tendo tudo isso, faz o som mais careta possível. Eu acho legal quando a banda pega as referências e tenta utilizar aquilo, mas transformar em outra coisa.”

Nonada – Vinte e tantos anos depois que começou essa cena, tu achas que lá fora está um pouco desgastado esse negócio de rock gaúcho? Será que o pessoal vê isso como bairrismo?

Frank Jorge – Cada geração tem seus anseios. O pessoal dos anos 80 ainda tinha o rescaldo da ditadura militar, por isso um monte de letra dizendo qualquer coisa, dizendo bobagem. Eu estava um pouco inserido nisso. Não vivenciei de maneira crucial as questões da ditadura, mas eu era uma criança que nasceu nesse período. Quando se começa a ter uma via de expressão, tem esse caráter de ter uma linguagem pop, de estar sintonizado com o que acontecia no Brasil. Hoje o pessoal já possui uma noção mais clara de ter um trabalho com linguagem artística, uma estética de som e letra, e vê isso como uma profissão com mais imediatismo. Então o pessoal não tá muito preocupado com algumas questões, com algumas discussões. Não tá preocupado se é rock gaúcho ou não, e, lá fora, eu acho que também não existe isso. Existe hoje algo que é natural e identificado, que são as cenas de vários estados. Hoje em dia essas cenas dialogam mais, tem cena de Belém, de Recife, do Rio, de São Paulo… O pessoal segue curtindo essa diversidade musical que tem aqui. Hoje é muito forte o samba rock, que impera na João Alfredo, na Lima e Silva, tem muita banda desse estilo. Mas também tem muita banda “profi” de heavy metal, bandas muito boas como Distraught, Hibria, e Krisiun, que hoje toca mais no exterior. E tem sempre essa recorrência de Beatles e Stones. Algumas têm essas influencias, mas também de Strokes, Franz Ferdinand… E há muitas bandas que têm uma relação boa com os veteranos do rock gaúcho, mas não têm essa preocupação de serem vinculadas a ele. Efervescentes, Valentinos, Apanhador Só, Subtropicais…

O quarto disco solo de Frank Jorge está em vias de ser aprovado pelo Frumproarte.

Nonada – Tu coordenas o curso de Músicos e Produtores de Rock da Unisinos. Já disseste que as bandas hoje são muito mais profissionais. Os alunos que entram no curso também já vão com essa mentalidade? Ou ainda tem gente que vai sem muita pretensão, tipo: “quero tocar rock. Se tiver sucesso, ok, senão, fico na garagem?”

Frank Jorge – Sem dúvida, o pessoal já vai com muito mais noção. Sempre falo disso no curso. Quando a gente começou era um pessoal do Instituto de Educação: o Tchê Gomes (ex-TNT), o Márcio Petracco (ex-TNT, Cowboys Espirituais), outros caras que não seguiram adiante, mas tocaram lá no inicio, e outros que eram vizinhos de infância, como o Marcelo e o Alexandre Birck (ambos parceiros de Frank na Graforréia Xilarmônica). A gente curtia música, mas também futebol. Assim como a gente se reunia pra jogar bola, ia pra Redenção, se juntava pra curtir um som, pra pegar os bolachões dos irmãos mais velhos e conhecer melhor Led Zeppelin, Beatles, Roberto Carlos, acompanhar as coisas novas q estavam surgindo, como B-52s, Devo, Prince, Stray Cats… Isso acho que difere bastante a gente desse pessoal de hoje. A galera tem uma perspectiva pé no chão. Não sei se no fundo, no fundo, um ou outro não tem a ilusão de ser um artista, um rock star, mas parecem todos muito centrados em dominar tudo o que a gente oferece no curso, essa noção de direitos autorais, legislação, software de áudio, relação com o mercado, com casas noturnas, festivais, história da música… A gente foi aprendendo isso tudo aos pedacinhos, começou muito pelo prazer, pela diversão. Acho que o pessoal de hoje em dia também tem prazer, diversão, mas quer se tornar independente financeiramente mais cedo, e tem o apoio da família. Não que nós não tivéssemos, mas hoje esse tipo de apoio é maior.

Nonada – Há 20 anos, se alguém te falasse sobre um curso para músicos de rock, o que tu irias pensar? Tu mesmo falaste que hoje tens mais maturidade para avaliar algumas coisas, mas como seria naquela época?

Frank Jorge – (Risos) Cara, é muito difícil dizer… Mas acho que encararia como algo normal, até porque fiz curso de Letras na PUC, depois desisti da licenciatura em inglês. Na época me interessei por música e literatura, atuei bastante como aluno pesquisador. Não levei adiante o mestrado porque acabei tendo outras preocupações, tive meu primeiro filho, mas com certeza eu teria curiosidade em conhecer. Sempre fui dizendo sim para as oportunidades que tive na vida, e assim acabei trabalhando em TV, rádio. Comecei um curso de especialização em docência de ensino superior, mestrado em teorias da comunicação. Gosto de lembrar o que diz o Gerbase (Carlos, cineasta e ex-integrante dos Replicantes) sobre a Casa de Cinema: o cinema, assim como a música, é feito para ser compartilhado com outras pessoas. Se tu ouves Beatles, Roberto, vais querer compartilhar. As pessoas no curso também têm essa oportunidade, de se enturmar, conversar com pessoas com interesses afins.

Nonada – Os roqueiros de hoje não estão um pouco acomodados?

Frank Jorge – É como diz o Alemão (Alexandre Birck): o pessoal tem acesso a tanta informação, equipamento, know-how, mas, mesmo tendo tudo isso, faz o som mais careta possível. Eu acho legal quando a banda pega as referências e tenta utilizar aquilo, mas transformar em outra coisa. Entendo que o cara queira fazer algo mais assimilável, já passei por isso – mesmo assim, não acho que a Graforréia soe parecido com nada. Mas como coordenador do curso eu falo muito no papel de “pai” dessa galera, que tem menos anseios, angústias, nasceu com internet e shopping centers. Eles não têm que construir cada tijolinho. Isso se perdeu um pouco hoje.

Nonada – Tem uma música no teu último disco (“Obsessão Anos 60”, do álbum Volume 3) em que dizes que não suportas mais a obsessão pelas bandas dos anos 60. Não querendo inventar significados pra a letra, ela é um recado para alguém em especial?

Frank Jorge – Foi bom tu trazeres isso… É papel do músico, da música pop, fazer essa autocrítica em publico. Claro que não tenho nada com nenhuma banda que se influencia pelos anos 60. Acontece que de repente eu tomei um porre de ver tanta banda que soa anos 60 sem tentar digerir melhor aquilo, desconstruir o som, então fiz essa música! (risos)

Frank, sobre o show mais recente da Graforréia: “comprovou que a banda colocou seu nome na história, mas me soa datado insistir que ela tenha que continuar existindo”

Nonada – Não é, então, um recado a ninguém especial.

Frank Jorge – Não!!! (risos) Jamais! Já peguei algum traquejo com essas coisas, jamais diria isso. Cara, o primeiro disco solo, que é de 2000, já tem uma brincadeira, a partir de uma frase do Júlio Reny e de um amigo dele: “o Frank não larga a Jovem Guarda”. Não foi por mal, mas essa frase ficou na minha cabeça e me incomodou muito, e qual era a minha leitura? Tudo bem que tinha e tenho uma baita influência da Jovem Guarda, mas não é a única coisa que eu ouvi, acho que a Graforréia fez um trabalho importantíssimo de revalorizar a Jovem Guarda e de desconstruir, botar a Jovem Guarda de cabeça pra baixo, acrescentando outras influências musicais no nosso trabalho. Daí a frase da música “Serei mais Feliz”: “Vou largar a Jovem Guarda e serei mais feliz/Vou largar a Jovem Guarda por todo o país/Vou ouvir mais conselhos para enriquecer/vou seguir novas regras, melhor vou viver”. Tô, na verdade, ironizando… A gente vive um exercício pleno de democracia: tu escolhes o que vais cursar, no que vais trabalhar, tu escolhes que som vais fazer. Tu não tens que pegar ou largar nada porque alguém acha isso. Então eu fiz essa letra, e repeti um pouco esse mecanismo em Obsessão Anos 60, foi um gancho pra falar em outras estrofes “estou ficando démodé”, ou “porquê as bandas dos anos 80 estão sempre em nova turnê”. Por mais que tu possas odiar depois de compor, tem umas frases de efeito que ficam, o pessoal gosta. A questão do Elvis reproduz bem isso. Não é minha implicância com banda nova, eu adoro banda nova, mas eu critico o comportamento de algumas. Às vezes o cara saca só o que existe hoje e não tem nem noção do que o Elvis fez ou porque foi importante. É uma homenagem ao Elvis, mas não só ao Elvis criatura do mundo artístico, mas o Elvis ser humano, tento fazer uma redenção dele: “Elvis na fase decadente é bem melhor que muita gente”.

Nonada – Falando em decadência, existe aquela pecha de que roqueiro bom é aquele que morre aos vinte e poucos anos. Tu achas que hoje as pessoas respeitam mais quem tem uma estrada, ou é aquela coisa tipo o que aconteceu com os Strokes, que foram muito elogiados no primeiro disco, mas no terceiro tem muita gente falando que é uma droga? Parece que a banda só é boa quando começa. 

Frank Jorge – Cara, isso é um assunto bem delicado. Como te falei, na medida em que a gente amadurece, aprende a entender as mudanças pelas quais passa uma banda. Eu tô falando isso do ponto de vista de que está com 44 anos… Eu gosto dos três discos dos Strokes, só pra pegar o teu exemplo. É a única banda dos anos 2000 que eu tenho todos os discos e gosto, eu acho legal ouvir cada disco com um tipo de proposta, cada um tem lá sua unidade específica, mas eu reajo com naturalidade a isso. Uma mudança recente e radical é do MGMT. O primeiro disco tem uma carga de teclado que o Carlinhos (Carneiro, da Bidê ou Balde e do Império da Lã) até brincava que parecia Tears for Fears. O segundo já é mais baixo, guitarra e bateria. Achei legal a mudança, caiu bem no meu ouvido, mas as pessoas de um modo geral são um pouco mais afoitas. Recentemente – falando em termos de década – os Los Hermanos foram mudando, depurando uma musicalidade que fui muito bem recebida pelo público. Começaram pegando um público mais juvenil, em função do refrão da “Anna Julia”, e foram mudando do ponto de vista da concepção musical e pegando outro público. Depois vieram Bloco do Eu sozinho, Ventura, Quatro… É um exemplo bacana de banda que não fez concessões, fez o som que queria fazer, explorando rock com instrumentos de sopro, com intersecção com a MPB. É difícil comparar a leitura que tem uma banda como o Los Hermanos com a Fresno. Não desmerecendo Fresno, mas eles pegam um público adolescente, e acho difícil isso mudar.

“Não é minha implicância com banda nova, eu adoro banda nova, mas eu critico o comportamento de algumas. Às vezes o cara saca só o que existe hoje e não tem nem noção do que o Elvis fez ou porque foi importante.”

Nonada – Finalmente: e a sua carreira, o que anda preparando? E a Graforréia, só existe eventualmente?

Frank Jorge – Por sorte, só existe eventualmente. É que todo mundo acabou constituindo família, foi buscar outros horizontes. Tenho um grande respeito e gratidão à Graforréia, ao que me proporcionou, mas do ponto de vista musical ficou meio difícil dar outros passos. Cada um foi desenvolvendo outros trabalhos musicais, outros interesses. Eu, por exemplo, consegui concretizar o meu trabalho solo, mas não tinha pretensão de ter uma carreira. Só queria gravar minhas músicas, que não encaixavam no Cowboys Espirituais, na Graforréia, mas que tinham esse universo de canção e de rock, difícil de classificar. Eu tenho uma identificação com o universo da musica pop de modo geral, Beach Boys, Elvis Costello, The Jam, e daí o Frank solo se tornou uma realidade. Comecei a gravar, veio o primeiro disco, em 98, mas foi lançado em 2000 (Carteira Nacional de Apaixonado). Não querendo ser egoísta, mas sendo um pouco, nesse trabalho eu tenho uma liberdade de definir que música quero gravar, como vou gravar… Adoro trabalhar em arranjo, estudei um pouco de piano, tinha conhecimento e fui atrofiando, desenvolvendo mais como acontece na música popular, de maneira autônoma, ainda que tenha um domínio bom do método cifrado. Hoje tô retomando isso, sinto a carência desse domínio, mas não deixei de gravar, compor por causa disso. Lancei três discos solo; em dez anos lancei o mesmo que a Graforréia lançou em 20 e tantos… o quarto tá no Fumproarte, em vias de ser aprovado em todas as instâncias, e já está pronto. E sempre gostei daquele ritual de viajar pra fazer show. É aquela coisa, o cara trabalha durante o dia na Unisinos, cuida dos filhos, e à noite vai tocar no Beco. Eu gostei muito disso, mas já tô começando a cansar um pouco. Não que eu esteja dizendo explicitamente que tô ficando velho, nem desiludido. Mas tu vais cansando… Tem projeto que tá engavetado, quase por sair: Frank, Júlio e Wander tocando pelo estado, o registro de dois shows. Talvez se apresente pro início do ano uma turnê com nós três tocando com uma banda, sendo produtores executivos disso. De modo geral, gosto muito de pensar e produzir arranjos, de que modo posso pensar em colocar um pouco de MGMT no meu trabalho, ou do The Jam, que é uma banda que eu adoro, tô sempre ouvindo. A apresentação é sempre legal pela interação com a plateia, é uma coisa mais viva. Mas eu te confesso, volta e meia começo a repensar um pouco isso, é uma logística grande, de organização, muita coisa…

Nonada – E esse show no Beco (a Graforréia inaugurou o projeto Discografia Rock Gaúcho, tocando na íntegra o clássico Coisa de Louco II, dia 30 de setembro, no Porão do Beco)?

Frank Jorge – Teve um excelente público, foi bem legal. Não foi ruim, de modo algum, comprovou pra mim que a Graforréia colocou seu nome na história, com seu tipo de som, mas me soa datado insistir que ela tenha que ter uma vida, continuar existindo.

Nonada – No fim, o show foi interessante por causa da proposta.

Frank – Tinha várias razões pra fazer: pelo projeto inédito, por sermos os primeiros… Não tinha porquê não fazer. 

Frank acredita que cada vez mais o músico quer se tornar independente financeiramente mais cedo.

Nonada – E a Tentente Cascavel?

Frank Jorge – Um elo importante era não só o fato de termos tocado em TNT e Cascavelletes, mas que éramos amigos de infância, eu e o Márcio – o (Luciano) Albo não era amigo, mas fez história no Cascavelletes, eu toquei com o Tchê no Prisão de Ventre, banda que tinha o Birck, o Tchê e eu, e que lançou a gente para as nossas outras bandas. Então como tinha tocado com o Tchê no Prisão de Ventre e o Márcio nos Cowboys, tocar no Tenente era me reencontrar com esses amigos, significava pra mim mais que fazer uns shows e ganhar uma grana, por mais que outros ex-integrantes vissem com maus olhos a banda por esse prisma. Saí no inicio deste ano vendo minha necessidade de começar o mestrado e a banda por assinar contrato, tanto pra shows como pra disco. Aí pensei: vou sair antes que comece a me enroscar demais em algo que não vou conseguir manter.

Para encerrar a entrevista, pedimos a Frank que desse sua opinião sobre algumas questões relativas a música. Com dá para perceber pelas respostas, ele não conseguiu se contentar com apenas uma das opções…

Nonada – Vinil, CD ou MP3?

Frank – Tenho um aparelho de vinil ali (mostra a sala ao lado), acompanhei o surgimento do CD, a fissura por ter CDs… Tem uma coisa básica e divertida pra se dizer: existe vinil ruim, CD ruim e MP3 de má qualidade, então isso tudo vem a nosso favor, esses diferentes formatos de mídia. Eu ouço normalmente, num aparelho de CD que nem é grande coisa. Ganhei o novo do Acústicos & Valvulados, que é uma banda que eu adoro. Vou ouvir imediatamente em CD, mas daqui a pouco passo pro meu celular. Ouço o CD na cozinha, tomando chimarrão, e escuto MP3 no Trensurb, indo pro trabalho. E volta e meia me deparo comprando disco de vinil. Às vezes nem ouço quando chego em casa, mas penso: esse disco tenho que ter! E morando com família, filhos, tem uma coisa que eu tento fazer, mas não consigo: uma faxina permanente, doar um pouco, CD, vinil, livro. Isso é um problema. Penso que é bacana dividir conteúdo, ou difundir, tem coisas que a gente já usou ou curtiu, mas é meio apegado a elas. Sou de uma geração de ter coleção de disco, biblioteca em casa… Já dei alguns vinis em shows da Pública, na hora que eles tocam a música “Long Plays”.

Nonada – Beatles ou Stones?

Frank Jorge – Gosto do mesmo jeito, tenho muitos vinis dos Stones. Um dos meus irmãos, o Cléber, sempre gostou de Beatles e Stones, mas teve fases mais de Stones e Led, aquilo me influenciou. Hoje eu ouço mais The Jam do que Beatles. Já ouvi muito Beatles, aprendi a tocar baixo ouvindo os caras e Roberto Carlos – tive aula de violão e piano, não de baixo. E Stones, eu gosto na mesma medida. Eles são influenciados por discos de Muddy Waters, blues de Chicago, que eu respeito, mas não gosto muito, mas também fizeram fizeram discos maravilhosos. Acho que tenho mais carência de ouvir Stones hoje, Beatles já ouvi demais. Mas é óbvio que continuo ouvindo…

Nonada – Roberto ou Erasmo?

Frank Jorge – (risos) Cara, é um caso semelhante… O Roberto é a mesma coisa, ouvi demais também. Chega uma época em que tu paras, queres pesquisar outras coisas. Quanto ao Erasmo, chegou uma fase x, que baixei toda a discografia e passei pra celular. Cara, ele tem discos maravilhosos, do final de 60 e início de 70, em que flerta com soul, samba rock, e com timbres quase iguais ao do Marcelo Camelo – outra teoria minha (risos). O Erasmo buscou caminhos que o Roberto não tentou. Os dois foram importantes pra mim. E tem muitas músicas dos caras em parceria, então fica até difícil dissociar.

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