Uma noite no teatro dos horrores de Alice Cooper

Veterano roqueiro fez uma grande apresentação nesta terça-feira no Pepsi on Stage, em Porto Alegre, mas para um público reduzido

Fotos: Fernando Halal (http://www.flickr.com/photos/fernandohalal)

Em 1974, Vincent Furnier, mais conhecido como Alice Cooper, fez história ao trazer seu show de horrores para o Brasil. Era o primeiro grande evento internacional de música realizado no país, e, reza a lenda, quase 160 mil pessoas testemunharam o espetáculo, ocorrido em São Paulo. Quase 40 anos depois, o roqueiro norte-americano voltou ao país esta semana para uma turnê que promete números mais modestos. No primeiro show, realizado nesta terça-feira, no Pepsi on Stage, em Porto Alegre, havia aproximadamente 700 pessoas, de acordo com a Brigada Militar. Ok, estimativas são estimativas, mas quem presenciou o espetáculo vai concordar que o número está bem próximo da realidade.

Cantor começa o show em cima de uma escadaria, com um "casaco de aranha" e faíscas nas mãos, cantando "Black Widow"

Seja como for, esse grupo reduzido de fãs certamente não se arrependeu de separar uma graninha para conferir o primeiro show da tia Alice em solo gaúcho – ao contrário do que alguns veículos de comunicação divulgaram, o músico nunca trouxe seu show completo para Porto Alegre, fez apenas uma rápida participação no projeto British Rock Symphony, em 2000. Aos 63 anos, o cantor mostrou, em uma apresentação de cerca de uma hora e meia, que continua em grande forma.

Antes da banda de Alice subir ao palco, o Rosa Tattooada fez uma breve abertura, tocando alguns de seus clássicos, como “Tardes de Outono” e “Rock’n’Roll até Morrer”. A recepção do público foi apenas mediana, até porque ainda havia gente chegando no decorrer do show.

Em torno das 21h20min, surge um enorme pano com o rosto de Alice estampado. As luzes se apagam e começa a fala do ícone do terror Vincent Price (o mesmo ator que fez locuções para “The Number of the Beast”, do Iron Maiden, e “Thriller”, de Michael Jackson). É a deixa para que a banda comece a tocar “The Black Widow”. Do alto de uma escadaria forrada de teias, o maquiado cantor surge vestido com um “casaco de aranha” cobrindo suas roupas de couro, em um visual bem sadomasoquista.

O show prossegue com “Brutal Planet”, do disco homônimo de 2000. O vocalista não se comunica com a plateia, e nem esta exige que ele o faça; afinal, quem está ali não é Vincent Furnier, e sim Alice Cooper, o psicopata com nome feminino e cara de poucos amigos. Justificando o nome da turnê – No More Mr. Nice Guy – The Original Evil Returns, o cara emenda uma sequência de velhas conhecidas: “I’m Eighteen”, “Under my Wheels”, “Billion Dollar Babies” (nesta, ele usa uma espada de esgrima para jogar notas falsas de dólares na plateia) e, claro, a própria “No More Mr. Nice Guy”.

Abraçado a uma boneca, Alice canta a marcante balada "Only Women Bleed"

Depois dessa sequência de clássicos, há espaço para “Hey Stoopid”, um hit de 1991, e a menos conhecida e excelente “Is it my body”. Em seguida, outra pérola resgatada dos anos 70: a psicodélica “Halo of Flies”, com viradas sensacionais e um belo solo de bateria de Glen Sobel.

A banda de Alice, aliás, é muito boa. Além de Sobel, o grupo conta com o baixista Chuck Garric e nada menos que três guitarristas: Damon Johnson, Tommy Henriksen e o veterano Steve Hunter, reincorporado há pouco tempo. Com exceção dele e de Sobel, todos cantam, e com bastante competência, dando, assim, uma forcinha para Alice nos refrões mais agudos.

Mesmo com esse “reforço” na parte vocal, Alice não decepciona com o microfone na mão, e sua presença de palco é incrível, ainda mais levando em conta que ele tem 63 anos. O cara corre, dança, faz caretas e poses “sensuais” e ainda gira uma espécie de bengala o tempo todo, com muita habilidade.

Sem se dirigir ao público, o cantor volta ao palco com uma jaqueta escrita “new song”. Ao tirá-la, uma camisa branca com letras ensanguentadas mostra o nome da tal música nova: “I’ll Bite Your Face Off”. Um hard rock de respeito, que estará em Welcome 2 my Nightmare, sequência da obra-prima lançada em 1975 prometida ainda para este ano.

Após “Muscle of Love”, em que o cantor arrisca tocar maracas, o teatro de Alice ganha ares de dramaticidade. Primeiro, com uma performance romântica impagável junto a uma boneca na linda balada “Only Women Bleed”, com direito a beijo na boca; depois, no espancamento da mesma boneca em  “Cold Ethyl”. Em seguida, mais um grande momento: em “Feed my Frankenstein”, o cantor aparece vestido de cientista louco e, com ajuda de seu assistente Igor, utiliza-se de uma máquina bizarra para dar vida a um monstro ainda mais bizarro – uma espécie de Frankenstein com cabeça de Alice Cooper e uns quatro metros de altura.

Uma boa surpresa desta turnê é “Clones”, da fase mais experimental da carreira do cantor, entre o final dos anos 70 e início dos 80, mas a plateia parece desconhecê-la – ao contrário de “Poison”, hit da MTV, e “Wicked Young Man”, ainda mais recente. Logo depois, um dos grandes momentos da apresentação. Durante o medley com fragmentos de “Killer” e “I Love the Dead”, Alice, após agredir um fotógrafo, é capturado por membros da S.W.A.T. e decapitado em uma guilhotina. Um dos policiais ergue a cabeça do assassino, e a galera vai à loucura, claro.

A ressureição de Alice não demora muito a acontecer, e vem em grande estilo. De cartola e bengala na mão, ele puxa “School’s Out”, acompanhada em coro pelo público, e com direito a citação de “Another Brick in the Wall”, do Pink Floyd. O final da música é apoteótico, com balões gigantes voando sobre a pista.

Em "Feed my Frankenstein", surge um monstro com o rosto de Alice e quatro metros de altura

No bis, o cantor volta com uma camisa da seleção e uma bandeira do Brasil, as quais utiliza para “comprar” seus eleitores em “Elected”. Após uma chuva de papel picado, Hunter entra no palco com uma peruca black power e a banda se despede com “Fire”, de Jimi Hendrix.

Faltou alguma coisa? Sem dúvida! Canções como “Welcome to my Nightmare” e “Ballad of Dwight Fry” mereciam estar no repertório, tanto pelas qualidades musicais como pelos números teatrais que Alice utilizava nelas – monstros, camisa de força e enfermeiras. Quanto à tão falada cobra que muitos esperavam, é bom lembrar que o cantor não faz mais esse tipo de número desde que sua jiboia morreu – com exceção da indicação para o Hall da Fama, quando surgiu enrolado em outra serpente. De qualquer forma, um show cheio de atrativos, e que certamente merecia ter sido visto por um público maior. Em tempo: nesta quinta, o cantor se apresenta em São Paulo, e, no dia seguinte, no Rio de Janeiro.

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