Esteban sem fronteiras

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Esteban Tavares apresentou versões acústicas de seus dois álbuns

Texto: Ananda Garcia
Fotos e Vídeo: Ismael Fonseca

Quatro meses após lançar Saca La Muerte de Tu Vida em Porto Alegre, Rodrigo Tavares, ou Esteban nome do seu projeto solo que acabou sendo incorporando como nome artístico , retornou à Capital para um show acústico ao lado do acordeonista gaúcho Paulinho Goulart. O músico subiu ao palco do Anexo B por volta das oito horas da noite de domingo (6), após a abertura feita pela cantora catarinense Tay Galega, com quem canta a quinta faixa do seu novo álbum, intitulada “Tango Novo”. Na plateia, rostos jovens e a certeza de que o ex-baixista da Fresno manteve fãs da banda que deixou em março de 2012, apesar de ter mudado o tom de sua música de lá pra cá.  

Mais de 400 pessoas ocuparam a parte superior do Anexo B, que tem capacidade para 450 lugares. Com o salão praticamente lotado, o baile como Esteban se refere aos seus shows não teve como não ficar intimista. Em aproximadamente uma hora e 30 minutos, Tavares cantou sua poesia, mas sem o mesmo lirismo do lançamento de Saca La Muerte de Tu Vida realizado no Bar Opinião, quando executou praticamente todas as faixas do novo álbum, na companhia da banda completa e de convidados.

O show iniciou com “Janeiro”, uma das músicas mais melancólicas de SLMDTV. Na sequência, o setlist alternou entre o novo trabalho e o álbum Adiós, Esteban!, para a histeria de boa parte do público. É fácil perceber que a narrativa romântica e ligeiramente pueril de Adiós conversa bem com as frustrações sentimentais recorrentes da faixa etária da audiência. No Anexo B não foi diferente. Canções como “Sophia” e “Segunda-Feira” estão entre as mais pedidas. “Cigarros e Capitais” também comprova a predileção dos fãs pela sonoridade mais pop. A composição é a que menos se encaixa no conceito de SLMDTV e, por esse motivo, quase ficou de fora do novo álbum. Mesmo assim, a voz da plateia deixa evidente que esse é o hit do álbum.

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Setlist mesclou faixas de Adiós, Esteban! e Saca La Muerte de Tu Vida, lançado neste ano

Os sentimentos de distância, saudade e melancolia são os fios condutores de Saca la Muerte de Tu Vida. No entanto, percebe-se um eu lírico mais maduro e otimista na comparação com o disco de 2012. Ainda que o piano possa ter feito falta no show, o acordeon de Paulinho Goulart somado ao violão conseguiram sintetizar bem o sentimento que permeia todo o projeto.

Saca la Muerte de Tu Vida foi financiado pelos fãs por meio de crowfounding. Em recompensa, receberam 1,4 mil kits contendo uma edição antecipada de SLMDTV e um trabalho genuíno, em que Tavares pôde incluir ritmos fora do padrão dos discos de pop rock, como elementos de regionalismo e rock platino.Um exemplo disso é a canção “Martes”, uma composição em espanhol, e duas versões de “Chacarera da Saudade”, em alusão ao ritmo chileno bastante reproduzido na música gaúcha, argentina e uruguaia. No álbum, é o cantor de música nativista Pirisca Grecco quem conduz a autêntica chacarera.

Mesmo que boa parte dos fãs não seja familiarizada com o acordeon ou nunca tenha ouvido falar em chacarera, ver a plateia entoando essas canções leva a crer que Esteban tem o aval do público para fazer o que quiser. E o intercâmbio de som e público vale para os dois lados, o que o diga o acordeonista Paulinho Goulart, de quem se ouve o nome em voz alta várias vezes durante sua performance.

A última faixa de SLMDTV a integrar a apresentação no Anexo foi “Maria”. Antes de começar, Tavares fala algo como “a próxima canção é Maria, mãe de Jesus”, em tom de brincadeira. Maria, na verdade, é o apelido para marijuana, mas seu ritmo e letra podem levar alguém a achar que se trata de uma música religiosa – o que já aconteceu, segundo o relato de uma fã que quase levou a canção para tocar em uma missa.

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Cerca de 400 pessoas assistiram a apresentação no Anexo B

Nos últimos minutos de apresentação, Tavares convidou o público para cantar “Pianinho” em homenagem aos cinco anos da Project Rock, produtora responsável pela organização do evento. “Sinto Muito Blues”, gravação feita com Humberto Gessinger, de quem Tavares é fã declarado, encerrou o show. Desde 2013, ele é o guitarrista de Gessinger, tendo participado das gravações do CD e DVD Insular e de quase toda a turnê, que por coincidência estava se encerrando naquele domingo, em São Paulo.

A noite terminou sem a plateia pedir bis, assim como no show de lançamento de Saca La Muerte de Tu Vida. O mais inusitado é que ninguém estranha, as pessoas simplesmente saem, muitas mais preocupadas com a possibilidade de conseguir uma foto com o músico na hora da saída. Embora sua última apresentação do ano em Porto Alegre tenha sido acústica, é preciso reconhecer que Tavares é um músico multifacetado, com domínio de violão, guitarra, baixo, piano e bateria. É um gaúcho que abomina o regionalismo termo “rock gaúcho”, mas apresenta elementos da música nativista para o resto do Brasil. Ao mesmo tempo, tem composições em espanhol e inglês, além de parcerias internacionais com Aaron Marsh (Copeland) e Stephen Christian (Anberlin). Como Esteban, Rodrigo Tavares é um músico sem fronteiras, sem bandeiras para defender.

Entrevistamos* Esteban após o show. Acompanhe algumas perguntas que o cantor respondeu:

Você acredita que o fato de tocar com o Humberto Gessinger tenha te validado como artista perante o grande público, diminuindo o estigma de ídolo musical do público adolescente?

Esteban – Sim, eu acho que o Humberto é um carimbo, não tenho vergonha de dizer isso. Antes do Humberto rolava aquele lance “é o cara da Fresno”. Depois não, “pera aí, mas se o Humberto falou esse cara pode ser bom”. Quer dizer, eu continuo sendo  o mesmo cara, não mudei nada, mas se o Humberto falou, é positivo. Negativo, na verdade, são as pessoas terem que esperar o Humberto falar para dar bola para alguma coisa. Mas se não fosse o Humberto, não é que eu não estaria aqui, mas acho que ele poupou para mim um esforço de conquistar uma galera que se não fosse por ele eu não teria conquistado. É um respeito, toquei com ele, fiz música, gravei DVD com ele. É um estágio diferente da vida. E quanto à Fresno, não deixava de ser uma banda adolescente porque a gente era um bando de adolescente que tava virando adulto, então não tem nada de errado em falar isso.

Você está muito presente nas redes sociais, principalmente o Twitter, onde há diferentes militâncias assim como em toda a internet. Existe uma preocupação com a forma como os teus posts são recebidos ou deixa de escrever algo para evitar críticas e incomodação?

Esteban – Eu uso o Twitter para encher o saco. Não me incomodo, eu só acho engraçado, porque os argumentos da galera são pífios. Agora estão pegando no meu pé porque me chamam de comunista. Mas tipo,  tu querer que a pobreza acabe não quer dizer que tu queira ser pobre. E aí o argumento dos caras é “tu tem um iphone”. Sim, tenho, gostaria de ter três, quatro, cinco e gostaria que quem não tem tivesse também. Aí quando vejo esse tipo de argumento eu dou risada. Eu também não sou a salvação pra nada. Não que eu fale muita coisa legal, mas não vou ficar alimentando também esse tipo de coisa.

Em outras entrevistas você da intenção de lançar um novo disco no ano que vem e tentar manter um álbum por ano. O que esperar de Esteban em 2016?

Esteban – Não sei se consigo lançar em tempo hábil, porque quero fazer um EP novo, um clipe, um EP meio “andropausa”, com umas versões mais lentas e mais minimalistas de algumas músicas. Estou conversando com o Stephen (Christian) do Amberlin para  a gente fazer uma turnê  onde as duas bandas vão tocar juntas. Estou compondo. Agora digo que farei um disco, mas de repente posso aparecer com um DVD. Acho que para gravar um show ter que ter no mínimo quatro discos, mas tem gente que só vai te ouvir se te ver, então é necessário fazer.

*Curtiu a entrevista? Confira na íntegra no youtube.

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