Arroio Dilúvio: problemas crônicos, impasses e boas iniciativas

(Esta reportagem faz parte do Derivas, publicação online que reúne os textos dos alunos do Curso de Jornalismo Alternativo no Nonada. Leia as outras reportagens neste link)

por Leonardo Jaques

Um final de tarde qualquer numa esquina da Av. Ipiranga, a água barrenta, com grandes ilhas de espuma, traz na correnteza desde sacolas de plástico até sapatos, embalagens de margarina, garrafas PET e uma poltrona encalhada na outra margem do Arroio Dilúvio. Alguns metros acima, subindo uma escadaria, dois barracos de lona servem de moradia para Vilmar Borges, natural de Sobradinho, e mais dois companheiros de abandono. Nas palavras dele: “Eu tô ficando aqui já faz umas duas semanas, eu acho, e aí pra baixo tem uma família morando.” Logo mais adiante, na sinaleira, um malabarista tenta arranjar algum dinheiro enquanto o sinal não fica verde. Anoitece rápido. Mas parece que a situação aqui vai continuar assim por muito tempo ainda.

Nascendo em Viamão, e com cerca de 12 quilômetros de extensão, o mais importante córrego da cidade tem o nome de Arroio Dilúvio por inundar bairros como o Menino Deus e Cidade Baixa, até a primeira metade do século XX, quando ainda eram habitados pela população negra de Porto Alegre – mais tarde, a população foi removida desses locais, como conta a reportagem do Nonada. Foi só em 1940, durante a administração de Loureiro da Silva, que iniciaram as obras – durando mais de duas décadas – que edificaram a estrutura do córrego (em taludes) como se vê hoje em dia ao longo da Av. Ipiranga.

O saneamento básico em regiões de periferia que afetam o Arroio poderia ser encarado com maior seriedade pelos órgãos competentes do que tem sido até hoje. E dentro desta perspectiva, é necessário um olhar do poder público municipal sobre a continuação do Arroio Dilúvio quando passa a Antônio de Carvalho na direção do Instituto de Pesquisas Hidráulicas da Ufrgs – IPH.

Barragem Lomba do Sabão (Foto: Tiago Jaques)

A partir desse trecho sem maior visibilidade do Arroio, ainda falta canalização, e as ações de desassoreamento são insuficientes, ocasionando transbordamento em períodos de grandes volumes de chuva. Outro problema diretamente relacionado é a Barragem Mãe d’Água, em desuso para abastecimento do IPH há décadas, de onde vem, além de esgoto in natura da região, grande quantidade de lixo e sedimentos para o leito do Arroio.

Alguns fatos recentes vêm à tona quando se pretende problematizar o Arroio Dilúvio, como, por exemplo, a ameaça de privatização de serviços de atribuição do DMAE, e também o que acontece com o DEP, onde diretores e servidores foram alvo da terceira fase da Operação Tormenta, do Departamento Estadual de Investigações Criminais (DEIC) da Polícia Civil, que investiga fraudes licitatórias e crimes contra a Administração pública. Hoje, este mesmo Departamento de Esgotos Pluviais (DEP) está em processo de extinção (ou desmembramento), através de uma lei complementar aprovada pela Câmara Municipal de Porto Alegre, dentro de uma reestruturação da administração municipal, segundo o prefeito Nelson Marchezan Júnior. Ex-diretores do DMAE desmontam a tese de necessidade de privatização alegando que o DMAE é uma espécie de “primo rico” da administração municipal, algumas vezes, inclusive, tendo servido de socorro financeiro para a prefeitura.

O arroio Dilúvio nasce em Viamão…

… mais especificamente no Parque Natural Municipal Saint’Hilaire, onde estão localizadas as mais de 50 nascentes distribuídas entre 1.148 hectares. Estas desembocam na Barragem Lomba do Sabão, que por sua vez abastece o Arroio Dilúvio.

Se não fossem a origem do Arroio Dilúvio, essas nascentes talvez hoje estivessem enterradas, a exemplo de outras regiões onde a especulação imobiliária se estabeleceu com o dinheiro transformando a cidade. Isso ocorreu, por exemplo, com a antiga nascente Arroio da Areia, próximo da região do Shopping Iguatemi, que foi enterrada em benefício da especulação imobiliária, dentro da visão de destruição do patrimônio ambiental e histórico da cidade, em nome de luxuosos e seguros condomínios.

Nascente no Parque Saint’Hilaire (foto: Gerson Luis Mainardi)

O que vemos no Parque Saint’Hilaire, uma área protegida, é a falta de planejamento habitacional nas regiões limítrofes como o Pinheiro, e certos bairros de Viamão.

Hoje em dia é possível visitar as nascentes com acompanhamento (previamente agendado) da SMAM. Nas demais áreas de lazer, não é necessário agendamento. Carlos Alberto, um funcionário do Parque nos relata: “Há mais ou menos quinze anos atrás a gente ainda bebia essa água aqui sem nenhum problema.” Apontando um córrego dentro do Parque onde a população costuma fazer “despachos” de religião.

Possíveis Soluções

Em maio deste ano, foi realizado o ato de lançamento da Frente Parlamentar em Defesa do Arroio Dilúvio; tendo como proponente o vereador Moisés Maluco do Bem (PSDB), e composta por dez vereadores além do Moisés: Adeli Sell (PT), Aldacir Oliboni (PT), Alvoni Medina (PRB), Dr. Thiago (DEM), Felipe Camozzato (NOVO), Luciano Marcantônio (PTB), Paulo Brum (PTB), Professor Alex Fraga (PSOL), Professor Wambert (PROS) e Valter Nagelstein (PMDB).

A iniciativa, mais do que tudo, talvez possa gerar um debate bastante pertinente na Câmara Municipal de Porto Alegre, como sugere o vereador Prof. Alex Fraga: “Eu acredito que existem pautas em que há uma unificação de esforços, uma relação em que se superam as divergências ideológicas por conta da temática – e a despoluição e a melhoria nas condições do Arroio Dilúvio é uma delas. É uma questão de cidadania, uma questão de preservação e respeito ao nosso ambiente natural e, por isso, nós temos essa aglutinação de diferentes campos e setores na Frente Parlamentar.”

O vereador Moisés Maluco do Bem (PSDB) também foi contatado, através de sua assessoria, mas não houve retorno até a data de entrega.

Confira a entrevista completa com o vereador Alex Fraga abaixo:

Este ano foi lançada a Frente Parlamentar em Defesa do Arroio Dilúvio. Falando sobre essa iniciativa, já existe alguma ação concreta?

Prof. Alex Fraga – As ações concretas para despoluição e melhoria nas condições do Arroio Dilúvio são, principalmente, de atribuição dos municípios de Viamão, que é onde ficam as nascentes, e do município de Porto Alegre. As Câmaras de Vereadores podem colaborar fomentando debates, estimulando a participação da sociedade, fazendo audiências públicas, mas, infelizmente, nós vereadores não temos “a caneta” para nenhuma medida concreta. Temos tentado reunir técnicos, especialistas e ambientalistas para fazer o debate e tentar viabilizar boas ideias para melhorar as condições e termos uma qualidade melhor para o arroio, como também para o Guaíba e para toda a população de Porto Alegre.

A água que abastece o Arroio  Dilúvio já vem contaminada desde às nascentes dentro do Parque Saint’Hilaire, em Viamão, principalmente pelo esgoto doméstico das moradias nos arredores do Parque, além de receber o esgoto cloacal de três bairros de Porto Alegre. Quais são as demais formas de poluição do Arroio Dilúvio? E de que forma a Frente Parlamentar irá concentrar os seus esforços nessa possível recuperação do Arroio, que recebe água de vários afluentes: São Vicente, Moinhos, Mariano, Cascatinha, entre outros?

Prof. Alex Fraga – Não são apenas os domicílios ou as casas, ou os bairros próximos às nascentes, que contribuem para essa contaminação. Porto Alegre é uma das cidades que têm a maior gama, o maior número de arroios percorrendo a área do município. Por conta disso, historicamente, as redes de esgoto cloacal não foram implementadas, desde a formação da nossa cidade. Era de costume que todo o esgoto cloacal in natura fosse canalizado para dentro desses arroios. Então, não são apenas os bairros iniciais ou o município de Viamão que são os principais responsáveis. Ao longo de todo o curso do Arroio Dilúvio, inclusive bem próximo à foz, no lago Guaíba, nós temos a percepção de que os encanamentos que chegam, por conta dos arroios antigos que ainda estão sendo despejados no Dilúvio, apresentam contaminação, a fecal inclusive. Mas nós precisamos também pensar que várias outras atividades, como, por exemplo, as dos postos de gasolina, como lavagens, troca de óleos, muitas vezes escorrem os seus resíduos, muitas vezes esses produtos não são totalmente contidos e levados à destinação devida. Então, os detergentes, por exemplo, das lavagens de carros e até mesmo os detergentes utilizados nas residências da cidade contribuem para a poluição, aumentam a quantidade, por exemplo, de alguns elementos químicos e alguns compostos que são nocivos e isso compromete também a sanidade do ambiente.

O que nós, como Frente Parlamentar, podemos fazer é justamente concentrar os estudos nos debates, principalmente com especialistas, linkando, por exemplo, setores da sociedade que envolvem academia, as universidades, os pesquisadores, justamente para apontar os principais focos de contaminação e, assim, dar esse suporte, encaminhar essas informações para que a prefeitura e seus órgãos competentes possam ter atuação. Uma outra forma também é a pressão direta que a Câmara pode fazer, via Frente Parlamentar ou Comissão de Saúde e Meio Ambiente (COSMAM), sobre os órgãos da prefeitura – porque é direito de todo cidadão viver numa cidade e em um ambiente preservado e relativamente salutar. Podemos destacar também que é impossível pensar na despoluição e na melhoria das condições do Arroio Dilúvio sem pensar, inicialmente, em começar a tratar a saúde dos arroios como um todo.

Esse conjunto de arroios, que é bastante extenso, precisa ser despoluído, um a um, desde as suas nascentes e indo em direção sempre às partes mais baixas, que seria o desague no Dilúvio, porque, se não contivermos esse aporte de poluentes, nós nunca teremos a melhoria nas condições do próprio Dilúvio, que é, de certa forma, um destinatário de boa parte do lixo, dos esgotos e de poluentes produzidos pela ação das pessoas aqui da cidade.

Há poucos anos, a Pucrs e a Ufrgs apresentaram proposta ao então prefeito José Fortunati, visando a recuperação do Arroio Dilúvio, com base na recuperação do arroio Cheonggyecheon, que corta a cidade de Seul, na Coreia do Sul, e que transformou o local também em um centro de cultura e lazer para a população. Considerando o histórico de descaso do poder público com a bacia hidrográfica do Guaíba de um modo geral, somado isso a crise em todos os níveis, quais são as perspectivas com relação a este e a outros projetos que jamais saíram do papel?

Prof. Alex Fraga – Nós podemos dizer que, pelo que vem demonstrando a atual prefeitura (a gestão Nelson Marchezan Júnior à frente da prefeitura de Porto Alegre), se não houver o interesse da iniciativa privada em, teoricamente, arregaçar as mangas e viabilizar esse processo, isso não vai sair do papel. Porque o prefeito destaca que, pelas suas ações e pelo seu posicionamento, que a sua prioridade, a sua preocupação, não é a garantia de bem-estar coletivo, a melhoria nas condições de saúde e qualidade de recursos do nosso município. Ele tenta a todo custo demonstrar que essas ações mais impactantes ou de longo prazo deveriam ser de responsabilidade da iniciativa privada, e nós sabemos que, historicamente, se não houver uma garantia de lucro, dificilmente a iniciativa privada vai investir grande quantidade de dinheiro. E nessa questão o interesse público não deve ser subordinado ao lucro. O objetivo deve ser melhorar a qualidade de vida da população e não dar lucro.

Na realidade, esse projeto é bastante audacioso, é um projeto de longo prazo, é um projeto bastante complexo, porque inclui regularização fundiária, melhoria nas condições de habitação, de mobilidade, aumento de fiscalização pelos órgãos da prefeitura. É um projeto extremamente complexo e, se depender apenas da iniciativa privada, isso nunca vai sair do papel. Infelizmente, nós precisaríamos de uma prefeitura que realmente vestisse a camiseta e se empenhasse no enfrentamento deste problema.

A Frente Parlamentar em Defesa do Arroio Dilúvio é composta por vereadores de diversos partidos políticos: PSDB, PSOL, PT, PRB, DEM, PTB, PROS e PMDB. Se houver avanços em políticas públicas referentes ao Arroio Dilúvio, independentemente de confrontos ideológicos, pode ser um bom exemplo para sociedade e para a classe política em tempos de grande acirramento. Isso será possível na sua opinião?

Prof. Alex Fraga – Eu diria que o acirramento dos debates de opiniões e de posicionamento é bastante ideológico. Nós temos, muitas vezes, grandes disputas, mas são disputas por visão de mundo, visão de governo, perspectivas com relação à prestação dos serviços públicos, à qualificação da gestão ou então ao tamanho e ao papel do Estado na garantia do bem-estar social e coletivo. Portanto, essa questão do Arroio Dilúvio não diz respeito a temas principalmente ideológicos, é uma questão de manutenção de ambiente natural para não inviabilizar a nossa própria sobrevivência como espécie para as gerações futuras. Então, eu não diria que isso dá uma demonstração de que haveria um menor acirramento.

Acirramento no campo ideológico vai continuar existindo, por conta das diferentes perspectivas que essas tendências, grupos ou partidos políticos têm com relação aos seus posicionamentos. Então, eu acredito que existem pautas em que há uma unificação de esforços, uma relação em que se superam as divergências ideológicas por conta da temática – e a despoluição e a melhoria nas condições do Arroio Dilúvio é uma delas. É uma questão de cidadania, uma questão de preservação e respeito ao nosso ambiente natural e, por isso, nós temos essa aglutinação de diferentes campos e setores na Frente Parlamentar.

 

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Entrevista com o gerente do Parque Natural Municipal Saint’Hilaire de Viamão, o Eng. Florestal Gerson Luis Mainardi, funcionário da SMAM, sobre a importância das mais de 50 nascentes numa área de 1.148 hectares da Unidade de Conservação:

Com 1.148 hectares de extenção o Parque Natural Municipal Saint’Hilaire está enquadrado no Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e no Sistema Municipal de Unidades de Conservação do Município de Porto Alegre, através da SMAM. Como funciona a gestão do Parque Saint’Hilaire situado no município de Viamão?

Gerson Luis Mainardi – Atualmente, a porção da área situada no município de Viamão está sendo gerida pela Prefeitura de Porto Alegre. Porém desde setembro de 2015 foi criado pelo município de Viamão, o Parque Natural Municipal Saint’Hilaire de Viamão, cuja forma de gestão, a ser feita por aquele município, ainda está em fase de formatação pelas prefeituras.

A importância dessa área para os dois municípios, Porto Alegre e Viamão, se deve em grande parte as mais de 50 nascentes que desembocam na Barragem Lomba do Sabão, que por sua vez abastece o Arroio Dilúvio. Se não fossem origem do Arroio Dilúvio, às nascentes talvez não existissem mais, a exemplo de tantas regiões onde a especulação imobiliária se estabelece com o dinheiro transformando as cidades. Até que ponto estão protegidas as nascentes, assim como os arroios no interior do Parque, em relação às fontes de poluição?

Gerson Luis Mainardi – As nascentes no interior do Parque estão protegidas pela criação da Unidade de Conservação, contudo é notória a busca de novas moradias pela população menos favorecida, e a pressão existente sobre áreas verdes públicas. O PNMSH está inserido na sub-bacia mais à montante do Arroio Dilúvio, ou seja, a mais distante da sua foz, que é na Usina do Gasômetro. Parte da sub-bacia está fora dos limites do Parque cujas áreas drenam para dentro do Parque. Destas áreas, fora do Parque, drenam águas de esgotos não tratados para a barragem da Lomba do Sabão, principalmente da Lomba do Pinheiro e de alguns pontos de Viamão. O poder público está sempre em processo de construção de novas redes de coleta e tratamento de esgotos, à exemplo do Projeto Integrado Socioambiental – PISA, que está captando e tratando esgotos das proximidades do Parque.

Faz quanto tempo que você é o Engenheiro Florestal que gerencia o PNMSH? Fale um pouco sobre o trabalho da equipe SMAM, sobre as atividades de conservação do Parque e das nascentes.

Gerson Luis Mainardi – Gerencio o Parque desde outubro de 2013. O trabalho desenvolvido pela equipe de servidores da SMAM divide-se em duas categorias basicamente: o de conservação e fiscalização ambiental e o de manutenção. O de manutenção visa manter o parque em condições de uso pela comunidade, como a praça de lazer, campos de futebol, estradas e gramados. O trabalho de conservação e fiscalização visa manter a biodiversidade da área, que abrange representações dos Campos Sulinos e Mata Atlântica. Abrange o controle de espécies exóticas invasoras, principalmente do Pinus sp, restrição do acesso de visitantes a áreas ambientalmente sensíveis, promoção de pesquisas por universidades e cursos técnicos, atendimento de visitas orientadas à grupos de estudantes, trabalhos de contenção de erosão, vigilância e fiscalização, dentre outros. Todos estes trabalhos visam atender o Plano de Manejo.

A falta de planejamento habitacional em regiões limítrofes como o Pinheiro, e certos bairros de Viamão, acaba contaminando as nascentes pela falta de coleta de esgoto cloacal. Este problema vem se agravando com os anos?

Gerson Luis Mainardi – Em relação à carga de esgoto que a barragem da Lomba do Sabão recebe, sim.

Em 2016 iniciou o processo de instalação do Hospital Veterinário Público Victória nos limites do Parque Saint’Hilaire. Existe risco de contaminação das águas dentro do Parque na sua opinião?

Gerson Luis Mainardi – Questões como doenças em animais e o lixo hospitalar são potenciais contaminadores, desconheço o projeto do hospital e as medidas adotadas para prevenir a contaminação.

Enquanto gerente do PNMSH, e servidor da SMAM, o que o senhor acha que pode melhorar (infraestrutura, apoio) em relação ao trabalho da equipe de manutenção destes 1.148 hectares da Unidade de Conservação?

Gerson Luis Mainardi – Com vistas a cumprir os Programas do Plano de Manejo, o Parque pode melhorar  os serviços de controle de acesso, proteção física dos limites, manutenção das infraestruturas na área de visitação pública, fiscalização e segurança, serviços de controle de espécies exóticas invasoras.

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Entrevista com o idealizador da Ecobarreira, Luiz Carlos Zancanella Junior

A Ecobarreira foi instalada em 2016, dentro dos programas de ação social da Safeweb – Segurança da Informação, com o apoio da Prefeitura de Porto Alegre, através da Smam, do Dep e do Departamento Municipal  de Limpeza Urbana (DMLU). Fale sobre a ideia desse projeto, de onde veio a inspiração?

Luiz Carlos Zancanella Junior – A ideia surgiu de um vídeo que eu na internet de uma barreira parecida na cidade de Baltimore, EUA. Vendo aquele vídeo eu pensei “porque não ter algo assim aqui na minha cidade?, então trabalhei para colocar a ideia em prática. Trouxe a ideia para dentro da Safeweb, e recebi todo o apoio necessário para colocá-la em prática.

A partir desta ideia, de que forma a Safeweb articulou com a Prefeitura de Porto Alegre a instalação deste equipamento. Como funciona esta parceria entre a Safeweb e a Prefeitura de Porto Alegre? Quais são as contrapartidas da prefeitura e os custos de instalação e funcionamento da Ecobarreira?

Luiz Carlos Zancanella Junior – Uma vez que queríamos construir a barreira em uma área não edificável, tivemos que pedir inúmeras autorizações para diversos órgãos da prefeitura. Levou algum tempo até que conseguíssemos todos os documentos solicitados. Somente depois de um ano e meio neste processo, conseguimos a autorização para fazer a instalação. A parceria funciona com a prefeitura, que além de nos permitir trabalhar naquele local, autoriza que os caminhões de recolhimento de lixo, passem diariamente na estrutura, dando um destino final aos resíduos retirados. Não há contrapartida financeira da prefeitura, todos os custos de projeto, construção, manutenção e operação da barreira são bancados pela empresa Safeweb.

A barreira ecológica destina-se a recolher todo o lixo flutuante do córrego antes que chegue ao Guaíba. Quais são os materiais recolhidos, de um modo geral, entre as mais de 250 toneladas de lixo que a ecobarreira impediu que escoassem para o Guaíba desde a sua instalação? E de que forma é descartado esse lixo pelo DMLU, com alto nível de contaminação?

Luiz Carlos Zancanella Junior – A maioria do que é recolhido é material plástico, garrafas PET, latas, plásticos, materiais orgânicos em geral, frutas, animais mortos, galhos, plantas. É bastante diverso o material recolhido. Eventualmente, pegamos coisas impressionantes como uma televisão (daquelas de tubo), colchão, liquidificador, entre outros. Uma das exigências da prefeitura para que pudéssemos realizar esse trabalho é que a empresa não poderia se responsabilizar pelos resíduos recolhidos, que deveriam ser entregues ao DMLU. Assim é feito, e todo o material, por conta do alto nível de contaminação é levado direto ao aterro sanitário.

Explique o funcionamento da Ecobarreira.

Luiz Carlos Zancanella Junior – É uma barreia física flutuante, ancorada nas duas margens do arroio, atravessando o mesmo em diagonal. Desse modo, todos os resíduos que “descem” pelo arroio são direcionados naturalmente até uma das margens, ali existe uma gaiola para onde o lixo é encaminhado. Uma vez que a gaiola esteja cheia, ela é içada até uma plataforma, onde é ensacado e disponibilizado para o DMLU.

 

Fotografia: Leandro Souza Vaz – cedida pela Safeweb

 

A Safeweb lançou um financiamento coletivo para a aquisição de um triturador que irá diminuir o espaço do lixo coletado no aterro. Explique a importância em termos de impacto ambiental desse triturador. E qual o resultado até agora do financiamento coletivo?

Luiz Carlos Zancanella Junior – A ideia do financiamento coletivo era tentar diminuir o impacto que os resíduos geram no que diz respeito ao espaço que ocupam no aterro sanitário. Pense que uma garrafa PET está “cheia de vazio”. O triturador iria otimizar o volume, além de fazer migalhas dos resíduos, facilitando o transporte e aumentando a área de contato, o que facilita na decomposição do material. O financiamento coletivo foi encerrado no início do ano, no mês de janeiro, e não conseguimos atingir o objetivo. Tivemos a ideia então, de fazer um painel digital que mostrasse a quantidade de lixo que já havia sido recolhido pela Ecobarreira, chamamos este quadro de LIXOMETRO, e usaríamos os recursos captados nessa campanha. Demos a opção aos colaboradores de receber o dinheiro de volta ou permitir a realocação dos recursos neste objetivo. Estamos agora em fase final da compra do painel. Queremos inaugurá-lo até o final do ano.

Recentemente foi lançada a Frente Parlamentar em Defesa do Arroio Dilúvio, que é poluído desde às nascentes dentro do Parque Saint’Hilaire, em Viamão, e daí sofrendo diversas formas de contaminação. Qual a perspectiva para este quadro na sua opinião, e a importância de iniciativas políticas como a desta Frente Parlamentar?

Luiz Carlos Zancanella Junior – Vejo que toda e qualquer atitude em prol do Arroio Dilúvio é muito bem-vinda. A Frente Parlamentar faz com que os governantes olhem para o problema do dilúvio e ajam para resolver, ou pelo menos, amenizar o que é gerado. Isso demonstra também que, sim, existe gente preocupada com a preservação do meio ambiente dentro da política. Fomos, inclusive, convidados a participar das reuniões dessa Frente Parlamentar. Quanto à perspectiva, acho que devemos trabalhar mais na causa (que diz respeito ao descarte irregular, às apropriações de áreas de preservação, às ligações clandestinas de esgoto, ao atual sistema de coleta de lixo adotado na cidade), do que no problema. A ecobarreira faz um bom trabalho, mas se não houver a conscientização e educação das pessoas, ela nunca verá uma diminuição do trabalho.

A Safeweb possui interesse em expandir a ideia de ecobarreiras para outros municípios que compreendem a bacia hidrográfica do Guaíba. Essa continuidade é essencial. Finalizando, fale um pouco sobre esses projetos futuros.

Luiz Carlos Zancanella Junior – A Safeweb quer expandir a ideia e proteger cada vez mais, tanto através da implantação de outras barreiras nos afluentes do Guaíba, como em um trabalho de educação a ser realizado nas comunidades próximas a esses pontos. Não temos como arcar com todo esse trabalho sozinhos, e é por isso que estamos fundando o Instituto Safeweb, uma entidade que tem como objetivo centralizar pessoas e empresas interessadas em ajudar na causa do meio ambiente e da educação. Queremos unir esforços, fazer conexões, em prol da nossa sociedade e do nosso planeta.

 

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