Festival Fellas traz boas atrações da atual cena musical gaúcha, mas não agrada público

Ananda Zambi
Fotos: Thiago Lima

Quando queremos assistir a shows, a gente tem a tendência em priorizar as atrações de fora do estado e do país, ou até mesmo tributos. Mas afinal, o que anda acontecendo na cena musical autoral gaúcha? Foi o que o Fellas, evento do Fellas Music Fest, tentou fazer: reunir bandas dos mais variados estilos para embalar uma sábado particularmente gélido em Porto Alegre. Tocaram na noite as bandas Tagua Tagua, Paradise Sessions e Trabalhos Espaciais Manuais e as DJs Mariana Hermel, Sabrina Bastos e Mariana Krüger.

O Fellas Music Fest surgiu em 2015 quando o Opinião, tradicional casa de shows da cidade, parou de produzir uma festa e então liberou os organizadores para fazerem outro evento. Segundo um dos idealizadores, Bruno Nerva, a intenção era somente criar momentos bons com amigos, mas que acabou fortalecendo a cena musical local e profissionalizando as bandas do estado. Já passaram pelo festival bandas como Gelpi e Comunidade Nin-Jitsu.

Fotos: Thiago Lima

A edição do dia 6 de julho aconteceu no Espaço Basement, um galpão personalizado com áreas de convivência, arquibancadas, mini-quadra de esportes e até estúdio de tatuagem. Patrocinado pela Budweiser, ele foi planejado especialmente para a Copa do Mundo no Brasil, em 2014. Um espaço bacana, mas que deixou a desejar na questão, por exemplo, do som. Pelo menos nesse evento.

Para uma noite fria e que competia com dois outros relevantes shows da cena independente brasileira (No mesmo dia, a cidade recebeu os shows de Curumin e Ana Cañas, que já cobrimos), essa edição do Fellas teve um público considerável – aliás, o festival, que já existe há quatro anos, conseguiu conquistar uma fidelização de um público, o que é um desafio para muitos produtores culturais. Porém, parecia que as pessoas ali não sabiam muito bem o que iria acontecer dali para frente.

Depois da DJ Mariana Hermel (vale ressaltar o ponto acertado de só terem tocado DJs mulheres), o Tagua Tagua, projeto que mistura rock, psicodelia e elementos de música eletrônica e brasileira, capitaneado por Felipe Puperi (Wannabe Jalva) e que, em menos de dois anos de vida, já está chegando na Europa e nos Estados Unidos, entrou no palco. Felipe, com sua voz suave e juvenil, cantou “Do Sufoco”, ganhando um charme a mais com um trio de sopros. Em “Na Banguela”, o artista tentou variar um pouco na melodia do refrão, sem sucesso, mas também sem marcar negativamente a apresentação. Um dos pontos altos – além do hit “Preso no amanhã” e da inédita “Peixe voador” –  foi a versão pop-rock de “Estácio, eu e você”, de Luiz Melodia. O Tagua Tagua também tocou as autorais “Desatravessa”, “Rastro de pó” e “Te vi”. Foi uma boa apresentação, mas infelizmente pouquíssimas pessoas estavam prestando atenção e dispostas a conhecer músicas novas. 

Fotos: Thiago Lima

A Paradise Sessions se apresentou depois do set da DJ Sabrina Bastos, e foi, com certeza, a banda que mais animou a galera, talvez por ser a banda mais conhecida e mais pop dentre as atrações, ou até mesmo por ser veterana no festival. Achei que o repertório do conjunto se restringia a um reggae autoral bem produzido, mas para minha surpresa ele entoou também músicas puxadas para o rock. Ao final, a Paradise Sessions fez duas versões de Charlie Brown Jr (“Zóio de Lula” e “Senhor do Tempo”), uma do Natiruts (“Quero ser feliz também”) e uma do Tim Maia (“Você”). 

A última banda a tocar nessa edição do Fellas é uma das melhores revelações da cena local dos últimos anos: a Trabalhos Espaciais Manuais, também chamada de TEM. Também infelizmente, foi uma banda prejudicada pelo horário: já era cerca de três da manhã quando os dez integrantes começaram o show, e, aliado ao frio, quase metade da plateia havia ido embora. Mas quem ficou se deliciou com com uma sempre divertida e interativa apresentação de música instrumental que une jazz, R&B, soul, ritmos latinos e brasileiros.

Entre as músicas, eles tocaram “Manobra de dobra em Urano”, “Noite de amor na Jamaica” e o sucesso “Farofa de banana”, que fez a banda ser selecionada para participar da coletânea John Armstrong presents AfroBeat Brasil, lançada pelo selo londrino BBE. A única coisa de que senti falta foi da grande mistureba sonora  “Cada dia um novo amor” –  sem dúvida, minha preferida deles. No fim do festival, Mariana Krüger assumiu o controle da pick up tocando, como já é comum na noite porto-alegrense, os sucessos do funk. Um evento organizado e com um bom repertório, mas com um público que, apesar de fidelizado, queria se divertir de outras formas. Faltou sintonia.

 

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Editora, nordestina, nômade e entusiasta de produções autorais. Gosta de escrever sobre música e qualquer coisa que seja cultura.
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