Um ano de travessia – TV

Em setembro de 2010, quando o Nonada entrou no ar, pouco esperávamos que os programas televisivos pudessem representar uma fonte nobre de cultura, mais ou menos como os livros e o cinema costumam representar. De certo modo, o preconceito que contorna o ambiente mais popular de entretenimento e de conhecimento do planeta impossibilita o pleno entendimento da sua capacidade como disseminador de cultura. Para quebrar essa tendência, retomamos aqui o que de mais interessante aconteceu na grade das emissoras nacionais e internacionais nos últimos 365 dias. Na retrospectiva de hoje, os dez fatos que marcaram definitivamente o cotidiano da televisão.

Com uma audiência incrível para o horário do fim da noite, a minissérie As Cariocas permaneceu na grade da Rede Globo entre os meses de outubro e dezembro de 2010. Baseada na obra homônima do escritor Sérgio Couto – mais conhecido como Stanislaw Ponte Preta – o programa chegou a competir diretamente com o reality-show A Fazenda, exibido pela concorrente Rede Record. Com um elenco de peso, que contou com as atrizes Sônia Braga, Alinne Moraes, Déborah Secco, Paola Oliveira e Alessandra Negrini protagonizando um episódio cada, As Cariocas evidenciou toda a sensualidade e toda a particularidade da mulher do Rio de Janeiro. O sucesso do formato dividido em apenas dez episódios foi conduzido pelo prestigiado diretor Daniel Filho (do recorde de bilheteria nacional Se Eu Fosse Você 2).

Depois de passar os primeiros meses de 2010 lutando contra um câncer, o ator Michael C. Hall voltou à pele do carismático serial-killer Dexter em setembro do mesmo ano. O programa, baseado na obra homônima do escritor norte-americano Jeff Linsday, não precisou ter a sua quinta temporada adiada, já que Hall pode iniciar e concluir o tratamento radioterápico, especificamente do linfoma de Hodgkin, no recesso de verão dos programas televisivos do país. Com uma série de prêmios – como dois Globo de Ouro e três Emmy apenas em 2010 – o seriado desponta como o preferido de boa parte do público apaixonado pelo formato, sobretudo o brasileiro, que pode acompanhar o dia a dia do assassino mais querido da América em rede aberta pela Rede TV!. A sexta temporada de Dexter está marcada para estrear nos Estados Unidos no próximo mês de outubro.

Na contramão da maioria das novelas da Rede Globo, Cordel Encantado estreou no dia 11 de abril com uma proposta verdadeiramente inovadora. A história por trás do triângulo amoroso, que tem como cenário o sertão brasileiro, possui referências da literatura de cordel e da narrativa dos contos de fadas. Criada pela dupla Duca Rachid e Thelma Guedes, Cordel Encantado encheu de imediato os olhos do público pela riqueza de seus detalhes, sobretudo na fotografia e no figurino, e por investir pesado na sua produção tipicamente cinematográfica. O uso da câmera F35 nas sequências gravadas na França e no Sergipe deu à imagem uma textura diferenciada e uma qualidade até então pouco exibida pelas novelas brasileiras. Com uma audiência incrível para o horário das seis horas – estimada em 24 a 29 pontos no Ibope – Cordel Encantado possui ainda atores do primeiro escalão nacional, como Bianca Bin, Cauã Reymond, Nathália Dill, Jayme Matarazzo e Débora Bloch.

Parecia improvável, mas o ciclo do ator Steve Carrell no seriado humorístico The Office se encerrou no último mês de abril. O ator, que estrelou o programa durante sete temporadas e conquistou um enorme prestígio entre público e crítica, anunciou que deixaria a atração um ano antes, para o espanto dos admiradores do pseudodocumentário ambientado na empresa Dunder Mifflin, especializada em papeis e impressoras. De acordo com a revista Entertainment Weekly, o último episódio de Steve Carrell no comando do escritório foi assistido por mais de oito milhões de pessoas nos Estados Unidos e foi apontado pelos fãs como o melhor programa da sétima temporada inteira. Embora tenha vencido o Globo de Ouro na categoria melhor ator de comédia em 2006, Steve Carrell pretende se dedicar também a outros tipos de papeis nos cinemas. Os executivos do programa, por outro lado, ainda não anunciaram quem será o novo chefe do escritório – o que só será revelado durante a oitava temporada – que inicia no fim desse mês na América do Norte.

Para muitos, Hermes e Renato foi o programa humorístico mais transgressor do seu tempo. Com muito deboche e um vocabulário extremamente ácido, o programa estreou em 1999 na grade da MTV Brasil e conquistou rapidamente o sucesso na emissora, sobretudo entre os adolescentes. Com o tempo, Hermes e Renato foi agregando novos atores, como o surpreendente Jaime Gil da Costa, em 2003. Conhecido apenas como Gil Brother, o carioca de Petrópolis se tornou imediatamente a figura mais carismática e imponente do grupo, consequência direta da sua capacidade de criar no improviso ou ainda do seu humor extremamente natural. Em 2009, quando o programa se mudou para a Rede Record, Gil Brother, que já comandava uma série de quadros individuais, deixou a trupe comandada por Marco Antônio Alves e por Fausto Fanti. Praticamente esquecido, o ator voltou aos holofotes da mídia em 2011. Ele não só concedeu uma polêmica entrevista à revista Trip, sobre os anos difíceis em que permaneceu com o grupo, como ainda estreou o seu próprio canal no Youtube, meses depois. O Canal Away reproduz os mesmos esquetes de outrora e o mesmo humor politicamente incorreto criado pelo inesquecível Away de Petrópolis. O sucesso imediato dos novos programas e do novo formato evidencia muitíssimo bem o contraponto entre o sucesso de Gil Brother e a decadência dos seus ex-companheiros do agora batizado Banana Mecânica.

Considerado um dos maiores programas televisivos de todos os tempos, o talk show norte-americano The Oprah Winfrey Show estreou na emissora ABC ainda nos anos oitenta e permaneceu por mais de duas décadas no ar. Com números altíssimos de audiência – estimados pela revista Forbes em 44 milhões de pessoas apenas nos Estados Unidos e veiculado em outros 144 países – o programa transformou a apresentadora Oprah Winfrey em um das mulheres mais ricas e influentes do mundo. No entanto, o prestígio e a fortuna estimada em dois bilhões de dólares não impediram que Oprah buscasse novos desafios. Com dois anos de antecedência e “depois de muita oração e meses de análises cuidadosas”, a apresentadora anunciou que o seu programa estava já tinha data certa para acabar. No dia 25 de maio de 2011, a despedida de The Oprah Winfrey Show atingiu a sua maior audiência desde o programa especial dedicado ao cantor Michael Jackson, em 1993. Atualmente, Oprah vem se dedicando à sua própria emissora, a Oprah Winfrey Network (OWN), que deve estrear em janeiro de 2012 nos Estados Unidos.

Não há dúvidas de que o ator norte-americano Charlie Sheen há anos prejudicava a continuidade do seriado Two and a Half Men por causa da sua personalidade autodestrutiva e pelo consumo desenfreado de drogas e de bebidas alcoólicas. No entanto, nenhum dos problemas do passado, que envolveram agressões físicas e clínicas de reabilitação, pareceram afetar o prestígio do humorístico de maior sucesso nos Estados Unidos. Pelo menos até o mês de março de 2011, quando a Warner Bros demitiu Sheen após o derradeiro abuso de entorpecentes, que colocou o ator mais bem pago da televisão americana – cerca 2,25 milhões de dólares por episódio – entre a vida e a morte na cama de um hospital. Depois de muita polêmica e discussões envolvendo a continuidade da série e o próprio ator, o canal norte-americano CBS confirmou a continuidade do programa, mas com Ashton Kutcher substituindo a figura de Charlie Sheen. Na nova trama, Kutcher é um milionário que adquire a casa deixada pelo compositor de jingles após a sua morte. O início da nova temporada, inclusive, mostra o velório do personagem imortalizado por Sheen.

No fim do mês de maio, uma nova conta no Twitter surpreendeu boa parte das pessoas que cresceu assistindo televisão, sobretudo os programas de início da tarde do canal SBT. O ator mexicano Roberto Bolaños, que eternizou o personagem Chaves no seriado homônimo, é o novo usuário da rede social mais disseminada entre as celebridades do mundo. Com mais de 1,5 milhão de seguidores conquistados já nos primeiros dias, Bolãnos, que completou recentemente 82 anos, aproveita a proximidade proporcionada internet para conversar com os seus fãs – até pela videoconferência Twitcam – sobre política e sobre o programa mais popular da história do seu país, que permaneceu no ar entre os anos 1971 e 1992 pela rede Televisa. No Brasil, Chaves continua até hoje com reprises diárias no SBT, além de uma versão em desenho animado transmitido pelo Cartoon Network, conquistando cada vez mais adoradores e construindo de forma ainda mais mítica a figura de Bolaños no imaginário de adolescentes – e por que não – pessoas já adultas.

Depois de mais de trinta anos, a novela O Astro, escrita por ninguém menos do que pela eterna Janete Clair, retornou à grade da emissora que a transmitiu na década de setenta. O remake da obra de enorme sucesso foi reescrita pela dupla Alcides Nogueira e Geraldo Carneiro para um formato mais enxuto, de pouco mais de sessenta episódios, em contrapartida aos quase duzentos da sua versão original. A trama, por outro lado, permanece intacta, assim como os personagens enigmáticos Herculano Quintanilha (interpretado por Rodrigo Lombardi) e Salomão Hayalla (conduzido por Daniel Filho), que é mais uma vez assassinado nos primeiros capítulos para se transformar na principal incógnita a ser revelada da história. Com incríveis 27 pontos no Ibope para uma faixa de horário bem menos nobre do que a ocupada por Fina Estampa, O Astro comprova a atemporalidade dos clássicos da Rede Globo e abre brecha para novos remakes nos mesmos moldes. O horário do fim da noite – para além das 22h – se consolida igualmente como uma ótima alternativa para novos programas e novas investidas do canal na área da teledramaturgia.

A estreia de The Big Bang Theory pode até ter tido um início tímido nos Estados Unidos em 2007, mas em pouquíssimo tempo o seriado se tornou um dos mais prestigiados do canal CBS ao ponto de ser retransmitido para uma centena de outros países pela Warner Bros, que detém os direitos sobre a série. O programa, que foi o maior vencedor do Emmy Awards em 2010 e do Globo de Ouro em 2011, caiu imediatamente no gosto do público jovem, sobretudo dos apaixonados pela cultura geek. A figura dócil e naturalmente cativante dos nerds Leonard Hofstadter e Sheldon Cooper –  esse interpretado pelo sensacional Jim Parsons – proporciona altas doses de um humor extremamente refinado e incomum para os programas tradicionais de comédia. Embora tenha deixado a grade do SBT por falta de audiência no mês passado, The Big Bang Theory confirmou o seu status de protagonista entre as principais séries norte-americanas e teve o seu milionário contrato renovado em janeiro de 2011 para mais três temporadas.

Compartilhe

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *