Gay Talese encerrou as discussões do penúltimo dia do 4º Congresso Internacional de Jornalismo Cultural.(Crédito: Revista Cult)

Ele só queria contar histórias

Julimária Dutra, de São Paulo para o Nonada

 

Gay Talese encerrou as discussões do penúltimo dia do 4º Congresso Internacional de Jornalismo Cultural.(Crédito: Revista Cult)
Gay Talese encerrou as discussões do penúltimo dia do 4º Congresso Internacional de Jornalismo Cultural.(Crédito: Revista Cult)

Trajado com um terno de linho verde de abotoaduras grandes e uma gravata creme, o homem de cabelos totalmente brancos pisa com firmeza e agilidade em direção ao palco. A produção do Congresso de Jornalismo Cultural estava eufórica, afinal não é todo dia que o Brasil recebe um dos inventores do Novo Jornalismo, um gênero que visa à construção de reportagens impressionistas, com aguçada riqueza de detalhes.    

Eram cravadas 19h quando Mr. Talese pisou no palco do TUCA para dar uma palestra para 300 jovens. Devagar ele puxou o chapéu e discretamente sorriu para a plateia. Com ajuda, ajustou o fone de tradução e o colocou no ouvido, enquanto suas mãos estavam imóveis sobre a mesa, uma sobre a outra.

À medida que o intermediador da mesa Ivan Finoti introduzia a plateia sobre os trabalhos de Gay Talese, ele ouvia as palavras como se quisesse sorver cada uma delas. Paralelo observava com atenção a plateia. Olhava de até onde sua visão conseguia enxergar, seus olhos não paravam.  

Talese começa a falar e logo de cara brincou com Finoti dizendo que se sentia lisonjeado por receber tantos elogios, mas não merecia um discurso tão rebuscado para falar dele, por se considerar uma pessoa simples.  

É inegável: o homem que estava diante de nós é um ser observador. Uma habilidade que para ele não foi ensinada dentro da universidade de jornalismo, mas que vem sendo lapidada desde os seus 15 anos, quando trabalhava na loja de vestidos de sua mãe, observando e ouvindo atentamente as conversas das clientes. “Foi escutando as histórias daquelas mulheres, os relatos delas, de mães que tinha filhos servindo na Guerra e como a 2º Guerra dificultava até uma simples compra de tecido, que me dei conta onde estavam as boas histórias – nas pessoas comuns”.

Enquanto falava, da plateia não se ouvia um único sibilo, todos estavam concentrados no que o autor de “Honra Teu Pai” tinha a dizer. E Gay Talese que esperava iniciar a palestra sendo intermediado por perguntas dos estudantes, esqueceu do roteiro pré-estabelecido por ele mesmo e falou. E falou. Falou sobre a sua infância, se considerando um resultado do momento histórico. Apontou que assim como os que estavam iniciando a carreira – cheia de dificuldades -, ele também enfrentou uma série delas. O escritor lembrou de quando começou a trabalhar como office boy na redação do New York Times até virar repórter e depois, ele mesmo, pedir as contas e sair do jornal para trabalhar por conta própria.

O discurso de Talese foi empolgante, quem o ouviu saiu com vontade de escrever histórias e contar a vida de pessoas, sem tantos mistérios, sem tantas parafernálias eletrônicas. Apenas um pequeno papel, uma caneta e a memória.

“Não uso nada, eu apenas presto atenção. Faço apontamentos, anoto frases, detalhes, em pedaços de papeis que reaproveito da lavanderia e transformo-os em lembretes. Afora isso, eu levo tudo na memória e depois quando chego em casa começo a escrever em minha máquina datilográfica”.

Mas Talese destacou que um escritor não nasce do dia para noite, é preciso além de trazer sensibilidade a tudo o que se escreve, ler bons escritores. “Lendo autores como Ernest Hemingway, Guy de Maupassant e Liev Tolstói, eu aprendi a descrever cenas, construir diálogos… aprendi a escrever bem… e você tem de estar lá, escrever o que se está vendo, porque se você apura pela internet você não será o tipo de jornalista que eu quero que você seja”. Para Talese, é preciso que exista tempo para se dedicar ao jornalismo e escrever com seriedade, estando atento aos detalhes do ambiente.

Depois de mais de uma hora de injeção de ânimo Mr Talese foi ovacionado. Muitos se aglomeravam ao redor do palco com livros na mão a espera do tão desejando autógrafo. A produção estipulou 30 minutos e Talese concordou. Ele arrumou a mesa em que estava, tirou o chapéu, a coca-cola que tomava e deu o sinal. Rapidinho ele assinava livro por livro. Uma energia quem nem todo jovem de 20 anos possui. Foto, sorriso, autógrafo, entrevista antes, depois. Teve Gay Talese para todo mundo. Atencioso com todos e dado por finalizado as atividades Talese tomou o carro junto com a tradutora e seguiram. Hotel? New York? Livraria? Conjunto Nacional? Vai saber. Ele foi, mas antes de ir olhou para os jovens e nos disse: “façam o melhor e sejam bons o suficiente”. 

 

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