Pitty está mudando de pele

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Fotos: Ita Pritsch

Sei que muitos vão ler esta resenha torcendo o nariz, porque dificilmente irão admitir o que está diante de seus olhos (e narizes): Pitty é, hoje, sem sobra de dúvida, um dos principais nomes do rock brasileiro. E quando ela diz às pessoas que é foda, não se trata de arrogância, mas de urgência. Algo do tipo: “oi, eu estou aqui. Até quando vocês vão tentar diminuir o meu trabalho?”.

Parte desse desprezo ocorre, talvez, pelo fato de a cantora baiana ter recebido grande exposição na MTV e nas rádios FM, os espaços mais privilegiados que havia no mainstream dos anos 2000. E, é claro, por falar diretamente a um público muito, muito jovem, que é quem se identifica mais com as músicas dela. Mas as coisas parecem estar mudando.

Foi uma bela surpresa chegar ao Opinião na última quinta-feira, dia 21 de maio, e notar que não havia apenas adolescentes com faixas escritas “Pitty, eu te amo”, ou “Tira uma selfie comigo” na plateia. Ok, a tietagem não é proibida e comia solta, como era de se esperar, e o bar estava absurdamente lotado, também como era de se esperar. Mas dava pra perceber alguns barbados na pista, e moças que já haviam passado dos 20. Na verdade, havia muitas mulheres e homens com mais de 30 anos, ou até mais. Um público inimaginável quando Admirável Chip Novo foi lançado, 12 anos atrás.

Pitty não é mais a adolescente furiosa dos tempos de Inkoma (este que vos escreve é velho o suficiente para ter escutado a cantora em uma demo de hardcore…), mas também não parece satisfeita com o status de “sucessora da Rita Lee”, como já foi chamada. Embora reverencie a mestra, ela tem sua própria (e forte) identidade, refletida nas letras das muitas músicas novas que tocou. Aliás, Pitty parece mais confortável cantando músicas novas do que os velhos hits, o que é perfeitamente compreensível.

A produção do show é boa, e o clipe de abertura, com um close de Pitty dissertando sobre curiosidades envolvendo o número 7 antes da faixa-título de Sete Vidas, dá o tom da apresentação.  Em “Teto de Vidro” e “Pulsos”, a sensação é de que o chão está tremendo, e fica claro que a baiana tem o público na mão quando transforma composições menos grudentas, como “Memórias” e “Anacrônico”, em momentos apoteóticos. “Deixa Ela Entrar”, com seu riff à la Queens of the Stone Age, reforça as qualidades do novo álbum, e, mesmo sendo nova, é cantada em uníssono.

Em seus quatro discos de estúdio, Pitty pode ter acumulado muitos sucessos, mas não dá para negar que “Me Adora” já é o maior deles. A reação do público a essa música é surreal. E dá pra entender o porquê: o ritmo bubblegum anos 60 gruda na cabeça, assim como a letra, um belo recado à imprensa – ou você achava que o famoso “e me acha foooda” era para seus seguidores?

Fãs de carteirinha se exaltam ainda mais em canções como “Na Sua Estante” e “Equalize”. A primeira não é lá grandes coisas (na verdade, acho até meio chatinha), mas a segunda tem uma melodia muito bonita, que se sobressai à letra. Já “Máscara”, do primeiro disco, fica melhor na roupagem ao vivo, bem mais pesada.

Com ritmo tribal e letra instigante, “Serpente”, a música que encerra o show e o álbum Sete Vidas, parece um aviso aos fãs: “Chega dessa pele, é hora de trocar”. Pitty está madura e convida seu público a amadurecer com ela. E, pode acreditar, essa é uma virtude rara nos dias de hoje.

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