Osmar Terra: “Não adianta destinar recursos se não há qualidade do produto cultural”

Muitas perguntas, poucas respostas e um mal-estar entre Legislativo e Executivo marcaram o encontro entre o ministro da Cidadania, Osmar Terra, e a Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados.  Nesta quarta-feira (24), o ministro foi recebido pela Comissão para responder questões específicas da área da Cultura. Terra é um dos oito ministros do primeiro escalão a serem sabatinados no Congresso e foi acompanhado pelo secretário especial de Cultura, Henrique Pires, que não falou.

A reunião já começou desgastada após a fala inicial do ministro. Em pouco mais de 30 minutos de apresentação, Terra destinou os 5 últimos à área da Cultura. Na sabatina, críticas dos deputados da oposição, do centro e até do governo, na figura do deputado Alexandre Frota (PSL), que partiu para o fogo amigo ao ironizar o desconhecimento de Terra na área e criticar sua gestão. “O senhor fez uma apresentação, falou de idosos, criança feliz, bolsa atletas, mas só 3 minutos de cultura. Essa música que o senhor colocou no vídeo, o ministério tem os direitos autorais dela?”, disparou. Frota, aliás, é o autor do requerimento de convocação do ministro, que mais tarde foi transformado em convite por um pedido de Jandira Feghali (PCdoB) ao deputado.

Em clima de ironia, parlamentares questionaram sua falta de experiência na área, colocações que o ministro respondeu: “Eu não preciso ser especialista, posso ser um gestor público preocupado com cultura. Tivemos presidentes com Ensino Fundamental que deram resposta”.

Com relação ao único projeto do governo apresentado até o momento para a área, a reforma da Lei Rouanet, os deputados perguntaram sobre o porquê de o Ministério ter formulado um teto de R$ 1 milhão por projeto e aumentar a obrigatoriedade de ingressos gratuitos, o que afetaria pequenos e médios produtores e artistas. “Política cultural não se faz com ingresso gratuito, se faz com fomento ao setor”, afirmou o ex-ministro da Cultura e atual deputado Marcelo Calero (Cidadania).

Muita fiscalização, pouco fomento

Foto: Samuel Figueira/Câmara dos Deputados

Entre as colocações dos deputados, foi destaque também a ideia de criminalização dos artistas, corroborada por declarações do presidente Jair Bolsonaro (PSL) nos últimos anos e no início de mandato. O ministro não comentou a questão, mas boa parte do tempo foi destinada à questão de prestação de contas, tanto na Lei Rouanet quanto na Ancine. A Ancine foi outro tema preocupante, uma vez que os parlamentares queriam saber sobre a paralisação dos repasses de recursos. “Estamos trabalhando com o Ministério da Justiça e a Polícia Federal para fazer uma força-tarefa. A Ancine tem 10 anos sem prestação de contas dos filmes. Eu não mando na Ancine, acho que vocês deveriam fazer uma audiência com o presidente da Ancine”, respondeu, sem, no entanto, propor soluções para a falta de verba.”

Ainda com relação ao audiovisual, o ministro distorceu o problema da divulgação e da distribuição do cinema brasileiro, direcionando a questão para o conteúdo dos filmes. “Cade o público, cadê o povo brasileiro nas salas de cinema? não adianta a gente ficar destinando recursos senão preocupação de qualidade do produto cultural”, afirmou.

Dos 60 minutos que teve para responder aos blocos de perguntas, Terra usou pouco mais de 30 minutos. “Fui o primeiro a fazer um programa de saúde da família lá em Santa Rosa, em 2016”, iniciou, destacando seu currículo para então garantir aos parlamentares que a estrutura do antigo Ministério continua. “O trabalho da cultura é importantíssimo, está toda preservada na estrutura do Ministério, todos os cargos estão lá. Não vai se gastar um centavo a menos”, afirmou, falando também sobre a descentralização da cultura que, pelas respostas, ficará a cargo da reformada lei Rouanet. “Os Centros de Tradição Gaúcha, a literatura de cordel do nordeste não tem incentivo nenhum da Lei Rouanet”, disse, utilizando os 3 minutos seguintes para falar de bancos regionais.

Uma das respostas específicas foi em relação ao Plano Nacional de Cultura  (que determina as diretrizes e princípio da pasta),  cuja validade deve ser prorrogada, segundo o ministro. O Conselho Nacional de Políticas Culturais também está sendo pensado, informou. “Parece que todos os problemas surgiram porque fundiram três ministérios e o ministro é especialista em berimbau”, rebateu. Terra, no entanto, não respondeu a  outras questões dos deputados que são caras aos profissionais de cultura. Sistema Nacional de Cultura, a Lei Cultura Viva, a questão do repasse das loterias para a área foram ignorados na fala de Terra.

Compartilhe
Ler mais sobre
Direitos humanos Reportagem

Apagão de dados e ausência de leis de cotas promovem desigualdade racial nos serviços públicos municipais

Políticas culturais Reportagem

Primeiro Plano Nacional de Cultura chega ao fim com dados inconsistentes e 3 metas cumpridas