Cultura melhorou qualidade de vida de 44% dos brasileiros na pandemia

Rafael Gloria

Ilustrações: Joanna Lira

Em nova pesquisa sobre os hábitos culturais realizada pelo Itaú Cultural em parceria com o Datafolha, 36% dos entrevistados relataram problemas de saúde mental em algum morador da residência nos últimos 12 meses. A região Sul foi a de maior incidência de casos, com 43% de entrevistados apontando a ocorrência do problema. O impacto da pandemia na saúde mental e a relação com o consumo cultural foram abordados pela primeira vez na pesquisa, realizada desde 2020. Foram  2276 entrevistas em todas as regiões do Brasil.  

O estudo investigou também qual o impacto das atividades culturais na saúde mental dos entrevistados. Para 44% dos que realizaram ao menos uma atividade cultural ao longo dos últimos 12 meses, a iniciativa melhorou a qualidade de vida; 48% dizem que diminuiu o estresse e ansiedade; 55% apontaram melhora no relacionamento com outras pessoas da casa em que vivem. De acordo com o levantamento, 49% perceberam diminuição da solidão (no levantamento anterior, realizado em 2020, eram 54%) e 51% relataram diminuição da sensação de tristeza.

O levantamento ouviu 2.276 indivíduos em todo o país, entre os dias 10 de maio e 9 de junho, o aumento de consumo de cultura no ambiente virtual ocorreu no momento em que os brasileiros passaram a ficar mais conectados à internet. Agora, 76% dos entrevistados informaram que passaram a se conectar todos os dias. Em 2020, o índice era de 71%.

Para Eduardo Saron, diretor do Itaú Cultural, a arte também pode ser um espaço de cura. “Por isso também trouxemos essa questão para a pesquisa, para evidenciar ainda mais esse assunto”, diz. Ele revela que ano que vem o tema da saúde mental também estará muito presente nas atividades culturais da instituição.  

Novo normal 

Ilustração: Joanna Lira

Os brasileiros aumentaram o consumo de atividades culturais no ambiente online durante a pandemia e pretendem manter o hábito após a volta à normalidade. A pesquisa Itaú Cultural/Datafolha também apontou que 80% dos que assistiram a apresentações de teatro, música e dança nesse ambiente pretendem seguir com a prática mesmo após a volta à normalidade. O índice é o mesmo declarado para aulas ou oficinas de arte. Já entre os espectadores de apresentações infantis, o índice é de 81%, semelhante aos 82% declarados pelos habitués de seminários nas redes.

É menor o índice de continuidade da prática no caso das exposições e museus (67%). Registraram patamares equivalentes, estatisticamente, visitas virtuais a centros culturais  (78%), oficinas de criação para crianças (75%) e visitas guiadas a projetos artísticos (76%)

Para Saron, a pesquisa mostra que o digital veio para ficar. “O mundo da cultura precisa estar pronto para receber as pessoas no físico, mas o virtual também se tornará presente, o ‘fisico-digital’ será o grande desafio para toda produção cultural brasileira”, diz. O luto e o trauma da Covid-19 também vão influenciar no trabalho desses agentes. “As pessoas vão chegar com várias dores, das suas perdas, de familiares, amigos. Aprofundou-se a desigualdade no país, e essas dores precisam estar no nosso enfoque, acolher é preciso, o mundo da cultura terá que estar pronto para acolher as pessoas”, pondera.  

Outro dado levantado pelo estudo mostra que as atividades online ampliaram o acesso e aumentaram o interesse do público para a cultura. De acordo com o levantamento, 72% informaram que as atividades online permitiram acesso a atividades culturais que, de outra forma, não seriam experimentadas. Na pesquisa anterior, realizada em 2020, o índice tinha sido de 67%.

O conteúdo online ampliou o acesso especialmente entre os jovens de 16 a 24 anos onde a concordância com a afirmativa foi de 79%. Os que se dizem menos impactados foram os indivíduos entre 45 e 65 anos, que apontaram taxa de concordância de 69%. 

O interesse por atividades culturais também aumentou graças à oferta de conteúdos online.  Os mais impactados foram os indivíduos entre 16 e 24 anos, onde a concordância com a afirmativa foi de 64%. O estrato da Classe C registrou 59% de concordância com o benefício

Do que o público sente falta

A pesquisa mostra ainda que o convívio social está fazendo falta para os espectadores. Segundo 41% dos entrevistados, o que mais faz falta no fechamento das atividades de cultura são as interações com outras pessoas. Em 2020, o índice alcançava 20% da amostra. 

Nesta nova rodada da pesquisa, 42% declaram que estão sentindo falta de entretenimento e diversão como consequência do fechamento das atividades culturais. Em 2020, o índice era de 38%. A falta de convívio decorrente da interrupção de atividades culturais presenciais é mais aguda entre as mulheres (44%) do que entre os homens (38%). O fenômeno sensibiliza mais os jovens de 16 a 24 anos (47%) e os adultos mais velhos, entre 45 e 65 anos (45%), do que  as faixas de idade intermediárias de 25 a 34 anos (34%) e 35 a 44 anos (38%), e é mais perceptível no interior do país (45%) do que nas capitais e regiões metropolitanas (37%).

A pesquisa Itaú Cultural/Datafolha também perguntou aos entrevistados qual a atividade cultural que mais fez falta durante a pandemia. Em uma lista em que foram consideradas as três atividades preferidas, cinema ficou em primeiro lugar, com 67% das respostas, seguido por apresentações artísticas (32%), bibliotecas (21%), empatada com atrações infantis (20%), e centros culturais (17%). Seminários pontuaram com 12%, mesmo índice de aulas e oficinas de arte. Exposições e museus tiveram 15% das preferências na lista tríplice, seguidos por oficinas de criação para crianças (9%). Já 8% disseram sentir falta de saraus de poesia, literários e 3% de projetos artísticos guiados. Outros 6% declararam não sentir falta de nenhuma das atividades apresentadas pelos pesquisadores.

Maior circulação nas cidades

Ilustração: Joanna Lira

O levantamento também mostra que a volta das atividades culturais deve provocar maior circulação dos indivíduos nas cidades. Segundo o levantamento, 51% dos entrevistados este ano disseram que pretendem realizar atividades culturais fora de seus bairros, quando a rotina voltar ao normal. Em 2020, o índice era de 44%.

Os que diziam que frequentavam atividades culturais em seus bairros somavam 47% em 2020. Este ano, são 32%, uma redução de 15 pontos percentuais, o que mostra maior disposição para circular pela cidade para  desfrutar de atividades culturais.

Os homens (52%) e mulheres (49%) apresentam disposição equivalente para sair de seus bairros para realizar atividades culturais. Por perfil e classe social, os indivíduos da Classe A/B estão mais propensos a buscar cultura fora da sua região de moradia (58%), no que é seguida pela D/E (51%). A Classe C parece mais fixa, segundo o levantamento, com apenas 46% declarando disposição para circular pela cidade para vivenciar atividades culturais.

Compartilhe
Jornalista, Especialista em Jornalismo Digital pela Pucrs, Mestre em Comunicação na Ufrgs e Editor-Fundador do Nonada - Jornalismo Travessia. Acredita nas palavras.
Ler mais sobre
Processos artísticos Reportagem

O corpo artístico na tela: artistas exploram novas linguagens com foco na tecnologia

Comunidades tradicionais Processos artísticos Resenha

Do ventre da árvore do mundo vem “O som do rugido da onça”

Notícias Políticas culturais

“SUS da Cultura”: entenda como vai funcionar o Sistema Nacional de Cultura