Um ano de travessia – Cinema

Pois é, pessoal, o Nonada completou um ano no dia nove de setembro – como vocês já devem saber, leitores atentos que são. Para comemorar resolvemos fazer uma lista com os maiores acontecimentos durante esse período (Ah, diz, quem é que não gosta de uma lista?). Além da parte de games, fiquei encarregado também pela parte de cinema. O que designa a qualidade de uma lista também é a polêmica que ela suscita, uma vez que evidencia a opinião e a interpretação de quem a constrói – afinal, somos seres humanos, seres subjetivos. Então, os comentários estão aí para debates: se não concordarem, argumentem, se concordarem, digam o porquê. Estamos abertos.

Tropa de Elite 2: O Inimigo agora é outro lançado em outubro de 2010 foi simplesmente o filme brasileiro mais visto na história do cinema nacional – superando, inclusive, Dona Flor e Seus Dois Maridos. O filme de José Padilha acumulou cerca de 11 milhões de espectadores, tornando-se, assim, também a maior bilheteria da história do País, arrecadando R$ 102,6 milhões. Atualmente, Tropa de Elite 2 é um dos quinze filmes brasileiros que estão disputando a chance de concorrem a uma indicação ao Oscar de Melhor Filmes Estrangeiro de 2012. E tem chance de ter um terceiro episódio da franquia? Padilha, no Festival de Berlim, em fevereiro desse ano, descartou a possibilidade. “Já contei tudo o que queria dizer sobre violência”, afirmou o cineasta em entrevista coletiva após a exibição do filme na capital alemã.

 Um dos pontos mais tradicionais de São Paulo, o Cine Belas Artes é o personagem central de uma polêmica que começou em janeiro desse ano. A ameaça de fechamento do cinema veio a público em março de 2010, quando o HSBC pôs fim ao patrocínio. André Sturm, o proprietário, começou então a bater à porta de algumas empresas, atrás de nova parceria. Em novembro do mesmo ano foi combinado um novo apoio, mas quando a minuta do contrato estava sendo finalizada veio a surpresa: O proprietário queria o imóvel de volta porque planejava abrir uma loja no local. No dia 17 de março de 2011, foram exibidas as últimas sessões no Cine Belas Artes. Uma das esperanças dos cinéfilos e proprietários do cinema é o tombamento do prédio. A análise do caso ainda está em processo, mas as notícias não são muito animadoras.

Até 2003 o Brasil realizava em média cinco filmes em parcerias com outros países, hoje este número já passa de trinta co-produções ao ano. A formatação de uma política pública e a criação de entidades que regulamentem o processo foi fundamental para que estes números crescessem na proporção que cresceram. Apesar do cinema brasileiro ter conquistado visibilidade e prestígio com filmes premiados em grandes festivais ao redor do mundo, ainda temos uma cinematografia frágil diante do mercado interno e externo. E a conquista de mercado tem sido uma das argumentações mais fortes das parcerias entre diferentes países. Festivais como o Cinesul, do Rio de Janeiro, o FAM em Florianópolis, e o Fórum entre Fronteiras no Rio Grande do Sul que envolve integração com o Mercosul são eventos atentos a esta grande rede de parcerias, fazendo do Brasil o palco para grandes acordos diplomáticos. A imagem ao lado é do filme Reus, parceria entre o Uruguai e o Brasil.

O biênio 2010-2011 também vai ficar marcado como o final de alguma das maiores franquias da década. Como, por exemplo, o caso da série Harry Potter, que vai deixar muitos fãs órfãos. Para se ter uma ideia, Harry Potter e as Relíquias da Morte: Parte 2 se tornou a terceira maior bilheteria da história do cinema. O longa alcançou a marca de US$ 1,137 bilhão e desbancou O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei e seu US$ 1,119 bilhão. É a série e a adaptação cinematográfica mais rentável da história do cinema. Toy Story também chegou a sua conclusão, tendo a Pixar encontrando um final digno para a saga de Woody e Buzz Lightyear. Diferentemente, Shrek, outra famosa animação, também acabou, mas com a crítica e a bilheteria abaixo do esperado. Bom lembrar que Amanhecer – Parte I  também tem estreia prevista para esse ano. Queira ou não, todos esses filmes movimentam montanhas de dinheiros e fazem o público circular afoitamente no cinema. Em uma época que a crise financeira é forte, principalmente nos países ditos de “primeiro mundo”, o cinema blockbuster e as suas franquias, sempre são uma espécie de válvula de escape da realidade.

O sempre polêmico Lars Von Trier chegou ao cúmulo no Festival de Cannes desse ano ao ser expulso pelos seus comentários a favor do nazismo – ainda que em tom, aparentemente, de brincadeira. Foi durante a entrevista coletiva que aconteceu após a exibição do seu filme Melancolia, concorrente a Palma de ouro, que Von Trier provocou constrangimento ao afirmar que compreendia e que sentia “um pouco” de compaixão pela figura de Adolf Hitler, ao ser indagado por um jornalista sobre as suas raízes alemãs. “Eu o compreendo. Acho que ele fez algumas coisas erradas, sim, com certeza, mas eu consigo vê-lo sentado em seu bunker no final”, foi um dos comentários do diretor. Não demorou para o conselho do festival entrar em ação e expulsar o cineasta dinamarquês do Festival. Em nota, anunciaram: “O conselho dirigente condena esses comentários e declara Lars von Trier como uma pessoa não bem-vinda no Festival de Cannes com efeito imediato.”

oiiA Serbian Film – Terror sem Limites tem gerado uma discussão intensa sobre a censura em todo o Brasil. Não se trata de uma produção qualquer. O filme conta a história de um ex-ator pornô que sai da aposentadoria para um último trabalho, bem remunerado, com a promessa de transformar pornografia em arte. Mas, nas mãos de um diretor enlouquecido, a tarefa vira um show de horrores – tortura e violência dão o tom, mas a gota d’água para muitos é o estupro de um recém-nascido. O diretor sérvio, Srdjan Spasojevic, pretendia traçar um panorama da Sérvia, a partir de alegorias e metáforas que ajudam a entender todos os problemas que seu país atravessou. No Brasil, o filme foi exibido em alguns festivais, mas foi logo proibido de estrear nos cinemas. Uma ação cautelar do Ministério Público Federal (MPF) em Belo Horizonte gerou uma liminar proibindo a exibição do longa em todo o Brasil. O texto faz referência à decisão do Ministério de Justiça de apontar A Serbian Film como “não recomendado para menores de 18 anos, por conter sexo, pedofilia, violência e crueldade”.

A nível regional, durante o Festival de Gramado desse ano, a Secretaria de Estado da Cultura anunciou o Edital de Finalização para Longas-Metragens. A iniciativa vem suprir uma demanda antiga das entidades do audiovisual gaúcho, já que mais de dez filmes estão há muito tempo em fase de finalização – faltando pouco para chegarem às telas dos cinemas. Depois do governo Yeda, temeroso na área da cultura, os investimentos no setor estão chegando. O edital tem um valor total de R$ 1,5 milhão, sendo que cada projeto poderá solicitar no máximo R$ 150 mil para finalização. Entre as contrapartidas solicitadas pelo governo do Estado, o filme deverá ser inscrito em festivais brasileiros e também em competições internacionais de pelo menos cinco países diferentes, além de estar disponível em cópias DVD com legendas em inglês e espanhol.

Ettore Scola, autor, entre outros, de clássicos como Um Dia Muito Especial, Feios, Sujos e Malvados e O Baile, decidiu pôr um ponto final na carreira cinematográfica. O anúncio foi feito em uma entrevista divulgada na edição do dia 29 de agosto do jornal italiano Il Tempo. “Estava prestes a rodar um filme com Gérard Depardieu. Tudo estava preparado, mas não me senti capaz de fazê-lo. Foi uma decisão natural”, afirmou o cineasta de 80 anos, que disse não querer tornar-se “uma dessas velhas senhoras que saem de salto alto e batom nos lábios para ficar junto aos jovens”.”Não consigo mais viver o mundo do cinema como antigamente, com alegria e leveza. Há certas lógicas da produção e da distribuição que não têm mais a ver comigo”, explicou. “Para mim, é fundamental ter liberdade de escolher. Começava a me sentir obrigado a respeitar regras que não me faziam mais sentir livre”, acrescentou.

hO cinema está se expandindo para além da exibição de filmes. Muitas bandas começam a investir pesado na área, impulsionado pela tecnologia 3D. É o caso do Foo Fighters que lançou um show da nova turnê “Back and Forth” no formato. As sessões aconteceram em cinemas também de Porto Alegre e tiveram lotação esgotada. O Red Hot Chili Peppers foi mais longe: fez um show “mundial” na Alemanha que foi transmitido simultaneamente para 900 salas de cinema no mundo todo, inclusive nas do Brasil.  O futebol também entrou nessa, é claro, a última final da Liga dos Campeões foi transmitida nos cinemas 3D de nove cidades do País com grande sucesso. Será que a mania vai pegar? Se depender das bandas, a resposta já está dada.

hNem Geoge Clooney, David Cronemberg ou o badalado Roman Polanski. Quem ganhou o Leão de Ouro do júri, comandado por Darren Aronofsky, no Festival de Veneza foi o filme Faust, do russo Aleksander Sukorov. Ao contrário do que vinha acontecendo nos outros anos, Veneza dessa vez privilegiou uma obra que provavelmente vai a durar na  memória dos cinéfilos (alguém entendeu a escolha de Somewhere da Sofia Coppola ano passado?). Apesar da maioria dos filmes dessa edição do Festival de Veneza serem em língua inglesa e muitos futuros concorrentes ao próximo Oscar, um filme russo sobre a clássica história alemã mostrou que o cinema ainda pode ser autoral e sensível. E não é esse o papel que deve ter um Festival de Cinema como o de Veneza?

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Jornalista, Especialista em Jornalismo Digital pela Pucrs, Mestre em Comunicação na Ufrgs e Editor-Fundador do Nonada - Jornalismo Travessia. Acredita nas palavras.

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