Recortes| TV – Sobre seriados e o fim de 30 Rock

30 Rock: seriado durou sete anos e foi um dos mais aclamados de sua época (Crédito: NBC/Divulgação)

No dia 31 de janeiro terminou  uma das principais séries de humor dos Estados Unidos dos últimos anos e que, na verdade, nunca fez sucesso de público, mas, quase sempre, foi uma unanimidade em relação à crítica. 30 Rock estreou por lá em 2006, na NBC, uma rede tradicionalmente forte em sitcoms de comédia. Só para citar Seinfeld é de lá, Cheers, The Office, Frasier, Friends,Community, etc. Mas antes de me focar em 30 Rock, gostaria de tentar explicar porque acho válido escrever sobre seriados produzidos nos Estados Unidos ou de qualquer outra nacionalidade.

Acho que o primeiro grande ponto positivo de assistir um bom seriado é o fato de poder crescer acompanhando um bocado de personagens e a oportunidade quase única de vê-los mudando (ou não). Mais do que isso, a relação que se cria com aquela história é muito diferente da relação de acompanhar um filme (ou até uma série de filmes, vamos dizer), embora tenha suas semelhanças. Um bom seriado é quase uma resposta ao mundo fragmentado, a um mundo que nos explora diariamente, tirando quase todo o nosso tempo. Aqueles vinte e poucos minutos em que acompanhamos um episódio de uma trama maior (ou não) certamente trazem um novo fôlego para a pessoa que está assistindo – por serem normalmente curtos, também são mais fáceis, ou prazerosos, de serem “consumidos”. E por fácil não quero dizer que sejam necessariamente burros/bobos. Há muito deles realmente ruins e acéfalos, mas há também muitos seriados ótimos que conseguem produzir histórias e situações realmente incríveis nesses mesmos 20 e poucos minutos.  Outra boa razão para assistir a sitcoms é a enorme variedade de temas que eles podem explorar. Há para todos os gostos, embora muito deles careçam de qualidade. Daí, então, o prazer em selecionar, explorar, encontrar o seu gênero favorito. Diferente de uma novela em que os capítulos são diários e, muitas vezes, pode ficar enfadonho, em um seriado normalmente a exibição é semanal, o que dá mais tempo de digerir, mais ansiedade na espera, logo, mais expectativa. Há outros motivos e que merecem uma coluna por si só, mas não é o momento. Agora é hora de falar de 30 Rock.

Relação entre Liz Lemon e Jack Donaghy é ponto alto do seriado (Crédito: NBC/Divulgação)

E falar de 30 Rock é falar de Tina Fey, talentosa comediante/atriz/ escritora que protagoniza a série, além de escrevê-la também.  Fey foi chefe dos escritores do tradicionalíssimo Saturday Night Live (berço de vários comediantes famosos), além de atuar nas sketchs, antes de começar 30 Rock. Unindo essas duas funções ela deu vida a Liz Lemon ao longo das sete temporadas, a produtora e escritora do programa fictício TGS (The Girlie Show with Tracy Jordan). Enfim, uma comediante com uma atitude digna das mulheres modernas mais à esquerda politicamente e com os velhos problemas amorosos. Mas Liz Lemon não seria nada sem Jack Donaghy, executivo da NBC , responsável por infernizar boa parte de sua vida, apesar da grande amizade. É o papel que ressuscitou a carreira do ator Alec Baldwin. Mas, ok, 30 Rock é maior que os dois personagens principais, justamente porque encontrou o seu lugar em um momento em que uma das séries definidoras da década, Arrested Development, foi brutamente cancelada e  ao mesmo tempo em que chegava aos Estados Unidos a versão de The Office, série aclamada por sua excelência e que foi revelada por Gervais no Reino Unido. Isto é, chegava a época dos Mockumentary (falso documentário) na TV, do humor em que se ri com vergonha do personagem – formato que domina até hoje.  O falso documentário facilita muito isso e também se insere na contemporaneidade televisa por assemelhar-se aos reality shows.  Um documentário é para ser o mais real possível, mas ele se tornou um sitcom.  Não é uma boa sacada?

Enfim, tudo isso para lembrar que 30 Rock não entrou na onda do mockumentary, além disso, não tinha narração em off para facilitar a identificação com o público (Oi, Scrubs). Ao contrário, seu formato é muito tradicional. O que o difere das outras comédias de sua época é sua altíssima qualidade em produzir os roteiros e algumas das situações mais absurdas que já se viu em sitcoms. E tudo isso fazendo muito sentido, tudo isso se encaixando na sua história. Mais: não vemos os personagens mudar, amadurecerem, etc. Não se trata de um seriado moralista e 30 Rock também não é crítico. Pode-se falar que se trata de um seriado autocrítico com muito humor a toda hora. Tem tiradas com todo mundo, com quem faz TV,  quem produz, a própria grade de programação do canal NBC – uma excelente sacada.  E 30 Rock só conseguiria isso com um ótimo grupo de personagens, além dos protagonistas, os coadjuvantes Tracy Jordan, o ator realmente insano que se junta ao elenco do TGS no primeiro episódio do seriado e faz da vida de Liz uma verdadeira bagunça;  Jenna Maroney , atriz do TGS que se vê ameaçada com a chegada de Tracy, é a amiga mais antiga de Liz e um poço de insegurança; Kenneth Parcell, o guia do prédio da NBC (chamado de 30 Rock, por isso o título do seriado), que parece ser o mais normal de todos, mas, na verdade, sua ingenuidade esconde uma mente bem doentia ao seu próprio modo.  Todos essas verdadeiras figuras definidoras fazem de 30 Rock uma série para ser lembrada, sendo indicada para 97 Emmys, e levando um punhado deles. Provavelmente foi em 2009, na quinta temporada, que  a série começou a perder força e, ao final dela, Baldwin até chegou a pensar em deixar a produção por considerar que já não era tão criativa. Porém, 30 Rock teve um excelente sexto ano e ganhou o direito a se despedir de seu público com uma sétima “minitemporada” de 13 episódios. O suficiente. Caso se estendesse por mais tempo correria o risco de virar piada sem graça.

A televisão estadunidense perde muito da sua esperteza, das ótimas tiradas e das situações cômicas mais bizarras e incrivelmente bem escritas dos últimos anos. Desde já, estou ansioso pelo próximo projeto de Liz Lemon, ops, Tina Fey. 

Nota: Essa coluna foi escrita no dia em que o último episódio foi ao ar lá nos Estados Unidos. Em breve, atualizarei a coluna com a resenha do último episódio. 

 

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Jornalista, Especialista em Jornalismo Digital pela Pucrs, Mestre em Comunicação na Ufrgs e Editor-Fundador do Nonada - Jornalismo Travessia. Acredita nas palavras.
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One thought on “Recortes| TV – Sobre seriados e o fim de 30 Rock

  1. Comecei a ver a serie nas reprises da Sony quando ja estava na sua quarta temporada e acabei gostando. E realmente gratificante quando vc acompanha alguma coisa e pelo menos tem um final descente. As ultimas experiencias com series que vi completas foram Smallville que poderia ter acabado na 6 tempora perfeitamente e Lost que foram 6 anos perdidos pra não dar em nada. 30 Rock me tirou esse gosto amargo da boca quando se fala de series. Me diverti muito e ri bastante com a turma desse programa. Espero que GOT, TWD, TBBT que são series que acampanha atualmente tem um fim programado também. 30 Rock Tem um lugar no meu coração, Jack o Boss que toda empressa deveria ter e Keneth o empregado perfeito!

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