Lei Aldir Blanc: coletivos e comunidades tradicionais poderão receber recursos

Thaís Seganfredo

Foto: Espetáculo “O Feminino Sagrado”, do Afrosul Odomodê em parceria com o Coletivo Montingente (Douglas Freitas/Nonada)

Aprovada pelo Senado em junho, a Lei Aldir Blanc, que destinará ao setor cultural R$ 3 milhões oriundos do Fundo Nacional de Cultura, já está sendo regulamentada. Caberá às secretarias estaduais de cultura a realização dos cadastros dos artistas aptos a receberem o auxílio emergencial. Já os grupos, empresas e espaços de cultura que serão beneficiados já começaram a ser cadastrados por alguns municípios, como Porto Alegre, que lançou um formulário online (acesse aqui) para recolher as informações.

O Ministério do Turismo trabalha agora na construção do decreto que determinará o cronograma de repasse desses recursos aos estados e municípios, que deverá ser realizado em etapas por meio da plataforma Mais Brasil, ainda sem prazo definido. Uma das conquistas da classe artística foi a não necessidade de que espaços e coletivos possuam CNPJ para receber os recursos, que devem variar entre R$ 3 mil e R$ 10 mil reais, dependendo do faturamento e do porte de cada iniciativa. O chamado inciso II da lei garante ajuda financeira, em troca de eventos gratuitos para escolas públicas, a uma ampla gama de iniciativas coletivas fazedoras de cultura.

Desta forma, circos, blocos de carnaval, coletivos de artistas, grupos de teatro, casas de artesanato de comunidades indígenas e quilombolas, festas populares, rodas de capoeira e outras manifestações populares com ou sem sede física deverão ser contempladas junto a empresas como livrarias e editoras. Um exemplo é o espaço cultural Fora da Asa, coletivo autônomo de Porto Alegre que se mantém através da realização de oficinas, cursos e outras atividades culturais, como sessões de cinema. “No começo, nós tivemos todas as atividades presenciais canceladas. Em quatro meses, precisamos garantir a manutenção do espaço e encontrar alternativas pras apoiadores que desenvolviam sua atividade lá, atividades que eram parte até mesmo integral da renda delas”, conta Camila Alexandrini, do Fora da Asa.

Apesar do otimismo com a expectativa dos recursos, ela destaca que tem encontrado muitas dificuldades para solucionar dúvidas. “Nós temos pouco conhecimento sobre essas iniciativas de fomento à cultura, porque sempre nos entendemos como um espaço autônomo”, diz, relatando que, apesar das várias lives promovidas pelas secretarias, ela não teve suas dúvidas solucionadas quando entrou em contato com os órgãos oficiais por email.

A articulação para a regulamentação tem sido realizada nos últimos meses em conjunto pelo ministério do Turismo, o Fórum de Secretários e dirigentes estaduais de cultura, o Fórum de Secretários de Cultura das capitais e municípios associados, a Associação Brasileira de Municípios (ABM) e o Fórum Nacional de Conselhos Estaduais de Cultura (CONECTA) têm apresentando propostas de aplicação da lei ao governo federal.

Classe artística em estado de Conferência Popular

Foto: Desirée Ferreira

Em paralelo à articulação institucional, artistas, ativistas, gestores culturais e integrantes de secretarias estaduais e municipais de cultura têm realizado conferências online para debater aspectos da lei, desde a regulamentação até o controle dos recursos. Na última semana, foi lançada de forma autônoma a Conferência Popular de Cultura, uma iniciativa muito comemorada pela classe artística, já que desde 2013 o governo Federal não realiza uma Conferência Nacional. Os encontros são transmitidos pelo canal do Youtube Emergência Cultural, criado na época da construção do projeto de lei.

“Esse momento representa o ápice do toda essa mobilização que iniciou com a mobilização para a lei. Nosso planejamento terá estratégias para a aplicação da lei e também para depois. O importante é que nós possamos continuar esse momento de fortalecimento da sociedade civil”, disse Elaine Dutra, do Fórum Nacional de Conselhos Estaduais de Cultura, no lançamento da conferência. Otimista, a relatora do projeto de lei na Câmara, Jandira Feghali, destacou: “Quem duvidava da mobilização da Lei Aldir Blanc está vendo que esse processo está tendo frutos estruturantes para a cultura. ”

Ativistas e articuladores também têm manifestado a importância de os municípios e estados realizarem um busca ativa de possíveis beneficiários, uma vez que muitos profissionais de cultura não têm conhecimento da lei, sobretudo em locais mais afastados dos centros, como é o caso das comunidades tradicionais. Outra preocupação dos artistas é em relação ao controle dessa verba. Um dos projetos em execução é a construção de um observatório online para monitorar a destinação da verba em todos os estados e municípios.

Pela lei, cada município que se inscrever na plataforma terá direito a repassar um montante desses recursos (saiba mais sobre os valores aqui). Além disso, tanto secretarias municipais quanto estaduais deverão destinar ao menos 20% desses valores para a realização de editais emergenciais.

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Nortista vivendo no sul. Escreve preferencialmente sobre políticas culturais, culturas populares, memória e patrimônio.
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