Dinarci Borges/FiliGram

Leo Neto: “Publicar autores no mercado internacional deveria ser política de Estado”

O mundo está interessado na literatura brasileira, mas faltam investimentos que supram essa demanda. A avaliação é de Leonardo Neto, jornalista, pesquisador e ex-editor-chefe do PublishNews, principal portal sobre o mercado editorial brasileiro. O jornalista falou sobre o cenário da cadeia produtiva do livro no início de setembro, no Festival Internacional Literário de Gramado (FiliGram).

Com mediação do jornalista Vitor Diel, editor do portal Literatura RS, a mesa abordou questões como diversidade na literatura, falta de investimento no setor e marcos importantes na história do livro no Brasil. O Brasil foi o principal homenageado na Feira de Frankfurt de 2013, a principal feira de negócios do livro do mundo. “Na mesma época, o Brasil também estava em destaque na feira do livro de Paris e de Bolonha”, contou Neto. A partir do ano seguinte, no entanto, o Brasil deixou de investir em eventos literários internacionais, lamenta o autor.

“Muitas vezes, publicar internacionalmente faz bem pro ego do autor, mas para o bolso dele, do editor e dos profissionais brasileiros, não faz muita diferença. Em termos de negócio, não faz sentido. Levar o país para fora deveria ser uma política de Estado”, sugere.

O jornalista está lançando o livro “100 nomes da edição brasileira”, obra que conta a história da indústria editorial brasileira por meio de seus editores. “Infelizmente – e é um retrato da nossa indústria -, busquei um número maior de mulheres para estar no livro, mas o número de homens era muito maior”, lamenta. A pesquisa foi realizada por meio de entrevistas com os editores e em jornais de época, através da Hemeroteca da Biblioteca Nacional.

Falando em história, Neto destacou que o fundador da nossa indústria editorial foi Paula Brito, um homem negro, cujo trabalho ganhou continuidade depois com sua esposa. “Temos, na fundação da nossa indústria, um homem preto e uma mulher. Isso para mim é muito representativo, porque começamos a ter mais editores pretos agora”.

O jornalista lembrou que em 2016, quando a PublishNews buscou autores editores negros para montar uma mesa na Festa Literária de Paraty, tiveram dificuldade em encontrá-los. Desde então, o cenário parece mais favorável, com o surgimento de novas editoras fundadas por editores negros, como a Malê e a Figura de Linguagem. “A indústria está mais diversa, apesar de ainda ser muito branca”, avalia.

A formação de leitores e o investimento público na área também foram questões abordadas na mesa. Segundo Neto, “a indústria editorial brasileira tem saltos na mesma medida em que há saltos na educação.” Mas o nicho da literatura infanto-juvenil ainda enfrenta alguns obstáculos. Depois de um momento forte nos anos 1980, década marcada por autoras como Ana Maria Machado e Ruth Rocha e editoras como a Salamandra, houve outro boom no início dos anos 2000, com o Programa Nacional Biblioteca na Escola. “Quando esse programa foi suspenso, essas editoras não tinham mais porque existir, já que o governo era o único cliente que elas tinham”, conta.

Outro algoz do mercado é a Amazon, ele avalia. “Eles começaram a pedir descontos imorais nos Estados Unidos”, o que fez com que editoras como a Harper Collins entrassem em disputa com a Amazon em 2014. No Brasil, a multinacional promove o mesmo movimento, pressionando as editoras a cederem à concorrência desleal que prejudica grandes e pequenas livrarias. “Será que daqui a três anos ainda vamos ter livrarias no Brasil?”, questiona.

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Nortista vivendo no sul. Escreve preferencialmente sobre políticas culturais, culturas populares, memória e patrimônio.
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