O artista por trás da lista de ausência

Yasmin Borges*

Conhecido como “lista de ausência”, Gabriel Pozzan é um cantor, compositor, produtor musical e (quase) engenheiro eletricista de 23 anos que mora na cidade de Porto Alegre. Ele iniciou sua carreira musical em 2020, quando lançou o primeiro álbum “conversa de um só”. Desde então, Gabriel já lançou mais um álbum intitulado “hiraeth” (2021), além de seu single mais recente que saiu nas plataformas digitais no mês de junho, chamado “sobre as noites que ficamos acordados até mais tarde”. 

O início de sua carreira musical se deu na França, para onde Gabriel foi após ganhar uma bolsa de estudos da CAPES. Lá, ele fazia estágio e com o dinheiro que ganhava conseguiu comprar seus instrumentos musicais. A partir disso, o artista vem fazendo lançamentos todo ano, desde singles até álbuns. 

Conversamos com o artista sobre a realidade de um músico independente nos dias de hoje. Gabriel contou sobre sua vida na música, suas inspirações e as principais dificuldades quando se trata de gerir um projeto sozinho.

Porque lista de ausência?

Gabriel – O nome é lista de ausência porque, quando eu estudava na França, os franceses tinham o costume de chamar o que a gente chama de lista de presença de “liste d’absences”. Traduzindo literalmente significa “lista de ausência”. Achei que em português isso não fazia muito sentido porque não temos o costume de usar esse termo, mas, ao mesmo tempo, uma tradução literal disso soaria legal para um projeto. É meio que uma brincadeira, porque teve alguns momentos que acabei faltando bastante aula lá (risos). E o motivo de ser tudo em letras minúsculas é porque gosto dessa estética.

Quando lançou seu primeiro álbum você entrou para uma playlist do Spotify. Conta mais como foi isso.

Gabriel – A playlist do Spotify é um momento de muita alegria. Mas, depois de alguns meses, ela se torna um momento de muita tristeza (risos) para quem é um músico independente que tem que lidar com tudo isso sozinho. Quando tu vê uma música tua entrar no Spotify é uma realização por perceber que o teu trabalho atingiu um nível profissional e que vai atrair ouvintes, mas acaba sendo algo muito passageiro. Fiquei na playlist por três meses, chegou a bater quase 3 mil ouvintes por mês na música. 

Quando tu vê isso pensa que tem muita gente escutando a música mas, quando ela sai da playlist, são poucas pessoas que continuam ouvindo teu trabalho de verdade. Para dar um exemplo em números que eu consigo ver pelo spotify, daquelas 7 mil pessoas que ouviram a música quando estava na playlist durante três meses, só umas 200 ficaram. Eu vejo pelas redes sociais que somente 200 pessoas ouviram minha música e começaram a acompanhar meu trabalho a partir daquilo. E isso acontece com muitos artistas também. No momento que tua música sai da playlist é uma queda abrupta. E se tem lançamento de músicas com uma certa frequência, tu sempre está no radar, então o ideal é lançar pelo menos a cada dois meses.

Quando você começou na música?

Gabriel – Eu comecei desde muito cedo. Escrevi minhas primeiras músicas quando ganhei minha primeira guitarra. Foi na época do ensino médio, eu tinha uns 14 ou 15 anos. Mas quase 100% das músicas dessa época acabei não lançando porque eu só tinha a guitarra e não sabia como gravar, como produzir. Não tinha interface de áudio, não tinha microfone, não tinha baixo e não fazia ideia de como escrevia bateria para as músicas.

Comecei de verdade quando lancei meu projeto, mas isso foi uns seis anos depois que ganhei minha guitarra. Eu já estava na faculdade na França, quando lancei as minhas músicas. Então, dá para se dizer que foi no final de 2019. O meu primeiro álbum foi gravado em um período de quatro a cinco meses, entre o final de 2019 e início de 2020. Comecei a gravar as coisas e vi que tinha um projeto que tinha nascido dessas gravações. Iniciei mais por hobbie e estava gostando de ter um primeiro contato com a produção musical.

Qual foi a porta de entrada para esse meio?

Gabriel – A porta de entrada acho que foi algo que fui alimentando com o tempo. Sempre gostei muito de música, desde o ensino médio, sempre gostei de ouvir música e repetir o que ouvia. Naquela época eu tocava bastante Nirvana, Led Zeppelin, era o clássico roqueiro do ensino médio (risos). Mas sinto que com o tempo fui tendo uma outra visão de música e comecei a escutar todos os gêneros.

Eu tento ouvir de forma mais técnica, consigo dividir a música em elementos, coisas que fui exercitando com o tempo. Acabei criando uma forma de me expressar musicalmente. Acho que foi essa evolução de uma pessoa que gostava de ouvir e tocar música para uma pessoa que aprendeu a produzir e começou a entender como se faz.

Qual é a maior dificuldade quando se trata de ser um músico independente?

Gabriel – É principalmente lidar com as coisas que vão além da música. Por exemplo, para mim é muito confortável gravar uma música, compor, se eu me propor. Mas as outras coisas – como concepção de uma identidade visual para outro lançamento, criação de conteúdo em redes sociais, produção de vídeos para youtube, a parte de assessoria de imprensa quando precisa criar um release para o lançamento, que é utilizado para mandar para os portais de músicas, todas essas coisas que englobam a música – eu tenho muita dificuldade de fazer. É algo que toma muito o meu tempo e acabo adiando muitos lançamentos. Falta conhecimento meu nessa parte.

Como consegue conciliar o teu projeto musical com outras atividades? 

Gabriel – Olha, isso é uma coisa que eu diria que não consigo fazer 100%, porque depende muito de momento. Em algumas fases da minha vida tenho mais motivação para produzir e para compor do que outras. O meu primeiro álbum basicamente compus e gravei ele em paralelo com a faculdade. O segundo escrevi e gravei enquanto estava estagiando e trabalhando em um mercado na França, trabalhando mais de 50 horas por semana. 

Mas tem outros momentos como agora que estou trabalhando bem menos, mas falta aquela coisa que te leva a escrever e a gravar. Sempre tento conciliar, mas é muito mais pela minha motivação de querer estar fazendo aquilo do que pelo trabalho me atrapalhando. Não sinto que o trabalho dificulta, é muito mais uma questão pessoal de estar motivado e disposto a fazer as coisas.

Qual é sua maior inspiração?

Gabriel – Isso é uma coisa que variou muito com o tempo. Já tive um momento que escutei muito Nirvana e, conforme o tempo foi passando, fui vendo que existem coisas muito mais complexas e admiráveis na música, coisas que tu escuta e pensa: “nossa, isso é realmente muito diferente”. Por ter tido diferentes artistas que gostei por muito tempo, ultimamente o que mais tenho buscado como inspiração é tentar identificar um gênero que estou apreciando no momento e tentar trabalhar uma identidade sonora em cima disso. O primeiro álbum que lancei em 2020 era um indie meio psicodélico. Já o segundo álbum era um post punk meio new wave, que era as coisas que eu estava escutando na época. O terceiro álbum que está sendo gravado agora estou tentando usar mais guitarras e menos sintetizadores. A minha inspiração é algo muito transitório.

Para quando podemos esperar o próximo lançamento?

Gabriel – Eu lancei um single no mês de junho. A ideia era para ter sido o que iria introduzir um EP, que era para ter sido lançado já. E tenho algumas músicas prontas. O que me bloqueia mesmo é essa parte de criação de conteúdo e identidade visual. Por ter dificuldade de desenvolver esses outros fatores, ainda não tenho nenhuma data definida.

*Estudante de Jornalismo da Unisinos. Essa entrevista é uma parceria do Nonada com a Beta Redação, portal experimental do curso de Jornalismo da Unisinos, e foi realizada sob supervisão dos professores Débora Lapa Gadret e Felipe Boff.

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Editoria de cultura da Beta Redação - Agência de jornalismo experimental da Unisinos

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