Circo da Gente, em Ouro Preto (MG) (Foto: Cultura Viva/divulgação)

Saiba o que são os pontos de cultura, que devem ser retomados por Lula

Um dos programas mais reconhecidos pelos trabalhadores da cultura no governo anterior de Lula, os pontos de cultura devem ser retomados a partir de 2023. Ainda nos discursos da campanha, o presidente eleito sinalizou em vários momentos que o programa deve voltar, alavancando a descentralização de recursos da área. 

Os pontos de cultura são espaços de base comunitária criados por organizações sem fins lucrativos ou coletivos culturais em áreas urbanas e rurais. Os centros levam música, teatro, literatura, cultura popular e outras expressões até a ponta, marcando presença nas cidades e em comunidades quilombolas, rurais e indígenas. Entre 2004 e 2010, o governo reconheceu e certificou, oficialmente, 3500 espaços como Pontos de Cultura, distribuindo recursos para que os coletivos promovessem atividades culturais gratuitas à população.

Idealizador do programa junto à gestão de Gilberto Gil como ministro da Cultura, o historiador Célio Turino sonha em ver 5000 pontos de cultura no país a partir de 2023. Ex-secretário da Cidadania Cultural, ele lembra que o programa chegou a 1100 municípios antes de ser interrompido, beneficiando 9 milhões de pessoas, entre profissionais e espectadores. “Até o Papa Francisco a conheceu e é entusiasta, exatamente pelo que o Ponto de Cultura expressa enquanto estimulador da autonomia e protagonismo sociocultural das comunidades e no exercício da cultura do encontro”, conta.

Ponto de Cultura Arte em Movimento, no município de Pão de Açúcar, Alagoas (Foto: Cultura Viva/divulgação)

A medida foi regulamentada pela Lei Cultura Viva (Lei Nº 13.018/2014), mas os recursos foram minguando depois de 2010. “Desde 2011, houve uma interrupção, um equívoco de entendimento. No governo Temer, praticamente já não tinha mais repasse”, diz Célio. Ele conta que o orçamento disponível para a pasta chegou a ser de R$ 110 milhões em 2010, mas caiu para R$ 5 milhões em 2015. 

O programa abrangia diferentes manifestações culturais, desde oficinas de audiovisual, capoeira, artesanato, artes cênicas e outras linguagens até a criação de veículos de mídia livre, atividades de cultura digital, memória e patrimônio e cultura da infância. Atualmente, muitos pontos autodeclarados se mantêm com a ajuda de outros editais, como o da Lei Aldir Blanc, e de programas estaduais de alguns estados que adotaram a Lei Cultura Viva.

O Plano Nacional da Cultura, que estabeleceu metas e objetivos para a área, previa a criação de 15 mil Pontos de Cultura em funcionamento até 2020, mas foi prorrogado até 2024. O ex-secretário projeta que o retorno do Cultura Viva e o cumprimento da meta podem significar a inscrição de 6 milhões de jovens em oficinas e atividades culturais regulares, além de 200 mil postos de trabalho para os profissionais da cultura. 

Inspiração para políticas culturais na América Latina

Pontão da Diversidade Cultural Fios da Memória, em Anápolis, Goiás (Foto: Cultura Viva/divulgação)

Enquanto a ideia ia sendo abandonada no governo Federal, na última década vários países da América Latina, e em outros continentes, como a Indonésia, se interessaram pelo programa. “Hoje, a Cultura Viva está presente em 17 países. Na Argentina, são mais de mil pontos. Recentemente, estive no Chile a convite do governo, ajudando a implantar a rede”, conta Célio.

No Brasil, o ideal da descentralização dos recursos para reconhecer a autonomia dos coletivos e agentes culturais enquanto fazedores de cultura voltou durante a paralisação da pandemia, quando parlamentares e artistas se uniram para criar as leis Aldir Blanc e Paulo Gustavo

“Toda a concepção e a forma de mobilização da Lei Aldir Blanc se deu a partir da cultura viva”, diz Célio, destacando que os conceitos de diversidade e desburocratização, marcantes da LAB, estão no cerne do programa Cultura Viva. O auxílio emergencial durante a pandemia foi fundamental para que muitos pontos de cultura continuassem ativos, por isso, estados e municípios como o Rio Grande do Sul e Niterói (RJ) lançaram editais específicos para esses espaços nos últimos anos. 

O ponto de cultura Quilombo do Sopapo, em Porto Alegre, foi um dos contemplados.  “Com a pandemia, nos reinventamos e buscamos outros campos, como a fotografia. O trabalho em rede que temos construído nos deu a condição de termos parceiros para encarar o momento”, afirmou Leandro Anton, integrante do ponto de cultura, em matéria anterior. Já outros espaços, como o Varanda Cultural, também na capital gaúcha, ainda encontram dificuldades financeiras para a continuidade.

Para Célio Turino, “a LAB foi uma lei muito generosa, abarcou segmentos como a cultura alimentar e até a cultura gospel. O sucesso da lei só foi possível por essa concepção generosa e que é resultado da Cultura Viva”. Após tentativa de veto por parte de Jair Bolsonaro, a LAB e a lei Paulo Gustavo foram adiadas por uma Medida Provisória do governo, que deverá ser votada pelo Congresso em 2023.

Conheça outros pontos de cultura:

Projeto Missão Agape, no Rio de janeiro (RJ) (Foto: Cultura Viva/divulgação)
Centro Cultural Cambinda Estrela, Recife (PE) (Foto: Cultura Viva/divulgação)
Filarmônica 2 de Janeiro de Jacobina, em Jacobina (BA) (Foto: Cultura Viva/divulgação)
Atelie Castelo das Artes, em Cachoeira do Itapemirim (ES) (Foto: Cultura Viva/divulgação)
Casa Preta, em Belém (PA) (Foto: Cultura Viva/divulgação)
Ballet Paraisópolis, em São Paulo (Foto: divulgação)
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Nortista vivendo no sul. Escreve preferencialmente sobre políticas culturais, culturas populares, memória e patrimônio.
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