A ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, tomou posse nesta quarta-feira (11) no Palácio do Planalto. Ao lado da também empossada Anielle Franco, titular do Ministério da Igualdade Racial, a ministra fez um discurso histórico lembrando o protagonismo dos povos indígenas na luta contra as mudanças climáticas, a importância da educação indígena e da representatividade no Estado brasileiro. Confira alguns trechos do discurso:
“Arrisco dizer, sem exagero, que muitos povos indígenas vivem uma verdadeira crise humanitária em nosso País, e agora estou aqui para trabalharmos juntos, para acabar com a normalização deste estado inconstitucional que se agravou nestes últimos anos. Além disso, não posso deixar de lembrar os parentes que foram retirados de nosso convívio pela bala do fascismo que imperou no Brasil nos últimos quatro anos.”
“Nós não somos os únicos que necessitam aqui viver. Nós apenas coabitamos a mãe Terra junto com milhões de outras espécies. O desprezo por essas outras formas de vida, as práticas de desmatamento intenso feitas sempre em nome da economia de curto prazo, têm efeitos devastadores para o futuro de todos nós. As alterações no uso do solo provocam um grande desiquilibrio em nosso ecossistema, que impactam diversas espécies causando profundas transformações, inclusive, as grandes epidemias. Se, antes, as demarcações tinham enfoque sobretudo na preservação da nossa cultura, novos estudos vêm demonstrando que a manutenção dessas áreas tem uma importância ainda mais abrangente, sendo fundamentais para a estabilidade de ecossistemas em todo o planeta, assegurando qualidade de vida, inclusive nas grandes cidades. Daí a importancia de reconhecer os direitos originários dos Povos Indígenas sob as terras em que vivem.”
“Mais de 500 anos de ataques cruéis. Nós não iremos nos render. Estamos aqui hoje nesse ato de coragem, para mostrar que destruir essa estrutura do Palácio do Planalto não vai destruir a nossa democracia. Todas as mulheres do Brasil, para dizermos juntos que nunca mais vamos permitir um outro golpe no nosso País. A invisibilidade secular que impacta e impactou diretamente as políticas públicas do Estado é fruto do racismo, da desigualdade e de uma democracia de baixa representatividade, que provocou uma intensa invisibilidade institucional, política e social, nos colocando na triste paisagem das sub-representações e subnotificações sociais do País”.
“Não somos o que muitos líderes da história ainda costumam retratar. Se é verdade que muitos de nós resguardam modos de vida que estão no imaginário da população brasileira, por outro nós existimos de muitas e diferentes formas. Estamos nas cidades, nas aldeias, nas florestas, exercendo os mais diversos ofícios que você pode imaginar. Vivemos no mesmo tempo espaço que qualquer um de vocês, somos contemporâneos desse presente e vamos construir o Brasil do futuro, porque o futuro do planeta é ancestral”.
“O Brasil do futuro precisa dos povos indígenas. Tudo que tradicionalmente é chamado de cultura entre os brasileiros e brasileiras, para nós significa tudo que somos. É nosso modo de vida, nossa comida, nossos rituais, nosso uso da terra, nossas práticas e costumes, tanto aqueles mais cotidianos, quanto outros ritualizados. Cultura é também sinônimo de luta. Lembremos também o que estava sendo empurrado para o esquecimento: o Brasil é plural, é alegria, é colorido e solidário!”
“É preciso lembrar de problemas estruturais que, recentemente, foram imensamente potencializados e precisam ser encarados como prioridades. São graves os casos de intoxicações provocados por mercúrio dos garimpos, pelos agrotóxicos nas grandes lavouras do agronegócio; as invasões em nossos territórios; as condições degradantes de saúde e saneamento; o aumento da insegurança alimentar que resultou, inclusive, na morte de inúmeras crianças e idosos indígenas e a desproteção dos territórios onde vivem povos indígenas isolados. Lembrando que, na Amazônia brasileira, somam-se 114 grupos de povos de recente contato ou também os que nunca tiveram nenhum contato com a sociedade. Os chamados povos isolados, e que se encontram em estado de alta vulnerabilidade, devido ao desmatamento, garimpo ilegal e a grilagem de terras.”
“É urgente promovermos uma cidadania indígena efetiva. Isso não se faz sem demarcação de territórios, proteção e gestão ambiental e territorial, acesso à educação, acesso e permanência à universidade pública, gratuita e de qualidade, ampla cobertura e acesso à saúde integral. Saibam que este Ministério chega comprometido com tudo isso e com a promoção de uma política indígena em todo o território nacional com potencial de fazer frente às mazelas que tomaram nossos corpos, memórias e vidas.”