Foto: Fabiana Ribeiro/Nonada

Agentes culturais e líderes comunitários de Campinas contam suas próprias histórias

Em setembro de 2023, realizamos em Campinas a primeira edição do Comunica: Potencializando culturais locais. Trinta e um líderes comunitários, artistas e agentes das periferias da cidade participaram da trilha formativa e da criação de um curta documentário sobre Bene de Moraes, uma das lideranças culturais da cidade. E, é claro, eles também contribuíram com a formação dessa revista. 

A proposta desses textos que vocês lerão a seguir é a seguinte: os alunos se dividiram em dupla e se entrevistaram com foco em lembranças relativas às suas vivências culturais que tiveram impactos em suas trajetórias. Depois, foram convidados a escreverem as histórias dos colegas. Confira o resultado: 

Recorte no tempo

Ela estava sentada dentro do ônibus em sua  linha habitual, concentrada na leitura do livro O Boré, quando a terra fala. Enquanto avançava as páginas, foi ficando sonolenta e  a paisagem urbana com prédios, buzina e fumaça foi tomando outra forma.

Débora fechou os olhos e quando os abriu estava em meio a floresta, rodeada por um rio, árvores enormes, flores, bichos, pássaros. Movimentou os pés para se certificar que estava mesmo ali e sentiu a terra úmida entre os dedos.

Começou a caminhar com os olhos atentos, ainda se recusando a acreditar que estava ali. De repente encontrou um pajé, sentado num tronco, fumando um cachimbo e olhando para o rio. Ela se aproximou desconfiada, e ele disse para ela sentar-se ao seu lado. Assim ela o fez.

O pajé começou a falar de como aquele lugar era mágico, vivo, ancestral e que deveria ser preservado. Conforme ele ia falando, Débora ficava hipnotizada pelas palavras do sábio homem, sentindo a sua voz como se fosse o vento soprando. Ficaram ali por horas, ele falando e ela ouvindo quieta, atenta, sentindo toda a energia que aquele lugar emanava. 

Num determinado momento, ele se calou e ficaram ambos em silêncio olhando as águas do rio. Ela fechou os olhos, mantendo-os assim por um longo tempo. Quando abriu estava novamente dentro do ônibus. Confusa, não entendeu o que havia acontecido nem onde esteve. O ônibus estava chegando no ponto em que ia descer, então levantou-se, deu sinal e saiu.

Lá fora,  a correria dos transeuntes e de novo a paisagem urbana.

Nesse momento, Débora teve a certeza que havia atravessado um portal e que depois de estar naquele lugar, nunca mais seria a mesma pessoa.

Texto de Sandra Simião sobre Débora Cristina 

Sempre em movimento

Felipe da Silva, o Neno (Foto: Fabian Ribeiro/Nonada)

“Eu gosto de estar no movimento, eu gosto de trabalhar com esse bagulho”.

Quem passa por ele logo o identifica, lindo e criativo, é um legítimo espírito livre.

Natural de Campinas, com família vinda da cidade de Penápolis, que fica ao norte de São Paulo, Felipe, com 32 anos, reside e trabalha na região de Barão Geraldo como Bartender, profissão que ele mesmo diz exercer por gostar das movimentações e das relações que o público lhe proporciona.

Filho de mãe solo, preta e professora; ele por muito tempo não entendeu suas particularidades, nem o porquê dela precisar batalhar tanto, o que os privou de uma relação mais próxima. Entendimento que só se fez possível quando iniciado seu processo de letramento racial. Enquanto pessoa preta, experienciou as delícias e dificuldades da negritude na sociedade brasileira, iniciando assim um resgate na busca ancestral de uma relação muitas vezes negligenciada.

Cria do Campo Grande, região periférica da cidade, agora pai de pet e de planta, mora sozinho, e busca um olhar artístico e vivo sobre as nuances do seu espaço geográfico, não esquecendo de onde veio, almeja honrar a periferia com sua arte e cultura. Plural, trabalhou na polícia militar, concluiu todos os períodos da graduação em nutrição e vem descobrindo e explorando seu desejo pelo mundo das artes e da cultura de rua.

“Eu faço os meus corre, tudo que eu consigo fazer”

Artista preto, atualmente Neno (apelido que se tornou sua tag) declama poesias, sonha e estuda para uma nova graduação em ciências sociais e se especializa na cena do pixo e do grafite.

Nota do Entrevistador: Pessoalmente, me sinto honrado em poder contar essa história de transformação e ancestralidade, pelos olhos da negritude jovem campineira.

Escrito por Igor Amancio sobre Felipe da Silva

Espírito livre

Mariana Nunes, nascida em Campinas e residente no bairro Itajaí, na região do Campo Grande, traz em suas palavras preciosas lembranças de sua infância.

Durante seus primeiros anos, ela viveu na casa que sua tia gentilmente emprestou, já que a dela estava em construção. Mesmo em meio a desafios, ela recorda com carinho os momentos felizes de sua infância.

Fazendo menção do passado ao presente, ela relembra as novelas e músicas antigas que marcaram sua juventude. Ela canta os versos de Cartola, ‘Deixe-me ir, preciso andar. Vou por aí, a procurar. Rir pra não chorar…’.

Mariana compartilha que cresceu em uma comunidade acolhedora, mas com restrições para sair, devido às regras de seu pai. Suas amigas brincavam do lado de fora do portão, enquanto ela brincava do lado de dentro de sua casa.

Sendo uma criança brincalhona, Mariana desfrutou de sua infância até os 15 anos. Ela amava muito as idas ao supermercado, como o Extra e o Mappin, onde seu maior prazer era escolher roupas novas para sua Barbie.

Com 15 anos, Mariana conseguiu seu primeiro emprego em um quiosque, demonstrando seu espírito empreendedor. Já aos 17, perdeu o emprego no Carrefour devido às restrições de idade. Aos 23 anos, Mariana se casou e deu à luz seu primeiro filho, Natan. Ela se orgulha de criá-lo de maneira diferente, permitindo-lhe liberdade, ao contrário de sua própria experiência de infância.

Mariana faz uma visita a seu eu infantil, expressando a necessidade de seguir em frente, procurar seu caminho e rir para não chorar. Ela reflete sobre sua infância chorona, mas agora equilibra as lágrimas com risadas. Em meio às reviravoltas da vida, Mariana encontrou seu caminho e aprendeu a rir para não chorar, transformando desafios em crescimento e alegria.

Escrito por Marcelo Santos sobre Mariana Nunes 

Amor por livros

Comunica_Nonada_19set23_InstitutoRendenção_Cps_fotoFabianaRibeiro

Lucimara nasceu no Paraná e com apenas um mês de vida seus pais mudaram para Osasco na grande São Paulo. Foi em Osasco que iniciou sua experiência com as vias culturais, porém não sabia que todo aquele aprendizado era a cultura aflorando em si. Apenas em 2014 houve o despertar e, desde então, intensifica o trabalho na área na cidade de Campinas. 

Ela é produtora cultural, mas o trabalho que mais a deixa feliz é a biblioteca. O motivo é que teve contato com livros ainda pequena. Seus pais catavam reciclagem nas ruas de Osasco e ela os acompanhava. Nessas andanças pelas ruas da cidade, tinha dias que o carrinho de reciclagem ficava lotado de livros que as pessoas jogavam fora. Quando chegou na adolescência já tinha uma biblioteca em cima de sua cama. “A partir disso, os livros tiveram uma frequência na minha vida”. Impactou na minha vida de forma muito forte”, diz. 

Nos altos dos 40 anos, Lucimara volta para a reciclagem já na cidade de Campinas. Nesse trabalho, chega um pedido para que ela retirasse material para reciclar de um Espaço chamado Maloca Cultural. Quando chega na Maloca não era reciclagem e sim livros, com aproximadamente 2 mil livros para serem retirados. “Peguei esses livros, levei para minha casa e fiz uma biblioteca”. Começou a frequentar o espaço e não saiu mais. Então essa questão dos livros, da leitura, foi de extrema importância 

Sobre morar e trabalhar em Campinas, ela diz que não é fácil, mas não é impossível. Acredita que as mulheres na área da cultura ou em qualquer outra área enfrentam desafios. “É uma luta, é um enfrentamento e a gente precisa sempre estar se reinventando para conseguir enfrentar muito machismo, muitas questões como violência e abusos contra a mulher”. Tudo isso traz também o empoderamento e o entendimento de criar formas de lutar e de enfrentamento. 

Escrito por Cléo Dias sobre Lucimara dos Santos

Menina mulher

Nicolle Costa é uma mulher trans, jovem e hoje moradora do bairro Vila Olímpia – região Norte de Campinas, junto de sua família.

Por trás das lentes arredondadas de seus óculos dourados é possível perceber o olhar atento e expressivo de uma mulher que administra seu negócio e sua vida, manifesta sua fé e religiosidade e que também se permite ser vista como a menina que se interessa e se encanta com o mundo que vem descobrindo a cada novo encontro.

Nicolle chegou para a primeira aula do Comunica externando certa timidez, falando baixinho e sem dar muitos detalhes de si. Passado seu período de adaptação e já mais íntima e enturmada, passou-se a ouvir sua voz, sua opinião e até sua risada espontânea durante os encontros.

A menina, que é também mulher, é uma artista manual que materializa sua criatividade por meio do trabalho como nail designer. Nicolle demonstra  sua doçura e sensibilidade em ler o mundo ao seu redor através de uma observação meticulosa e sua forma cautelosa em se expressar. Fala sem reservas sobre a intensidade com a qual se relaciona com as pessoas, sobre a importância de suas amizades no seu processo de cuidado e apresenta suas grandes paixões: Fumaça e Kiara, cachorros da raça chow chow que tornam sua vida mais emocionante e colorida.

Nicolle é uma mulher imaginativa, divertida e com uma memória excelente. É capaz de lembrar com detalhes fatos e acontecimentos da sua história, como quando descreve a chegada dos cães em sua vida, na mesma data em que o Brasil foi desclassificado da copa na Rússia, em 2018. São tantos detalhes que enquanto se ouve Nicolle narrando é possível visualizar junto a ela a cena mencionada. Nessa mesma proporção de particularidades, ela consegue retratar como a convivência com Fumaça, Kiara e seus filhotes a transformou nessa pessoa sensível e capaz de compreender sentimentos e emoções – ainda que não sejam verbalizados, como no caso dos cães, mas que pode tranquilamente ser aplicado às pessoas de sua convivência.

Em contato com o novo universo que a formação tem lhe proporcionado, Nicolle verbaliza não querer mais se afastar das vivências de arte e cultura, e planeja no próximo semestre participar de um grupo de teatro em Campinas.

Escrito por Fran Romero sobre Nicolle Costa 

Maquiando a vida

Felipe Ferreira é multiartista, gosta de desenhar, pintar e maquiar. Reside em Campinas e tem 27 anos. Seu gosto sempre foi por maquiagens feitas em Drag Queen, que ao seu olhar são divertidas, alegres e extravagantes. Começou a maquiar, vendo muitos tutoriais de maquiagem no YouTube. Com pouco recurso, ele fazia maquiagem nele mesmo e gravava todo o procedimento, como se fosse um desafio. E foi assim a pandemia toda.

Até que teve a oportunidade de participar da produção de maquiagens, da Noite do Terror, no Playcenter, em São Paulo. Evento que acontece no dia do Halloween, onde os funcionários são maquiados para se transformarem em monstros ou personagens assustadores.

Ele relata que demorava muito para finalizar as maquiagens e por se esforçar, a equipe foi dando suporte. Com o tempo, estava conseguindo realizar entre 12 a 14 maquiagens por evento.Por ser muito crítico consigo mesmo, sempre se perguntava: “Será que sou capaz?” ou “será que vou conseguir entregar no tempo estipulado pela equipe?”

Diz que foi um choque de realidade, quando a equipe o aceitou pela força de vontade em aprender e inovar. E relata que com essa experiência, sentiu que estava em um corredor, batendo em várias portas e que uma porta se abriu e que conseguiu aproveitar o máximo possível. E que só tem a agradecer!

Texto de Marta Henriksen sobre Felipe Ferreira 

Encontrando afeto

Suzy (à esquerda) e Rose se entrevistam (Foto: Fabiana Ribeiro/Nonada)

Quando Suzy tinha 7 anos, em uma preparação para a festa da escola, foi montada uma peça teatral com alguns dos personagens de histórias infantis. Suzy logo se dispôs a ser a chapeuzinho vermelho, porém para compor o quadro do espetáculo ela recebeu o papel de Peter Pan. Assim iniciava-se a jornada de sua vida: a luta de uma linda mulher trans contra o preconceito. 

Tendo perdido a mãe para a morte, logo cedo foi adotada pelo tio, que segundo Suzy, era um bom homem, porém ausente de qualquer demonstração de afeto. Sem ter tido contato nem ao menos, em ouvir a pronúncia eu te amo. Quando enfim saiu de Manaus, foi tentar a vida em outra cidade, em Campinas, e lá descobriu o afeto.

E então, pela primeira vez, Suzy ouviu um “eu te amo”, e não sabia como se portar. Segundo ela, o misto de emoção a fez sair correndo e deixar o possível pretendente para trás. Foi embora com as mãos suando e a mente confusa.

Escrito por Rosiane Loureiro sobre Suzy Peres

Transformações e descobertas

Fran (à esquerda) e Nicolle se entrevistam (Foto: Fabiana Ribeiro/Nonada)

Fran, moradora da Vila Industrial, próxima à Estação Cultura em Campinas, conta sua história. Com delicadeza, ela revela sua origem em Pedreira, uma cidade vizinha que, apesar da proximidade geográfica, manifesta suas particularidades.

Aos 17 anos, contra sua vontade, Fran deixou Pedreira para se estabelecer em Campinas. “Eu tô aqui até agora, até os meus 32 anos, e acho que eu já ressignifiquei essa coisa de não querer morar em Campinas”, diz. Uma transição forçada que, ao longo do tempo, transformou-se em uma jornada de adaptação e gratidão.

Campinas conquistou um lugar especial no coração de Fran. No entanto, ela ressalta as diferenças entre as duas cidades. Pedreira, sendo uma comunidade menor, apresenta desafios distintos, especialmente no que diz respeito às relações familiares e preconceitos.

“Em Pedreira, todas as famílias se conhecem, aqui tem até algumas coisas que a gente enfrenta em Campinas, mas quando nasce no bairro e as famílias se conhecem… Em Pedreira é muito mais profundo”, explicou Fran. Os desafios e preconceitos são expostos de forma intensa, criando uma dinâmica única em uma cidade onde tudo se sabe.

Ela reflete sobre a dificuldade de escapar da popularidade involuntária em Pedreira. “Mesmo que você não queira, todo mundo fica sabendo. Aí acho que aqui em Campinas, por ser um pouco maior, acho que mudar de bairro resolve, sabe? Mas lá em Pedreira não resolve. E aí eu tive que sair de lá”.

Fran, com uma aura espiritual que abraça sua vida, compartilha uma narrativa sobre conexões e caminhos que se cruzam. Ela explora a crença de que as pessoas que conhecemos são parte essencial do nosso destino, um laço espiritual que vai para além do tempo.

A conversa se aprofunda quando o tema se volta para Capitães de Areia de Jorge Amado. Fran, apaixonada pela obra, mergulha na história de meninos em Salvador, cujas vidas são entrelaçadas com a criminalidade para sobreviver. Ela destaca a profundidade realista da obra, além das interpretações românticas comuns.

Ao compartilhar sua experiência com a peça inspirada no livro, Fran revela como essa vivência a impactou aos 12 anos, tornando-se um momento transformador em sua vida. Essa emoção a levou a permanecer no grupo de teatro, dedicando-se ao trabalho com crianças e adolescentes marginalizados, tornando-se a profissional e pessoa que ela é hoje. 

Ela observa como todas essas experiências se entrelaçaram e a moldaram, transformando-a na pessoa que estava destinada a ser. Ela recorda vividamente o momento em que a chave foi virada dentro dela, criando uma compreensão mais profunda da marginalidade e cultivando um espaço livre de julgamentos.

A jornada de Fran, entre o teatro e a realidade, persiste como uma história poderosa de descobertas, compreensão e acolhimento. Esta narrativa transmite não apenas como um relato individual, mas como uma reflexão profunda sobre a complexidade da vida e das relações humanas.

Texto de Nicolle Costa sobre Fran Romero

Cheia de graça

Aninha Sunshine (Foto: Fabiana Ribeiro/Nonada)

“Cheia de graça” é um dos significados do nome de Ana, uma mulher preta, mãe, artista e cheia de sonhos. Conversamos durante o intervalo de uma aula do Comunica, em meio a um olhar atento à sua pequena filha Eduarda, pois não havia tido tempo de deixá-la em casa. 

Ela se apresenta como Aninha Sunshine e conta que sempre se interessou pelas artes, desde pequena gostava de dançar, cantar e ver televisão. Quando criança, Aninha tinha muita vontade de ser paquita da Xuxa, embora percebesse que não existia muito espaço para pessoas pretas na televisão. “Agora, vejo um protagonismo maior nas novelas, filmes, comerciais e também no jornalismo”, diz.

Em sua família, Ana conta que foi a única que explorou o lado artístico, fazendo teatro e dança. Mas lembra de se divertir muito quando criança em rodas de samba. Ana tem três filhas, que a apoiam no interesse pela cultura. “Elas veem minhas apresentações e curtem muito! Não é fácil lidar com tudo mas não me imagino de outra maneira!”, conta. 

Hoje, Aninha não se vê em outra profissão. “No auge dos meus 40 anos, tenho sede de cultura, de aprender e cada vez mais me aprofundar nela. Também agora quero saber mais sobre produção cultural porque acredito que sonhar é possível e para isso é necessário  aprender!”, finaliza Aninha sempre com um brilho no olhar. 

Texto de Lara Rafaela sobre Ana Luiza de Souza

Raízes na luta e no samba

Igor Amancio é campineiro de 21 anos com raízes na luta e samba, cria do Campo Grande nas redondezas do Parque Itajaí 4 onde cresceu e se desenvolveu, sua quebrada, e lugar que ele carrega com muito orgulho, mesmo com todas as dificuldades que morar na periferia carrega.

Quando criança passou por inseguranças que o fizeram abrir os olhos para as questões que atravessavam o seu desenvolvimento. Correu, brincou e se divertiu, mas desde muito novo precisou escolher entre brincar e ser responsável para ajudar a sua mãe que trabalhava e chegava tarde e cansada. Processos que o fizeram amadurecer antes da hora.

Perto de sua casa, no Jd. Liliza, fica a ONG “Casa dos Anjos”, espaço que o acolhia no contraturno escolar, oferecendo atividades socioeducativas e um enriquecedor convívio com pessoas diversas e que compartilhavam histórias semelhantes. Essas “coincidências” chamaram sua atenção e, então, passou a olhar para a sociedade, seus costumes e as ferramentas que mantém esses costumes, criando um forte senso de coletividade e vontade de luta com e para aqueles que vêm da mesma situação.

Buscou na igreja redenção para “pecados” que não eram seus, encontrou a música, sua, até hoje, parceira de vida. Na escola pública participou do grêmio estudantil e a flor que brota ao entender-se oprimido, desabrochou. Defendeu ativamente pautas de interesse coletivo, sempre se posicionando ao lado des outres alunes. 

Trabalhou como atendente de pizzaria, repositor e caixa de uma rede de hortifruti. O atendimento ao público se fez presente em vários momentos de sua vida, mas ainda não era aquele ambiente que almejava. Atualmente, Igor trabalha no Instituto Anelo, ONG que atende a região do Campo Grande e leva música (aulas de canto, instrumentos variados, técnicas de som e etc) para crianças e adolescentes e como ele mesmo diz: “é o braço onde o Estado não chega.”

Homem negro, homossexual, periférico e ativista enfrentando o mundo de peito aberto, estuda, trabalha, batalha. Ama um dia quente, uma cervejinha gelada, cantar Alcione (é, você é um negrão de tirar o chapéu) e sobretudo busca por uma vida tranquila e de oportunidades plenas para si e para os seus.

Texto de Felipe da Silva sobre Igor Amancio

Paz para Bassoli

Marcelo e mariana conversam (Foto: Fabiana Ribeiro/Nonada)

Marcelo Santos Siqueira, também conhecido como Mah Stevan, líder comunitário e agente cultural, natural da cidade de Osasco, mas atualmente residindo em Campinas, no interior do estado de São Paulo. Sua dedicação e paixão pelo seu trabalho têm sido notáveis, unindo esforços para realizar sonhos dentro de sua comunidade.
Desde 2017, Marcelo desempenha um papel fundamental como diretor do projeto Bassoli Dos Nossos Sonhos, juntamente com outros três moradores de Campinas. Juntos, eles já conduziram mais de 20 sessões de rodas de conversa e uma série de atividades enriquecedoras. Essas atividades incluem aulas de violão, dança e teatro com foco na cultura afro-brasileira, aulas de zumba, debates sobre questões LGBTQIA+, saraus literários, eventos comemorativos e campanhas de auxílio alimentar.

Além disso, Mah Stevan também participou ativamente da área de comunicação, facilitação, captação de recursos e documentação do projeto “Paz para o Bassoli”. Em 10 de junho de 2022, o projeto realizou uma intervenção artística chamada “Paz para o Bassoli”. Essa ação envolveu agentes culturais e moradores, visando transmitir uma mensagem de paz à comunidade e desafiar estereótipos negativos associados à área. Também foi uma resposta à intervenção policial agressiva na comunidade, que causou indignação e repúdio.

O Centro Cultural Maloca Arte e Cultura, situado na comunidade da Rua Maria Pink Luiz, 100, Vila União, é um ponto vital para a comunidade, onde diversas atividades culturais e comunitárias ocorrem regularmente.
Marcelo atua na gestão da casa como social media, facilitador de exibição de cinema, debate lgbtqia+, rodas de conversas, saraus e também ajuda nos mutirões e cuidados com a horta comunitária.
está no coletivo desde 2017

Em 24 de Junho de 2023 , Marcelo participou da organização do “Café com Carolina”, um evento significativo para a Maloca. Esse encontro marcou uma nova fase na história da Maloca, um espaço onde a comunidade se reúne para compartilhar experiências, dores e vitórias, e promover atividades educacionais e culturais.

Texto sobre Marcelo Santos

Corpo-som, corpo-vida

Essas palavras são sobre o escutar do por vir, quando se deixam aberturas internas para sent(ir). Sandra conta sobre um trabalho em que fez a operação de som, ela trabalha com produção artísticas. Mas eu logo pensei aqui, será que o som havia quebrado alguma coisa do seu corpo-som ? Viagem lúdica à parte, voltemos à memória de Sandra, que estava começando a nos permitir acompanha-lá pelas entranhas de um pedaço do seu peito sentidor de muitas coisas, desta vez o sentido do peito rumou pra saudade, que ela a Sandra, escutava te habitar.

E isso vem de uma leitura que aconteceu no final do trabalho, com o cuidado do som. Ele (o trabalho) tratava de uma peça teatral sobre memória e um parto de uma atriz, que também era a diretora. E que se desenrolou na casa da avó da mulher-atriz. Quando Sandra rememora como foi esse caminho até a sua memória de

saudade ela ambienta nossos ouvidos, com relevo, sobre profundidade. Isso mesmo, ela se lembra de sua mãe que já fez a passagem por essa terra na matéria e agora existe de outros jeitos. No rememorar de Sandra ela conta com a voz e com o olhar, o olhar que transcorre o brilho de jabuticaba que habitam seus olhos e que contam que: há profunda saudade do útero vivo de sua mãe.

Toda essa cena de parto, na casa da avó da atriz, fez vir dela que operava o som, a

memória sobre aquela de quem foi gestada, aquela que esteve no tempo mais primeiro da vida, aquela que tinha o lugar mais quente e seguro, e carregava o lugar-útero de sua mãe. Sandra quando escutou a mulher ler sobre uma Ostra, lembrou de onde saiu. Lembrou do corpo-vida de quem te pariu.

Escrito por Débora Cristina sobre Sandra Simião

A criação de uma biblioteca

A entrevista com Cléo Dias pautou sua vivência com relação ao trabalho na área cultural no Espaço Cultural Maria Monteiro, que fica na Vila Padre Anchieta, Distrito de Nova Aparecida. Cléo explicou que havia uma antiga reivindicação para construção de uma biblioteca nesse Distrito e o pedido era que fosse construída na Praça Integração do bairro. A biblioteca mais acessível era no centro da cidade, próxima ao prédio da Prefeitura. A questão da leitura é muito importante e ali havia uma demanda para instalação de uma biblioteca. Isso só aconteceu com a reforma do “Maria Monteiro”. Então, foi criada ali a “Biblioteca Cora Coralina”.

Por ser formada em biblioteconomia, Cléo foi convidada a trabalhar na biblioteca e, depois de um ano, assumiu a gestão do Espaço Cultural como um todo. Ela conta que no processo de organização, de pesquisa e de conhecimento daquele público que já frequentava o espaço, foi-se criando uma relação para conhecer o seu gosto para leitura, da não leitura. A convivência também se deu com a vizinhança do entorno. A partir do conhecimento da população que havia uma biblioteca naquele Espaço, começaram a chegar muitas doações e assim foi criando o acervo da biblioteca. A biblioteca foi um ganho para o Espaço e comunidade. 

Os frequentadores são convidados a utilizarem e emprestarem livros. As pesquisas são feitas nos livros e computadores. Até para realização da festa julina se trabalha o folclore, as danças regionais, o tipo de comida típica de cada lugar. No ano de 2023 percebeu-se uma procura maior para as atividades no Espaço Cultural e também na biblioteca. Os pais estão preocupados em oferecer alternativas para seus filhos na leitura, nas atividades culturais. Aumentou o fluxo de usuários. Com isto há um crescente no resgate à leitura

Escrito por Lucimara dos Santos sobre Cléo Dias

O projeto Comunica: potencializando culturas locais, Pronac 230551, é realizado através da Lei Federal de Incentivo à Cultura (Lei 8.313/91) – Ministério da Cultura, Governo Federal, Brasil: União e Reconstrução, e conta com o patrocínio da empresa John Deere.

Compartilhe
Ler mais sobre
direitos humanos
Ler mais sobre
Direitos humanos Reportagem

Bibliotecários e educadores resistem à onda de desinformação e promovem acesso livre e consciente à leitura