A harmonia de Scott Pilgrim vs The World

Ramona Flowers e Scott Pilgrim discutem a sua tumultuosa relação (Crédito: Universal Pictures)

Seria Scott Pilgrim vs The World uma espécie de marco no cinema contemporâneo? É altamente perigoso, mas também necessários refletir sobre o filme como uma das primeiras vezes, se não a primeira, em que videogames, histórias em quadrinhos e cinema se deram realmente bem juntos. A graphic novel homônima em que o filme é inspirado facilita essa adaptação para as telonas, pois o autor canadense Bryan Lee O’Malley monta um panorama onde a história é ambientada em um mundo real – em Toronto, Canadá – e com uma história real mas com o virtual sempre presente, a partir de toques de surrealismo bebendo na fonte dos videogames e também dos mangas japoneses. O filme, assim como o quadrinho, também debocha da cena indie e dos hipsters que lotam essa mistureba que é cultura pop mundial.

As tirinhas originais do canadense Bryan Lee O'Malley

Depois dessa explicação básica sobre o filme e o quadrinho que o originou agora é necessário observar Scott Pilgrim vs The World como objeto fílmico, afinal, esse é um dos papéis da crítica, não? Formar pensamento em cima do que analisa. O maior trunfo do filme é conseguir criar uma linguagem a partir do corte e da montagem que lembra a quase violenta rapidez dos quadrinhos. A agilidade narrativa é o que não deixa  perder o seu fôlego e isso com certeza é uma herança das HQ’s modernas pois podemos observar esse fenômeno também no filme Kick-Ass, que também é uma adaptação de um comic. Você não verá longas planos sequências no filme, ou longas penetrações ao fundo de alguma paisagem. Não há tempo para isso. Até nas suas partes mais românticas, o filme abusa da brincadeira cinematográfica como quando como Scott fecha os olhos com as mãos e a tela fica preta, ou como antes de pronunciar o nome do local para que estava indo, a cena é cortada e aparece na tela o nome do local – como se ele não tivesse que pronunciar, pois o visual é tão importante quanto uma fala. São essas cenas justapostas influenciadas pela HQ que ajudam a fomentar essa originalidade narrativa do filme.

Scott Pilgrim também já virou game. Alguém duvidava que isso ia acontecer?

Apesar de todas essas modernidades a trama gira em torno da história clássica da garota dos sonhos – já observada várias vezes em filmes americanos, principalmente. Scott Pilgrim vs The World até tira um sarro disso, porque o protagonista realmente vê sua amada pela primeira vez em um sonho, só depois que a conhece pessoalmente. A grande sacada – e aqui também entra a importância dos videogames – é como essa história de amor moderna, indie e hipster é contada. Para ficar com sua amada Ramona Flowers (que, para variar, muda de cabelo a cada semana como qualquer moça metida a diferente atualmente) ele deve derrotar os seus sete ex-namorados do mal. Lutar não, derrotar, como ela o avisa. Esse enredo é típico de jogos clássicos de luta como Final Fight e Street of Rage onde a progressão de jogo se dá a partir de lutas. É a mesma coisa com o filme, só que com o amor como o prêmio final. Ramona e Scott só poderão ficar juntos depois que ele derrotar os sete ex- namorados.  É legal como o filme traça um parâmetro como essa luta com os ex-amores da moça também é uma luta de qualquer relacionamento, mas no nosso de caso meros humanos, uma luta interna. Esquecer um passado, esquecer alguns arrependimentos.

A trilha sonora do filme é um espetáculo à parte. Os próprios efeitos sonoros de jogos clássicos como Zelda dão dicas de que o filme é cheio de referências ao mundo dos games. É divertido para quem conhece esse mundo identificar os sons de jogos, de portáteis, barulhos de quando inicia algum jogo. Fora isso, o filme também tem excelentes músicas, afinal Scott é baixista de uma banda indie, a Sex Bomb-Omb então há momentos fortes de música – inclusive batalhas de bandas e de baixo. Quem também chama a atenção pelos comentários ácidos e a imensa cara de pau é o amigo gay e que divide a casa com ele, Wallace. É responsável pelas maiores cenas de humor do longa.

É uma pena que o filme tenha sido lançado apenas agora, seis meses depois do seu lançamento oficial, e apenas em uma sala de cinema aqui em Porto Alegre. Mas, vale muito a pena assistir Scott Pilgrim Vs The World em uma tela de cinema, um filme que deveria ser mais valorizado.

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Jornalista, Especialista em Jornalismo Digital pela Pucrs, Mestre em Comunicação na Ufrgs e Editor-Fundador do Nonada - Jornalismo Travessia. Acredita nas palavras.

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