Ozzy em Porto Alegre

Ozzy demonstrou todo o seu famoso carisma no seu primeiro show em Porto Alegre. (Crédito: Denis Azevedo)

Texto:

Paulo Finatto Jr. (paulofinattojr@hotmail.com)

 

Nem mesmo os gaúchos mais crentes esperavam um dia assistir Ozzy Osbourne em Porto Alegre. O cantor, que é apontado por muitos como o maior ícone do heavy metal, não se apresentava em território brasileiro desde 2008, quando excursionou para promover o disco “Black Rain” (2007). As condições físicas de Mr. Madman – determinantes para que a performance ao vivo se concentre nas edições anuais do festival norte-americano Ozzfest – não pareceram ser um empecilho para a sua maior tour sul-americana em quarenta anos de estrada. Os cerca de treze mil fãs que compareceram ao Gigantinho comprovaram isso.

A expectativa para a vinda de Ozzy ao Brasil era imensa, sobretudo para os fãs que não moram nas duas cidades mais importantes do país. Pela primeira vez, os shows do cantor não ocorreriam somente em São Paulo e em Rio de Janeiro, mas a visita ainda se estenderia ainda por Brasília e Belo Horizonte. Na bagagem, o bem-recebido “Scream” (2010) e a oportunidade de tocar para massas sedentas por seus maiores clássicos – incluindo os hits dourados do Black Sabbath – em cidades desconhecidas para quem se acostumou apenas às maiores metrópoles do continente. Os ingressos, que esgotaram com um dia de antecedência em Porto Alegre, motivaram inclusive os menos fanáticos. As grandes filas rodearam o Gigantinho desde o início da tarde e cerca de trinta pessoas dormiram uma noite antes em frente ao ginásio para ver o seu ídolo o mais de perto possível. Não houve nenhum transtorno nesse sentido. Nem mesmo o jogo entre Inter e Jorge Wilstermann – no estádio ao lado – causou prejuízos à organizadora H4 Hits e ao público headbanger.

Por volta das 20h os fãs de Mr. Madman já haviam tomado praticamente todos os espaços do Gigantinho. A banda de abertura – a novata Gunport – pouco fez para aquecer a plateia. O grupo, que une certa obscuridade ao seu hard rock com um quê de pop/rock, emendou seis músicas próprias sem nenhuma pausa, sequer para a apresentação do quarteto ou para agradecer o (fraco) apoio dos presentes. De certa forma, a Gunport até mostrou competência técnica, mas perdeu uma incrível oportunidade de mostrar – e marcar – o seu trabalho diante de um público imenso, o que, provavelmente, nunca se repetirá. Os caras deixaram o palco assim como subiram vinte e cinco minutos antes: despercebidos.

Com cerca de quarenta anos de carreira, Ozzy oscilou entre a fase Black Sabbath e a carreira solo no set list.

 A desmontagem do equipamento foi rápida e pontualmente às 21h Ozzy Osbourne entrou em cena. Embora não usufrua os mesmos efeitos pirotécnicos que Kiss e Green Day (e outros nomes que preparam entradas triunfais em seus shows utilizam), Mr. Madman optou por início mais intimista, como o de Paul McCartney. Em meio a gritos histéricos e muitos aplausos, Ozzy postou-se diante do microfone para as primeiras saudações. Com a banda já posicionada, o Gigantinho praticamente veio abaixo com “Bark at the Moon”, um dos clássicos mais expressivos da sua carreira pós-Black Sabbath. A ausência de Zakk Wylde (guitarra) – substituído magnificamente por Gus G. – não passou de um singelo detalhe para quem cantou e vibrou junto com o carismático cantor desde os primeiros minutos do espetáculo.

Por mais que muitos estivessem receosos com a qualidade do show, sobretudo em razão do estado de saúde debilitado de Ozzy – que sofre com o Mal de Parkinson desde 2005 –, o cantor inglês (que já ultrapassou a marca dos sessenta anos) conduziu o espetáculo com muita dignidade. Embora não possua a mesma mobilidade de dez ou quinze anos atrás, Mr. Madman não deixou de agitar um momento sequer. Os pedidos para que o público o acompanhasse eram constantes e a sua felicidade por estar mais uma vez atuando ao vivo era perceptível através dos closes mostrados nos dois telões montados ao lado do palco. Na sequência, a nova “Let Me Hear You Scream” mostrou como os gaúchos acolheram bem o mais recente disco do vocalista. No entanto, a unânime e clássica “Mr. Crowley” emocionou como nenhuma outra – de verdade – os fãs mais devotos de Ozzy Osbourne. A estrutura do Gigantinho literalmente tremeu na abertura de piano assinada por Adam Wakeman.

O desgaste físico de Ozzy era extremamente visível mesmo com apenas quinze minutos de show. Entretanto, isso em nada comprometeu a sequência da apresentação com “I Don’t Know” e “Fairies Wear Boots”, a primeira faixa retirada do repertório do Black Sabbath. O público cantou e agitou junto com Mr. Madman, que ainda incitou um “olê Ozzy” antes de “Suicide Solution”, em uma singela prova do seu bom humor. Entre pedidos de palmas e brincadeiras com a mangueira de água/espuma, Ozzy ainda declarou um “love you all” antes de executar“Road to Nowhere”, um dos casos ímpares do show (por ser uma das poucas baladas do repertório). No entanto, o hino “War Pigs” (do Black Sabbath) colocou o Gigantinho abaixo. Por mais que a fase comercial/MTV de Ozzy Osbourne possua uma grande apelo entre os mais jovens, os clássicos insuperáveis da sua ex-banda é que formatam os melhores momentos da sua apresentação. Não ficou nenhuma dúvida quanto a isso.

De certa forma, a ausência de uma estrutura por trás do espetáculo comprometeu razoavelmente a experiência para poucos (ou muitos) fãs. Por mais que Ozzy Osbourne se doe ao máximo e conte com o acompanhamento de uma banda excelente – que possui ainda Rob Nicholson (baixo) e Tommy Clufetos (bateria) – pelo menos um pano de fundo com a capa de “Scream” cairia bem à turnê. No entanto, a alegria do cantor compensou essa falha artística do espetáculo. Na sequência, “Shot in the Dark” e “Rat Salad” (outra do Black Sabbath) mantiveram o astral elevado da apresentação. A faixa instrumental da ex-banda de Mr. Madman contou ainda com solos de guitarra e de bateria que curiosamente empolgaram os presentes – e extremamente necessários – para um descanso de Ozzy. Na volta do astro, o hit “Iron Man” extasiou os que esperavam os clássicos assinados pelo Black Sabbath na década de setenta.

De certo modo, a reta final do show reservou as músicas mais aguardadas da noite. Na ausência de “No More Tears” – apontada por muitos na saída como a única falha do repertório da turnê – “I Don’t Want to Change World” mostrou que o cantor manteve viva a chama do metal mesmo na época em que o grunge dominava a programação da MTV. Com o apoio dos treze mil espectadores, Ozzy consolidou “Crazy Train” e a bonita balada “Mama I’m Coming Home” como duas de suas maiores composições, sobretudo pela forma como se transformam em suas performances ao vivo. Por fim – e nem poderia ser diferente – “Paranoid” encerrou o set de incrível e quase 1h40 de show. Não há dúvidas de que a plateia esteve na mão de Ozzy do início ao fim da apresentação Os fãs que trouxeram certo receio pela qualidade do espetáculo, certamente deixaram o ginásio satisfeitos e aliviados por não perderem o show que muito provavelmente não se repetirá na capital gaúcha nos próximos anos.

A Scream World Tour deu satisfatoriamente bem o seu primeiro passo no Brasil. Com todos os descontos necessários – e com o auxílio sonoro/visual de três grandes monitores – Ozzy esbanjou vontade e interesse inacreditável sobre o palco do Gigantinho. Do lado de fora, cerca de uma centena fãs acompanhavam o show na medida do possível e conforme o portão do ginásio era aberto para a saída de funcionários e a entrada de equipamento. A prova de como Mr. Madman ainda mexe com muita gente. Não é por acaso que as suas fotos com a bandeira do Grêmio viraram notícia no dia seguinte. No entanto (e infelizmente), a promessa de que voltará à cidade no que vem soou muito mais como uma gentileza do que propriamente como uma intenção do músico inglês.

Track-list:

01.  Bark at the Moon
02.  Let Me Hear You Scream
03.  Mr. Crowley
04.  I Don’t Know
05.  Fairies Wear Boots (Black Sabbath)
06.  Suicide Solution
07.  Road to Nowhere
08.  War Pigs (Black Sabbath)
09.  Shot in the Dark
10.  Rat Salad (Black Sabbath)
11.  Iron Man (Black Sabbath)
12.  I Don’t Want to Change the World
13.  Crazy Train
14.  Mama I’m Coming Home
15.  Paranoid (Black Sabbath)

Compartilhe
Ler mais sobre
Metal Morcego Porto Alegre
Ler mais sobre
Políticas culturais Reportagem

Prefeitura de Porto Alegre usou projeto reprovado para licitar obra na Usina do Gasômetro

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *