Fui ao Teatro do CIEE na última quinta-feira um pouco às escuras. Em parte pela iluminação pública porto-alegrense ser, em geral, deficitária. Em parte porque eu não tinha a noção exata do que ia encontrar no show de Duca Leindecker. Ninguém que foi assisti-lo tinha, afinal, era o primeiro show de sua turnê solo, em um formato completamente novo, apesar de a maior parte do repertório ter sido formado por músicas da Cidadão Quem, ex-banda do artista.
Esse novo projeto se chama Voz, Violão e Batucada e consiste no artista usando sua voz e tocando seus violões, guitarras, bumbo leguero e pandeiro, quase tudo ao mesmo tempo – e ele usa ainda a caixa do violão de forma percussiva. Um disco homônimo com canções inéditas já está à venda pelo iTunes, mas com lançamento oficial programado para a próxima terça-feira.
Abrir com “Girassóis” foi como se o músico convidasse sua plateia – que lotou os dois dias de show, fazendo com que a Hits Entretenimento, responsável pelas apresentações, programasse uma sessão extra – para entrar em sua casa e tomar UM BOM VINHO. No refrão e na introdução da música, Duca fez um novo arranjo para o formato ‘homem-banda’, que caiu muito bem, sem descaracterizar a canção e dando um frescor a ela.“Brutalidade e Sol”, de sonoridade um pouco mais soturna, foi a primeira da nova safra a ser apresentada.
“Ao Fim de Tudo”, também da Cidadão, fez os fãs cantarem junto e “Depois da Curva” representou – bem – o Pouca Vogal. Depois desta, quando as cortinas subiram, evidenciou-se uma bonita e muito elaborada iluminação, incomum para um show essencialmente acústico. Em “Os Segundos”, ele ganhou a companhia do baixista Nando Peters, que continuou em “Cachecol Vermelho”, que é outra das novas, “Do Nosso Tempo”, “Breve” e “Pinhal”. Na última, Leindecker resolveu botar suas asinhas de guitarrista de fora e deixou muitos impressionados com a técnica apurada de seus solos, como se já não bastasse a complexa configuração em que ele se apresentou durante a maior parte da 1h15min de show.
“Dia Especial” retomou os hits dos tempos de Cidadão e “Tudo É Longe”, outra nova, mostrou-se a mais fraca do repertório. Foi quando precisou rearranjar “Toda a Forma de Poder” para o Pouca Vogal que Leindecker pensou em explorar o formato atual, e ele gostou tanto da brincadeira que resolveu se aprofundar nela, conforme explicou antes de executá-la. Um cover de “Message In A Bottle”, do The Police, e um medley de “O Amanhã Colorido” e “Iceberg”, provavelmente a melhor e mais criativa música do novo trabalho, finalizaram os trabalhos – no bis, o música fez um medley com músicas que o público ia pedindo.
O grande mérito de Duca Leindecker em Voz, Violão e Batucada é fazer com que dois mundos diferentes conversem entre si: o da técnica apurada e o da canção popular. São raros os artistas que conseguem juntar os dois de forma homogênea. No Brasil, talvez não seja inédito, mas desconheço alguém que faça algo parecido com o que ele está fazendo – com exceção dos artistas de rua, claro.
As técnicas de fazer sons percussivos na caixa do violão e outras como tapping e two hands, usadas por artistas como Andy McKee e Stanley Jordan, já não são fáceis de fazer quando a concentração é apenas em tocá-las; quando há a preocupação de cantar e ainda usar os pés para ajudar na percussão, menos ainda. Assim, apesar de ainda evidentemente precisar fazer alguns ajustes e achar o melhor caminho dentro desse novo universo sonoro, Duca Leindecker encontrou uma proposta original e diferenciada, merecendo os créditos por isso.