“Quarteto Fantástico” não chega nem a mediano

Nova tentativa da Fox aposta numa abordagem frágil, abrindo mão do humor e da ação. (Crédito: 20th Century Fox).

Quarteto Fantástico (Fantastic Four, EUA, 2015)

Direção: Josh Trank

Roteiro: Simon Kinberg, Jeremy Slater e Josh Trank, baseado nos personagens de Stan Lee e Jack Kirby.

Com: Miles Teller, Kate Mara, Michael B. Jordan, Jamie Bell, Toby Kebbell, Reg E. Cathey, Tim Blake Nelson, Dan Castellanetta, Owen Judge, Evan Hannemann.

Deve haver alguma maldição sobre o Quarteto Fantástico no Cinema. Enquanto figuras improváveis como Homem de Ferro, Homem-Formiga e os Guardiões da Galáxia ganharam versões bem-sucedidas nas telonas (e aventuras com os ainda mais obscuros Doutor Estranho, Capitã Marvel e os Inumanos estão a caminho), a família superpoderosa que é um dos marcos iniciais do Universo Marvel nos quadrinhos ainda não conseguiu ganhar um longa decente – e não é por falta de tentativas. Ficar apenas levemente acima da tosqueira trash (nunca lançada oficialmente) produzida por Roger Corman em 1994 e dos dois terríveis longas dirigidos por Tim Story (quem?) em 2005 e 2007 não é algo para se orgulhar.

E é uma pena, porque, mesmo tendo sua cota de problemas, a primeira metade dessa versão é até moderadamente promissora. Apresentando-nos a um Reed Richards (Teller) ainda menino, sua genialidade logo é estabelecida ao construir uma máquina de teletransporte na garagem. Encarado com escárnio por seu professor de ciências (o pior da história da Humanidade), o experimento de Reed chama a atenção do cientista Franklin Storm (Cathey), que o recruta para desenvolver um projeto similar iniciado pelo brilhante, mas arrogante, Victor von Doom (Kebbell). Contando com a ajuda dos filhos de Storm, Sue (Mara) e Johnny (Jordan), Reed finaliza o projeto e convoca seu melhor amigo Ben Grimm (Bell) para os testes. Transportados para uma dimensão paralela à Terra, o grupo sofre modificações genéticas e Victor acaba ficando para trás, levando Reed a um esforço desesperado para reverter os efeitos da viagem.

(Crédito: 20th Century Fox)
(Crédito: 20th Century Fox)

Gastando um tempo enorme para concluir o projeto na Fundação Baxter, ainda assim a primeira metade é razoavelmente eficaz em despertar interesse pela premissa levantada, estabelecendo o progresso de Reed e Victor de maneira convincente (e que dá uma justificativa bem menos datada para o incidente do que a vista em 2005). Além disso, a sequência que se passa na dimensão paralela é conduzida com uma correta urgência, embora o desfecho provoque um estranhamento inevitável quanto aos efeitos experimentados por Sue. Fica claro que a abordagem buscada por Josh Trank (Poder Sem Limites) segue mais para a linha da fantasia de ficção científica ao invés de uma aventura tradicional de super-herói, algo que pode ser notado pela paleta de cores que tende ao cinza, diametralmente oposta ao que vem sido feito pela Marvel Studios (mas não chega ao tom solene empregado pela DC). Porém, isso impõe um certo tédio visual ao filme, mesmo que haja alguns acertos do design de produção (como ao trazer a máquina no edifício Baxter como uma versão 200.0 da criada por Reed com sucata).

No entanto, nada redime o filme de sua principal falha: se o Quarteto se destacou nos quadrinhos por ser não apenas uma equipe, mas uma família de heróis, tal dinâmica é quase inexistente neste filme. Beira o oposto, na verdade: Sue e Johnny se tratam sempre de forma fria e distante, a aproximação romântica entre Sue e Reed mal é sugerida, e as trocas de farpas entre Johnny e Ben só surgem na cena final. Não há qualquer alma na relação dos personagens, que sequer parecem gostar uns dos outros, tornando sua união final uma mera conveniência e comprometendo irremediavelmente seu elo com o lado de cá da tela, por mais que os atores se esforcem – e Miles Teller, em particular, faz o possível para ilustrar a pouca sociabilidade de Reed sem transformá-lo numa caricatura, sendo bem-sucedido. Por sua vez, Michael B. Jordan transforma seu Johnny Storm num contraponto ao (péssimo) de Chris Evans, mas apenas o mantém como uma figura aborrecida e mal-humorada, enquanto Kate Mara e Jamie Bell mal tem tempo de explorar qualquer nuance de Sue e Ben. E se Toby Kebbell também é sabotado pelo roteiro, que logo transforma o Doutor Destino num genérico aspirante a Ultron, Reg E. Cathey acaba se destacando como o “mentor” Franklin Storm, mesmo com sua dinâmica com os filhos sendo (como todo o resto) pobremente desenvolvida.

(Crédito: 20th Century Fox)
(Crédito: 20th Century Fox)

Também prejudicado pelos intérpretes absolutamente inexpressivos dos jovens Reed e Ben, Quarteto Fantástico desmorona de vez em sua segunda metade: esquecendo-se que o período de “adaptação” costuma ser o ponto alto em obras do gênero, o roteiro o exclui completamente ao incluir uma elipse de um ano, após a qual todos já surgem em pleno domínio de suas habilidades. Embora inclua subtramas como a fuga de Reed, a raiva de Ben pelo amigo e o uso de Ben e Johnny pelos militares, a falta de estrutura entre estas as fazem parecer meras desculpas para atrasar o terceiro ato, já que várias são abandonadas sem cerimônia com o retorno de Victor. Falando nele, a ameaça representada pelo vilão é resolvida com uma facilidade decepcionante, algo que só é piorado pela condução absurdamente preguiçosa de Trank, que não parece ter qualquer ideia de como combinar os poderes do grupo. Não bastasse a brevidade da sequência, também irrita a insistência de Reed de explicar tudo o que Victor está fazendo.

Burocrática em seu desenvolvimento, gastando tempo demais com coisas triviais e descartando qualquer traço do humor e calor humano que garantiu longevidade ao seu material de origem, esta nova versão da Primeira Família da Marvel não chega a irritar como aqueles filmes da década passada, mas é fraca demais para despertar qualquer entusiasmo por novas aventuras do grupo. Não surpreende que a própria Fox estivesse tão insegura quanto ao material que entregou. Confirmando o conhecido dito, o melhor filme do Quarteto Fantástico continua a ser o sensacional Os Incríveis. E pelo visto, isso deve ser manter por um bom tempo…

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