Candidatos ao governo do RS respondem perguntas sobre cultura e direitos humanos

A pouco mais de duas semanas para as eleições 2018, o Nonada entrevistou os candidatos ao governo do Rio Grande do Sul, com foco em perguntas exclusivamente sobre a área da cultura e dos direitos humanos. O objetivo é conhecer as principais propostas dos candidatos em relação a temas como a Fundação Piratini, Lei de Incentivo à Cultura, orçamento e estrutura da Secretaria. Questões relativas aos direitos humanos, como comunidades tradicionais, racismo e identidade de gênero também foram abordadas. As perguntas foram padronizadas para todos os candidatos, sem limite de caracteres, e respondidas por email.

Participaram da entrevista Eduardo Leite (PSDB), Jairo Jorge (PDT), José Ivo Sartori (MDB), Mateus Bandeira (NOVO), Miguel Rossetto (PT) e Roberto Robaina (PSOL). O candidato Julio Flores (PSTU) foi contatado pela reportagem mas não respondeu.

Índice por temas

1.Fundação Piratini

2.Papel do Estado na Cultura

3.Secretaria da Cultura e Orçamento

4.Lei de Incentivo à Cultura

5.Povos e Comunidades Tradicionais

6.Direitos das mulheres, população LGBT e comunidade negra

7.Refugiados

***

Confira as respostas na íntegra:

Fundação Piratini

A extinção da Fundação Piratini e a consequente nova proposta do governo foram bastante criticadas pela classe artística. Como o senhor pretende conduzir essa questão?

Eduardo Leite – A Fundação Piratini, que deveria ser o veículo da expressão pública dos gaúchos, foi concebida em um modelo estrutural equivocado. Nenhum pensamento independente é possível sob o comando ou com a interferência do Estado. Nesse formato, a instituição será sempre suscetível às variações ideológicas e refém das orientações políticas de cada governo. A melhor referência que temos no Brasil, um modelo semelhante à PBS norte-americana ou à BBC britânica, é a Fundação Padre Anchieta, de São Paulo, uma entidade de direito privado, pública mas não estatal. É assim que interpretamos a existência de uma emissora pública. Estimularemos a criação de uma entidade autônoma e independente, autofinanciável com a contribuição da sociedade, que prescinda do Estado e possa expressar livremente, sem pressão política ou econômica a diversidade cultural e artística do Rio Grande do Sul.

Jairo Jorge – Eu discordo dessa medida do atual governo e pretendo revogar a extinção de todas as Fundações. Essa atitude gerou um corte profundo na inteligência do Estado. Precisamos, claro, repensar o papel das estruturas públicas, adequá-las ao momento atual e às necessidades atuais, mas sou contra as extinções.

José Ivo Sartori – Vamos conduzir a questão com a mesma transparência e determinação que nos moveram durante todo o processo de extinção das fundações. Em relação à Fundação Piratini, foi extinto apenas o status de entidade porque sua estrutura ficou excessivamente onerosa para os padrões das finanças do Estado. É preciso deixar bem claro que as emissoras públicas FM Cultura e TVE continuarão existindo com seu caráter público, com uma programação educativa, cultural e informativa. A Fundação Piratini tornou-se insustentável por vários motivos. Um deles é o custo da folha de pessoal e o grande número de ações trabalhistas impetradas nos últimos anos, além dos altos custos de multas aplicadas pela Anatel devido a problemas técnicos nas retransmissoras. Só em 2016 foram pagos cerca de R$ 50 mil em multas. A Secretaria de Comunicação dará seguimento ao serviço público prestado pela extinta Fundação Piratini, garantindo os preceitos constitucionais pertinentes aos serviços de comunicação social. A programação continuará tendo caráter independente, assegurando liberdade de expressão.  Com isto, o governo do Estado reafirma seu compromisso de manter os canais públicos plurais, com conteúdo educativo e cultural.

Mateus Bandeira – O Rio Grande do Sul passa por uma das piores crises da sua história. O Estado precisa romper com essa espiral econômica descendente, reduzindo gastos e diminuindo a máquina pública, além de tornar nosso ambiente mais atrativo aos negócios e ao empreendedorismo. Entendemos que as privatizações e a extinção de fundações são necessárias para que se cuide do essencial: da segurança, da saúde e da educação. Assim como o Estado não deve ser empresário de energia ou de mineração, também não deve ser da Comunicação, uma área que, historicamente, sempre foi usada de forma ideológica a cada gestão que se sucede. O mesmo serviço pode ser prestado através de parcerias, com muito mais qualidade e diversidade de conteúdo. O Novo propõe uma ampla e profunda reflexão do papel do Estado em diversas áreas. A Comunicação e a Cultura são algumas delas.

Miguel Rossetto – Com o pretexto de cortar gastos, o atual governo do estado conseguiu aprovar na Assembleia Legislativa projetos para a extinção de dez fundações, duas empresas públicas e uma autarquia. Desde então, porém, decisões judiciais têm suspendido os trâmites, fazendo com que a maior parte das fundações ainda exista formalmente. Enquanto isso, os serviços prestados por essas instituições foi paralisado e os servidores que atuavam nelas estão sem conseguir trabalhar ou desempenhando funções que não condizem com sua formação. Fomos totalmente contrários a este projeto e iremos rever imediatamente essa política que, além de não ter diminuído gastos, desorganizou os serviços prestados. A Fundação Piratini precisa ser recuperada, resgatando suas atividades e suas funções.

Roberto Robaina – Nós do PSol somos contra a venda do patrimônio público. Nossa proposta é a revogação das medidas de Sartori de extinção das fundações, incluindo a Fundação Piratini. Para nós, as fundações e empresas públicas são inegociáveis, pois são fundamentais na pesquisa, construção e implantação de políticas públicas no Rio Grande do Sul. A TVE e a FM Cultura são imprescindíveis para a comunicação pública e a cultura do Estado. Com um orçamento anual de R$ 28 milhões, o equivalente a 0,08% do total do Estado, são veículos que ajudam na construção da cidadania e ainda ajudam a fomentar uma economia criativa que movimenta R$ 11,7 bilhões por ano no Rio Grande do Sul.

Papel do Estado

Qual o papel do Estado no incentivo à produção artística e que medidas seu governo vai propor para garantir essa função?

Eduardo Leite – A Cultura é uma área que merece o maior respeito dos governos, especialmente no Rio Grande do Sul, pois ela reflete a grandeza imaterial de um povo, sua história e sua criatividade, e precisa dos governos para se consolidar e prosperar. Mas não exclusivamente dos governos. O apoio à produção artística deve ser de toda a sociedade e a comunidade cultural deve estreitar as relações com a iniciativa privada para que não fique dependente do apoio estatal. Ao Estado, cabe estimular a Cultura por meio de Leis de Incentivo e por fundos de apoio aos pequenos agentes culturais que têm dificuldade ao acesso de recursos pelos meios convencionais. Nós iremos fazer essa ponte.

Jairo Jorge – Quando prefeito de Canoas, fizemos muito pela cultura. Criamos o Canoas Jazz Festival, implantamos cinco bibliopraças, ampliamos e reformamos a Biblioteca Municipal João Palma da Silva, oito prédios representativos para a história de Canoas foram tombados, a Villa Mimosa, reformada, transformou-se na Casa das Artes, a Casa dos Rosa foi reformada, o Paço Municipal foi tombado, fizemos 1º Hangar Cultural no Guajuviras. E por que digo isso? Porque dizer que valorizar a cultura não pode ser discurso apenas. É preciso ação. Propomos promover a presença do RS em produções audiovisuais de expressão local, nacional e internacional; melhorar a manutenção e a utilização do Patrimônio Histórico; vamos recuperar os museus sob responsabilidade do Estado. Também propomos mais investimentos e sinergia nos espaços culturais no centro histórico de Porto Alegre que estão sob responsabilidade do Estado; a ampliação e o aprimoramento do Fundo de Amparo à Cultura e da Lei de Incentivo à Cultura. Estes são nossos compromissos.

José Ivo Sartori – O setor cultural gaúcho foi protagonista de grandes conquistas nos últimos quatro anos e ainda temos muito a fazer. Mantivemos as linhas de fomento, o alcance dos benefícios e a melhor distribuição regional destes recursos. Além disso, implantamos o RS Criativo para posicionar a cultura e a criatividade como eixos centrais do desenvolvimento socioeconômico sustentável do Estado. Apesar da crise, o governo não diminuiu o financiamento da Lei de Incentivo à Cultura (LIC) e do Fundo de Apoio à Cultura (FAC). Estes incentivos continuam ativos e irrigando a cultura gaúcha. O Pró-Cultura RS também foi mantido. Este é um incentivo de grande importância para o cenário cultural do Estado, já que alcança todas as regiões do estado. Estamos trabalhando para ampliar o apoio aos projetos culturais de grande efeito multiplicador, como festivais, bienais, feiras, mostras, espetáculos e vamos promover uma maior integração entre os projetos culturais que tenham uma função educativa com os programas e políticas públicas voltadas às áreas da educação e do turismo. Para melhor aproveitar a enorme geração de talentos existentes no Estado, serão promovidos cursos de formação técnica especializada que estimulem a profissionalização das atividades para a geração continuada de empregos no setor e vamos revitalizar o projeto de um polo regional de cinema que permitam um maior reconhecidos nacional e internacionalmente de nossa produção audiovisual. Acreditamos que a área cultural do Estado está no rumo certo e se prepara para um salto de valorização da produção cultural como uma cadeia produtiva, geradora de emprego e renda.

Mateus Bandeira – O Estado não é eficiente na gestão dessa área. O papel do Estado é o de assegurar acesso da educação e cultura aos que não podem pagar por elas, porém preservado a liberdade de escolha das pessoas. O Novo defende o envolvimento da empresas e organizações do terceiro setor na gestão e na oferta das atividades culturais, através de contratualizações, com estimulo à constituição de fundos patrimoniais para tornar o sistema sustentável e o mais independente possível do orçamento do Estado e da orientação do governo. Assim, o Estado deixa de ser um produtor de eventos culturais, passando a ser formulador de políticas públicas e de monitoramento técnico das metas estabelecidas no contrato.

Miguel Rossetto – Pensamos a cultura como afirmação do povo gaúcho, sua diversidade e suas manifestações representativas da identidade, criatividade e memória. Queremos ampliar a construção democrática de uma agenda que valorize as atividades e a diversidade da cultura do Estado, com a construção coletiva ampla, participativa, transversal e representativa de todas as vozes do Rio Grande do Sul, utilizando os mecanismos de financiamento existentes no Sistema Pró-Cultura, como a Lei de Incentivo à Cultura e o Fundo de Apoio à Cultura, aperfeiçoando-os.

Roberto Robaina – A arte tem um papel fundamental para a reflexão e compreensão da realidade em que vivemos. Por isso, a criação e produção artística são essenciais para o debate das questões importantes da nossa sociedade. Neste quesito, o Estado tem papel importante no fomento à produção artística e entre os compromissos do nosso governo para a área estão o incentivo à criação e consolidação dos orçamentos de cultura nos municípios, o incentivo à criação de Fundos Municipais de Cultura e a inversão de prioridades na Lei de Incentivo à Cultura, para passar a priorizar projetos que visem a criação e produção de artistas locais. Além disso, a implementação efetiva do Fundo de Amparo à Cultura, o FAC, com a destinação de um orçamento igual a 50% do valor captado pela LIC também está nos nossos compromissos.

Secretaria da Cultura e orçamento

Hoje, a Secretaria de Cultura está atrelada à de turismo, esporte e lazer. O senhor pretende manter essa estrutura? O que pensa sobre o orçamento atual destinado à cultura?

Eduardo Leite – Gostaríamos de dispor de um orçamento maior para a Cultura. O Estado, no entanto, que usa hoje 76% do orçamento apenas para remunerar o seu servidor e se debate em uma crise financeira sem precedentes, precisa diminuir para caber no bolso do contribuinte e concentrar seus recursos em áreas vitais que exigem a sua presença. Desassombrada e honestamente, Educação, Segurança e Saúde têm nesse momento precedência. O que precisamos – e faremos – é botar esse Estado para crescer, a única forma de ampliarmos os recursos e atender todas as áreas com a importância que elas merecem. Aglutinar Cultura a Turismo, Esporte e Lazer não é a melhor fórmula, mas precisamos avaliar todas as condições do governo para tomarmos uma decisão técnica e realista.

Jairo Jorge – Nosso plano de governo prevê uma remodelação total da estrutura do Estado. Cultura e agricultura rimam, mas não se pode fazer esse tipo de fusão de pastas. Propomos um governo descentralizado, com transversalidade. Teremos 10 grandes estruturas: conhecimento, vida, cidadania, infraestrutura, desenvolvimento, receita, gestão, governança, jurídico e transparência. Tornaremos o estado muito mais enxuto e resolutivo. Os 10 Escritórios Executivos de governo terão redistribuição de atribuições e simplificação de processos de informação e decisão: 5 escritórios voltados às áreas meio, à administração do Estado; e 5 escritórios finalísticos voltados aos principais serviços públicos e temas. Os Escritórios trabalharão de forma focada, matricial com os Escritórios Regionais e em um novo sistema de tomada de decisão, também focado em suas metas específicas. Proponho três níveis hierárquicos: formulação (executado pelo governador e secretários), desenvolvimento (com diretor) e execução (com gerente). Isso muda radicalmente a estrutura do Estado que é muito lenta e ineficaz. Isso impactará, claramente, no orçamento do Estado.

José Ivo Sartori – Essa configuração foi adotada no contexto dos ajustes promovidos pelo Plano de Modernização do Estado, visando otimizar os custos e equilibrar as contas. A unificação das estruturas, envolvendo Cultura, Turismo, Esporte e Lazer, deu muito certo e foi protagonista de grandes conquistas nos últimos quatro anos. Por certo que será mantida, pois trouxe maior agilidade no gerenciamento e otimização de recursos. Um dos exemplos de como o governo Sartori administra a cultura é a casa de música da Ospa. Em 46 anos, vários governos passaram e nenhum conseguiu dar uma resposta para os problemas da orquestra, que desde os anos 1950 não têm um local fixo para ensaios e espetáculos. Através de parcerias com a iniciativa privada e o apoio da sociedade, hoje a Orquestra Sinfônica de Porto Alegre e do Rio Grande do Sul tem sua sede e seu teatro.

Mateus Bandeira – Nosso plano de governo aborda a cultura na agenda de educação, justamente por entender o importante nível de intersetorialidade das áreas. A cultura tem um importante papel a agregar à educação. Além disso, estando interligadas, podemos otimizar tanto a gestão como o plano de acesso para ambas.

Miguel Rossetto – Nossos governos tem tradição na valorização da cultura gaúcha com fortalecimento das políticas culturais, ampliação da democratização do acesso e da construção de programas que sejam representativos da diversidade do nosso povo. Temos compromisso com a aplicação de diretrizes que coloquem a cultura como eixo da estratégia do governo, valorizando e democratizando a atuação da Secretaria da Cultura do Estado.

Roberto Robaina – O governo Sartori foi um desastre em todas os setores e a Cultura é mais um exemplo. Com a fusão da Cultura, Turismo, Esporte e Lazer em uma única pasta, o que ocorreu na prática foi uma redução brusca no já historicamente pequeno orçamento destinado à área. Não concordamos com esta estrutura. Nós acreditamos que a Cultura é fundamental para a formação crítica do cidadão e para o desenvolvimento social e econômico do Estado e terá papel privilegiado na formulação das políticas públicas no nosso governo. O orçamento atual da cultura é um reflexo das escolhas equivocadas dos sucessivos governos do Estado. Temos citado com frequência o exemplo da isenção de R$ 380 milhões dada à Videolar pelo governo Sartori e aprovada por todos os partidos na Assembleia Legislativa, com exceção do PSOL. Esta isenção representa três vezes o orçamento da Cultura e foi concedida em troca da geração de apenas cinco empregos. Nossa política irá na direção oposta deste tipo de descalabro com o dinheiro público.

Lei de Incentivo à Cultura

A Lei de Incentivo à Cultura, que promove isenção fiscal a empresas patrocinadoras das produções artísticas, tem beneficiado grandes espetáculos e produções, que geram mais visibilidade. Com isso, os artistas e produtores menos conhecidos, que são os que mais precisam de incentivo, não acabam sendo preteridos?

Eduardo Leite – Precisamos de instrumentos alternativos para contemplar os pequenos produtores e a diversidade cultural, as coletividades minoritárias. Fizemos isso em Pelotas e faremos isso no Estado. Construiremos esses mecanismos em conjunto com a comunidade cultural.

Jairo Jorge – Como dito acima, nosso plano de governo vai aprimorar a LIC. Faremos isso com amplo diálogo com todos os setores culturais envolvidos. Mas é inegável a necessidade de remodelagem.

José Ivo Sartori – Esta disparidade existiu sim, mas estamos atuando no equilíbrio da concessão de benefícios para uma melhor distribuição regional e maior igualdade na distribuição dos recursos. Somado a isso, haverá um incentivo maior à profissionalização das atividades para a geração continuada de empregos no setor. Por certo que uma maior qualificação traz consigo maiores atrativos a investidores e, nos moldes que propomos, as isenções terão regramentos que possibilitem um maior atendimento tanto de projetos artísticos, quanto da descentralização de recursos com melhor distribuição regional.

Mateus Bandeira – Essa é uma prática da velha política, a de beneficiar os amigos do rei. Uma das vantagens de se ter ONGs e Oscips na gestão das instituições é o fato de que cabe a elas, por contrato, fazer a captação no setor privado. A discussão sobre financiamento e sustentabilidade na cultura também deve estar associada à discussão sobre os endowments – fundos patrimoniais de doações de pessoas físicas e jurídicas para dar sustentabilidade a projetos e instituições, como museus, universidades e teatros. Essa linha de gestão garante o pluralismo e a abertura, permitindo criar projetos em sintonia com as demandas populares, com as demandas de consumo.

Miguel Rossetto – O melhor meio de democratizar e sustentar o financiamento cultural é através do Sistema Pró-Cultura, como funcionou no Governo Tarso Genro. No Sistema Pró-Cultura  a concessão de benefícios fiscais alimenta com fonte de recursos o Fundo de Apoio à Cultura (FAC), um mecanismo de fomento que disponibiliza os recursos diretamente para os proponentes de projetos selecionados através de editais. Com este sistema, e a definição de prioridades através da consulta pública e democrática, garantimos a representação da diversidade cultural do Estado no financiamento público da cultura gaúcha.

Roberto Robaina – Sim, é o que acabou ocorrendo a partir da opção feita por todos os últimos governos eleitos no Estado. O argumento de garantir o acesso a “bens culturais” pela população tem sido usada para justificar incentivos fiscais a empresas que nem sempre precisariam deste benefício. A contrapartida oferecida é restrita e não beneficia de fato o povo. A inversão de prioridades na Lei de Incentivo à Cultura, para passar a priorizar projetos que visem a criação e produção de artistas locais, é um dos nossos compromissos.

Povos e Comunidades Tradicionais

O Rio Grande do Sul é um estado de muita diversidade cultural, inclusive com comunidades e povos tradicionais, como os quilombolas, indígenas e povos de terreiro. Como seu governo pretende atuar junto a essas comunidades na garantia de seus direitos?

Eduardo Leite – A resposta anterior contempla essa pergunta.

Jairo Jorge – A defesa dos direitos do povo negro, das comunidades tradicionais e LGBT+ sempre tiveram prioridade na minha gestão na Prefeitura de Canoas. Instituí as coordenadorias da igualdade racial, das mulheres, da diversidade e comunidades tradicionais. Todas elas tinham status de secretaria para que fosse possível a execução de políticas públicas afirmativas de promoção da cidadania e enfrentamento aos preconceitos. Não eram apenas espaços para ter publicidade. Tinham orçamento e equipes capacitadas. Como governador, proponho uma política avançada de igualdade racial, especialmente no que se refere ao protagonismo, à educação, cultura, trabalho e defesa da liberdade religiosa. Na temática LGBT+, proponho a criação de um sistema estadual de políticas de enfrentamento à LGBTfobia e de visibilidade deste segmento. A política para as mulheres é também um ponto prioritário de nosso programa, principalmente no que diz respeito às ações efetivas de combate à violência doméstica, ao assédio e ao feminicídio, pois os índices desse tipo de violência cresceram muito em função do desmonte das políticas públicas que existiam.

José Ivo Sartori – Nosso governo sempre se manteve atrelado aos anseios da população, independentemente do credo ou raça, e isso não vai mudar. Fomos eleitos por pessoas e é para elas que trabalhamos.

Mateus Bandeira – Existe um apartheid muito mais grave no Rio Grande do Sul que é o cognitivo, que impede que a maioria dos gaúchos exerça o direito de buscar uma educação melhor e, com isso, de alcançar graus mais elevados de felicidade, como em sociedades mais civilizadas e, consequentemente, mais integradoras. Cabe ao Estado permitir o acesso a todos ou, na impossibilidade, contratualizar com instituições e organizações.

Miguel Rossetto – Temos compromisso com a promoção da igualdade racial, o combate ao racismo e à intolerância religiosa e a valorização da diversidade cultural do nosso povo. Vamos constituir uma estrutura específica para a gestão de políticas voltadas à promoção da igualdade racial, ao enfrentamento da vulnerabilidade e ao combate ao racismo e à intolerância cultural e religiosa. Desta forma constituiremos um eixo de atuação estatal, com espaço de manifestação, atendimento especializado e estímulo à produção e ao desenvolvimento dos povos tradicionais.

Roberto Robaina – Este é um debate central no programa de governo do PSOL-PCB. O apoio à regularização das comunidades quilombolas está entre os nossos compromissos. Atacar o racismo estrutural, com programas para o resgate histórico da identidade negra no Rio Grande do Sul e com ações afirmativas perpassando toda a administração serão políticas prioritárias do nosso governo. A questão indígena também está no centro do programa nacional do PSOL em 2018. Com muito orgulho, temos a líder indígena Sonia Guajajara no posto de co-presidenta na chapa junto a Guilherme Boulos. São nossos compromissos com a comunidade priorizar a demarcação de terras indígenas como uma responsabilidade do governo estadual, estabelecer relação de colaboração com as lideranças indígenas do Estado, discutindo todas as políticas para a população e reconhecer e aplicar as especificidades indígenas nas políticas direcionadas a essas populações.

Direitos das mulheres, população LGBT e comunidade negra

Qual sua proposta para as políticas de combate ao racismo e de atendimento às mulheres e à comunidade LGBT?

Eduardo Leite – O nosso governo assegura apoio e proteção para o exercício da livre manifestação e dos direitos a todos os gêneros e raças. A discriminação não é tolerável. À ela, os rigores da lei.

Jairo Jorge – Propomos uma abordagem sistêmica para igualdade racial, envolvendo cultura, educação, protagonismo, saúde e trabalho; resgate e destaque ao papel da população negra na história do Rio Grande do Sul; pedagogia da inclusão; formação de lideranças. Política avançada e abrangente para promover a valorização e inserção profissional da mulher; o equilíbrio entre família e trabalho; a formação de lideranças femininas em todas as atividades. Desenvolveremos um programa amplo de prevenção, monitoramento, formação de banco de dados e acolhimento de mulheres e meninas vítimas de violência e assédio; trabalho específico de prevenção desde as séries iniciais do ensino fundamental; formação de rede efetiva para a família com saúde, educação, área social e políticas de desenvolvimento, com base na liderança feminina. Buscar a paridade na formação das equipes de governo; estudo e censo sobre a participação feminina nas diferentes áreas, no Estado. Quanto à comunidade LGBT+, implantaremos um sistema de coordenação de políticas públicas e execução multidisciplinar, envolvendo os escritórios regionais de governo, para promoção de ações para garantir direitos e o respeito à diversidade, inclusive na administração pública: políticas para LGBT+, especialização de unidades no Estado para atendimento nas áreas de segurança, saúde e social; reforço da educação e cultura da diversidade na rede pública.

José Ivo Sartori – Temos atacado de frente os problemas em relação a todos os tipos de preconceitos. Desde os níveis educacionais, onde temos Comissões Internas de Prevenção de Acidentes e Violência Escolar (Cipaves) instaladas em quase 100% das escolas estaduais. O resultado deste trabalho é a redução drástica do bullying e racismo nas escolas. Acreditamos que este tipo de trabalho deva ser iniciado nos primeiros anos escolares para que as crianças e adolescentes compreendam e aceitem a diversidade sexual e racial. No atendimento às mulheres, fortalecemos a consolidação dos serviços e políticas públicas voltados ao enfrentamento, atendimento e prevenção à violência e, principalmente, a implantação e o fortalecimento das ações voltadas à promoção da autonomia da mulher como agente transformador e propulsor da sociedade. Durante nossa próxima gestão iremos fortalecer as políticas para as Mulheres (articulação e fomento ao atendimento especializado). Fortalecer o Programa Mulher Vida e Direitos com a promoção da autonomia das mulheres, por meio de capacitação, empreendedorismo e oportunidade de trabalho; ampliar a rede de atendimento psicossocial às mulheres vítimas de violência, sobretudo, com a realização de parcerias com os municípios e a articulação das Salas Lilás e dos centros de referência para a proteção da mulher; implementar o programa Mulheres do SUAS, que visa ao fortalecimento de vínculos familiares, ao combate ao feminicídio, à prevenção à violação de direitos e à emancipação social. Além disso, no setor da Segurança, vamos ampliar as redes de atendimento à mulher, com fortalecimento da Patrulha Maria da Penha, da Sala Lilás, das Delegacias de Atendimento à Mulher, entre outros instrumentos; Fortaleceremos o Programa Mediar, como instrumento de justiça restaurativa no âmbito das delegacias de polícia, com foco na redução da violência doméstica. E vamos incentivar os municípios a criarem planos decenais de Direitos Humanos da População Negra, População Indígena, Quilombolas e da Diversidade Sexual. Além disso, iremos apoiar a implantação de uma rede estadual intersetorial de enfrentamento à violência de gênero e étnico-racial, fortalecendo e articulando as políticas públicas voltadas para a temática de direitos humanos.

Mateus Bandeira – Todos devem, de acordo com a constituição, ser tratados da mesma forma perante a lei. O papel do Estado é oferecer o acesso à saúde, segurança e educação aos cidadãos. O Novo é um partido liberal, ou seja, que acredita na liberdade individual das pessoas e que o Estado não deve interferir em questões que não lhe digam respeito.

Miguel Rossetto – Queremos retomar as políticas de igualdade racial e reativar o Programa “Rio Grande sem LGBTFobia”, combatendo os preconceitos e afirmando direitos e cidadania. Vamos promover a igualdade de gênero, garantindo cidadania, maior dignidade e acesso à educação inclusiva, à autonomia financeira e à proteção da vida das mulheres em sua diversidade. Precisamos ter uma política que combata centralmente o feminicídio, assim como todas as formas de violência contra a mulher, instituindo uma rede de proteção à vida e à integridade da mulher, que chamamos de Rede Lilás.

Roberto Robaina – São aspectos centrais do nosso plano. Nós acreditamos que a escola pode e deve ser o espaço de promoção dos debates essenciais para a cidadania. Nosso projeto é promover um choque educacional para combater o machismo, o racismo e a LGBTfobia da nossa sociedade.  Entre as nossas propostas para cada questão estão: Combate ao racismo – Projeto de ações afirmativas em todas as secretarias estaduais, incluindo necessariamente a presença de negros e negras entre os secretários. Programas de formações antirracista abertas à população centralizadas e descentralizadas. Programa de resgate histórico da identidade negra no Rio Grande do Sul, reconhecendo oficialmente a importância do povo negro na construção do nosso Estado. Apoio aos povos tradicionais de matriz africana na regularização das unidades territoriais tradicionais, protegendo a cultura e a ancestralidade dessas populações. Aplicação da Lei 10.639 no Rio Grande do Sul, com ensino da formação da história afro-brasileira em toda a rede do Estado. Mulheres – Recriar a Secretaria de Políticas para as Mulheres.Qualificar e a ampliar o número de delegacias das mulheres. Direção das delegacias das mulheres por delegadas e policiais femininas, treinadas para esse tipo de atendimento.Estabelecer rede de assistentes sociais, bem como ampliação das casas de apoio, com atendimento especializado no campo da saúde; e organização de juizados específicos para que a Lei Maria da Penha seja efetivamente aplicada, além de uma ampla campanha pública contra a violência. População LGBT – Colocar em prática da Lei Anti-LGBTfobia Estadual para coibir e punir ações LGBTfóbicas e preconceituosas e criação da rede de atenção às vítimas de violência. Apoiar os Movimentos Nacionais LGBT para aprovação da criminalização da LGBTfobia e positivação do casamento igualitário entre pessoas do mesmo sexo, bem como do direito de adoção. Desenvolver ações intersetoriais de educação em direitos humanos e respeito à diversidade, efetivando campanhas e currículos que abordem os direitos sociais. Estabelecer motivação de discriminação por identidade de gênero e orientação sexual em registros nos protocolos de atendimentos nas delegacias e demais instituições públicas que encaminham denúncias.

Refugiados

E que medidas deve tomar para receber os refugiados, principalmente agora com a chegada dos venezuelanos?

Eduardo Leite – O resguardo de indivíduos e comunidades discriminadas e perseguidas em seus países de origem é um dever do Estado e uma questão de solidariedade, de respeito aos direitos humanos. Estaremos abertos para receber nossos irmãos venezuelanos e, junto com as prefeituras dispostas a abrigá-los, daremos todo o apoio e estrutura necessária a sua integração à sociedade gaúcha. Não devemos esquecer que quem construiu o Rio Grande do Sul e a sua riqueza material e cultural foram, além de nossos indígenas e afro-descendentes, justamente os imigrantes.

Jairo Jorge – Nosso Estado é feito por imigrantes. Nossa cultura e nossa economia refletem isso, seja pelas mãos de portugueses, italianos, alemães, poloneses… O problema de refugiados é mundial e não podemos agir de outra forma senão sendo humanitários e gerando ações que permitam que imigrantes possam ser inseridos na nossa sociedade.   

José Ivo Sartori – O Rio Grande do Sul tem no acolhimento dos imigrantes a formação de suas origens. Isso brindou nosso povo com uma das mais ricas culturas do país. Por certo nunca vamos dar as costas aos irmãos venezuelanos, ou qualquer outro povo que busque acolhimento no Estado. Claro que devemos estar preparados, assim como durante a chegada dos Haitianos e outros que vieram em busca de melhores condições. Mas não nos furtaremos de auxiliar durante esta grave crise humanitária e encontraremos as melhores alternativas.

Mateus Bandeira – Acredito que a questão prioritária é: como o Estado arcará com os custos dessas pessoas aqui, entre saúde, educação e segurança. A questão humanitária é importante, mas há que se questionar se haverá qualidade de vida para essas pessoas.  Quando o Rio Grande do Sul se tornar um Estado com maior geração de emprego e renda, fruto da política de gestão e atração de investimentos que pretendemos implementar, aí, sim, poderá haver maior tranquilidade em receber essas pessoas.

Miguel Rossetto – Nosso compromisso com os direitos humanos é geral e abarca toda a população do estado, inclusive os refugiados. Com Haddad e Manuela, promoveremos o direito dos imigrantes conjuntamente à Política Nacional de Migrações e reconheceremos, de forma ampla, os direitos de refugiados.

Roberto Robaina – A migração é um direito humano e o governo deve fazer todo o esforço para receber e integrar refugiados que cheguem ao nosso Estado. Para isso, devemos planejar medidas de acesso à educação formal para as crianças e adolescentes, promover o acesso ao sistema de saúde e políticas para integração ao mercado de trabalho.

 

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