Na semana da Cúpula da Amazônia, gestores de cultura defendem o papel do setor na Justiça climática

Secretários de cultura apontaram demandas e experiências voltadas à importância da cultura na preservação da Amazônia

Ao som do carimbó do grupo As Sereias do Mar, do município de Marapanim (PA), gestores culturais, representantes do Terceiro Setor, trabalhadores da cultura e líderes indígenas e quilombolas se reuniram nesta segunda (07), para debater a importância da cultura na Justiça Climática e na preservação do meio ambiente. O encontro, promovido pelo Consórcio Interestadual Amazônia Legal, ocorreu em paralelo à Cúpula da Amazônia.

Na fala de abertura da ministra da Cultura, Margareth Menezes, as palavras “riqueza” e “bem viver” indicam como o governo tem pensado em políticas para a região. “O Ministério da Cultura vem sinalizando uma aproximação com a região norte do nosso país, essa região pulsante de cultura é uma usina de riquezas sem a qual é impossível pensar caminhos para o futuro do planeta sem o enfrentamento dos problemas ambientais que hoje ameaçam a existência da humanidade”, disse. 

A ministra também defendeu que é preciso “discutir práticas ecológicas e sustentáveis usando a cultura como ferramenta, nas suas formas escritas, orais e originárias” e anunciou que o MinC deve lançar em breve um edital da Lei Rouanet exclusivo para a região norte.

O evento foi marcado pelo lançamento da Carta de Secretários e Secretárias de Cultura da Amazônia Legal, lida pela secretária de cultura do Pará, Úrsula Vidal. “A cultura se coloca nesse lugar de articulação, porque compreendemos que o bioma é um elemento que nos identifica. Isso que nos caracteriza é um valor amazônico e não custo amazônico”, disse.

O documento pede a inclusão da dimensão cultural junto às dimensões econômica, ambiental e social quando se fala na preservação da Amazônia.  “A Amazônia é feita de pessoas. O mundo precisa se preocupar com o bem-viver dos quase 30 milhões de amazônidas. A Amazônia é esse território de grande diversidade étnica e cultural e essa pluralidade cultural, especialmente quando se trata dos povos e comunidades tradicionais, representa a harmonização entre o desenvolvimento socioeconômico com a manutenção da floresta viva”, diz a carta.

“Em decorrência de fatores históricos com o peso de desigualdades econômicas e sociais, o setor da economia da cultura e economias criativas possui um peso ainda pouco expressivo na dinâmica da Amazônia legal. Outra preocupação latente é o desafio de formação e qualificação do setor, especialmente quando falamos em redes produtivas das artes e das manifestações das culturas tradicionais”. Nesse contexto apontado pelos secretários, a proposta é que sejam criadas ações para potencializar o setor, de forma a contribuir para a uma economia verde. 

Experiências amazônidas para a pluralidade cultural 

Na programação do Fórum, os secretários de cultura da Amazônia apontaram experiências e caminhos para incluir o setor cultural no âmbito das políticas para a preservação do bioma, como hoje ocorre de forma transversal com áreas como a educação e a comunicação. Para Marcos Apolo, secretário de Cultura e Economia Criativa do Amazonas, a cultura transita entre todos os setores, por isso é preciso pensar em políticas integradas. “[Precisamos] entender a complexidade das culturas, dos saberes e fazeres, o respeito à cultura indígena e assegurar o conhecimento ancestral”. 

O secretário do Amazonas elencou algumas ideias que podem contribuir para uma ação mais efetiva do setor cultural, respeitando as diferenças de cada região do bioma: pesquisa e registro das culturas amazônicas, oficinas de sensibilização ambiental para artistas, residências artísticas sustentáveis, parcerias com comunidades locais e a criação inclusive de uma legislação própria para o tema.

O fomento à cultura dos municípios do interior do estado foi uma das urgências apontadas por Marcos. Ele contou que até pouco tempo o investimento da cultura chegava apenas a Manaus e a Parintins e que muitos recursos destinados a editais no interior voltavam para o governo por falta de concorrentes. “Temos um problema, por exemplo, que muita gente não sabe o que é portfólio. Então a gente precisa simplificar as ferramentas, mas também permitir que as pessoas também tenham acesso à informação necessária”. Hoje, 100% dos municípios do Amazonas estão habilitados para receberem recursos da Lei Paulo Gustavo.

Joana Machado, servidora que atua na secretaria de Educação do Pará, também destacou que é preciso pensar de forma mais prática e específica em políticas públicas para a cultura que sejam voltadas para as amazônias e sua “complexidade de sujeitos e culturas”. A gestora explicou que o conceito de desenvolvimento não é o que pauta o trabalho da secretaria. “O desenvolvimento não é uma concepção nossa. Nossa concepção é o bem viver”. 

O entendimento de que a cultura vai além das manifestações artísticas é conceito-chave para o vice-presidente do Fórum de secretários estaduais de Cultura, Jan Moura. O secretário-adjunto de Cultura do MT compartilhou algumas experiências que a pasta tem desenvolvido no estado do centro-oeste. 

“Quando a gente rompe com essa visão eurocentrada das artes e começa a entender que cultura é muito além disso, se manifesta no mundo das artes mas está longe de se fixar nelas, a gente começa a entender que o trabalho com as outras camadas da sociedade são fundamentais para a nossa política”, apontou. 

Para o gestor, quando se fala em culturas indígenas, por exemplo, é preciso considerar muito além das expressões culturais como as pinturas corporais ou danças. “Falar sobre cultura dos indígenas é falar não só sobre um instrumento musical, é falar também sobre poços artesianos, sobre energia e outros itens essenciais para a vida [desses povos]”. 

Compartilhe
Mais sobre →

Últimas