Selma: violência contra os negros se reflete nos dias atuais

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Direção: Ava DuVernay

Roteiro: Paul Webb

Com: David Oyelowo, Carmen Ejogo, Oprah Winfrey, Tom Wilkinson, Giovanni Ribisi, André Holland, Common, Wendell Pierce, Nigel Thatch, Dylan Baker, Stephan James, Stephen Root, Stan Houston, Cuba Gooding Jr., Tim Roth e Martin Sheen.

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A falta de diversidade no cinema hollywoodiano nunca foi tão questionada. Sem nenhuma indicação para atores e diretores negros na edição deste ano, o Oscar foi acusado de racismo pelos usuários das redes sociais, que ironizaram o anúncio dos possíveis vencedores com a hashtag #oscarsowhite. É em meio a esse cenário que Selma: Uma luta pela igualdade ganha ainda mais importância.

Com boas críticas e aclamada pelo público, Selma aparece como a obra mais subestimada desta edição. Apesar da indicação a melhor filme e a melhor canção original (a belíssima Glory, de  Common e John Legend), o longa foi esnobado em todas as outras categorias. A Academia, formada majoritariamente por homens (77% dos 5,7 mil membros) e brancos (94%), perdeu a chance de indicar a primeira mulher negra ao prêmio de melhor direção e o ator David Oyelowo, por sua atuação inspirada no papel de Martin Luther King Jr.

É interessante que a própria trama do filme seja justamente o direito à representatividade. Tendo como eixo a vida de Luther King, o longa narra as marchas dos negros da cidade de Selma a Montgomery, em 1965. O protesto era pelo direito ao voto, que, apesar de já assegurado por lei, era impedido pelos servidores da Justiça. Foi preciso apenas uma cena para resumir a frieza com que os negros eram tratados quando se dirigiam ao Tribunal de Selma para se registrarem como eleitores. E é admirável que o momento seja protagonizado por uma mulher (Oprah Winfrey, no papel de Annie Lee Cooper), em apenas mais um dos vários episódios revoltantes retratados no longa.

Mais do que retratar a marcha, o filme traz também bastidores políticos que mostram de forma crível a passividade do presidente Lyndon Johnson (vivido com firmeza por Tom Wilkinson) e a perversidade do governador do Alabama, George Wallace, além de uma importante participação de Malcom X. Outro destaque é a relação do líder com sua esposa, Coretta, que vive um dilema entre participar da luta e proteger sua família. A relação também humaniza King ao revelar suas fraquezas sem que a situação se torne novelesca.

Assim como 12 Anos de Escravidão, Selma é capaz de provocar perplexidade e revolta em qualquer espectador com um pouco de consciência social, principalmente nas cenas em que os manifestantes são brutalmente agredidos pelos policiais. Com o argumento de que os ativistas estariam “interrompendo o trânsito”, os repressores não hesitam em bater, chicotear e espancar os manifestantes. Vale destacar aí o trabalho da diretora Ava DuVernay, ao retratar esses momentos – que realmente ocorreram no passado – sem qualquer melodrama, usando o silêncio como recurso para conferir tensão.

Mais revoltante ainda é o fato de essas cenas ainda ecoarem nos dias atuais, em fatos absurdos como o assassinato do jovem Michael Brown, na cidade de Ferguson. E, embora represente um momento específico dos Estados Unidos, o filme é universal, encontrando reflexo, por exemplo, no extermínio da juventude negra no Brasil. Selma, então, se torna ainda mais chocante ao constatarmos que a violência contra os negros não é um triste episódio de um passado escravagista, mas uma realidade que continua atual.

Não há dúvidas acerca da importância que a marcha de Selma teve para a democracia estadunidense e (por que não?) mundial. O fato é celebrado no filme com o final otimista, tendo como destaque um lindo e idealista discurso de King. É inegável, no entanto, que esta marcha está longe de terminar.

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Nortista vivendo no sul. Escreve preferencialmente sobre políticas culturais, culturas populares, memória e patrimônio.
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