Vingadores: Era de Ultron (Avengers: Age of Ultron, EUA, 2015)
Direção e roteiro: Joss Whedon
Com: Robert Downey Jr., Chris Evans, Mark Ruffalo, Chris Hemsworth, Scarlett Johansson, Jeremy Renner, Elizabeth Olsen, Aaron Taylor-Johnson, Paul Bettany, Cobie Smulders, Samuel L. Jackson, Don Cheadle, Andy Serkis, Thomas Krestchmann, Claudia Kim, Linda Cardellini, Anthony Mackie, Stellan Skarsgård, Julie Delpy, Hayley Atwell, Idris Elba e as vozes de Lou Ferrigno e James Spader.
Em 2012, Os Vingadores era um passo fundamental, mas ainda incipiente, no estabelecimento do Universo Marvel como algo viável no cinema. Assim, um motivo que levou algumas pessoas a torcer o nariz para o filme é que, com tantos elementos para unir, a trama soava quase banal – algo que, pessoalmente, não considerei problemático naquele trabalho de Joss Whedon. Aqui, isso surge diferente e acaba pesando tanto a favor quanto contra a nova reunião dos Maiores Heróis da Terra: se por um lado a trama já é posta em movimento desde o início (e, de modo geral, funciona bem), esta acaba prejudicada pela inclinação de Whedon por complicá-la mais do que seria necessário.
Fica claro que, depois dos eventos de Capitão América 2, os Vingadores se reagruparam para desbaratar as operações remanescentes da HIDRA – e já na sequência de abertura, o grupo se aproxima da última base, que abriga não apenas o cetro usado por Loki, mas também os poderosos gêmeos Wanda e Pietro Maximoff (Olsen e Taylor-Johnson). A missão é bem-sucedida, mas Tony Stark, manipulado por Wanda, decide usar o cetro para criar Ultron (Spader), um programa que deveria manter ameaças contra a Terra sob controle. No entanto, o programa torna-se senciente e passa a encarar os próprios heróis (e, por tabela, seus protegidos) como uma calamidade a ser neutralizada. Sem possuir uma forma física definitiva, Ultron parte pelo mundo em busca dos recursos necessários para ganhar um corpo permanente e ainda mais poderoso, lançando os Vingadores numa corrida desesperada para impedi-lo.
Resgatando a atmosfera que fez da primeira reunião uma experiência tão divertida, Era de Ultron volta a se sair bem na constante troca de provocações entre os heróis, que não apenas fazem rir na maior parte das vezes como também deixam claro que a harmonia entre seres tão poderosos é extremamente delicada. Há espaço para aproximações, como a subtrama envolvendo Bruce Banner e a Viúva Negra, mas as divisões logo passam a prevalecer – notadamente graças à disposição de Stark de tomar atitudes controversas sem consultar os demais, o que aborrece particularmente Steve Rogers. Da mesma forma, seguindo o plano de longo prazo da Marvel, elementos importantes para filmes futuros são introduzidos organicamente já nesta trama, como Wakanda, lar do Pantera Negra, a diferença da concepção de heroísmo entre Stark e Rogers e uma nova Joia do Infinito.
O problema é que, como dito, por vezes Joss Whedon faz as vias mais complicadas para chegar a determinado ponto sem muita necessidade para tal – e nem sempre deixando claro seu propósito. Por que, por exemplo, Ultron mantém Natasha viva depois de capturá-la? O que aconteceu no tal poço visitado por Thor que o levou a tomar determinada atitude com relação ao corpo sintético de Ultron? E por que precisaria da ajuda de Selvig? Aliás, qual a natureza do poço? São faltas graves tendo em vista que estes filmes tem fiado grande parte do seu sucesso menos em seus eventos do que na maneira com que estes se desenrolam. Além disso, é lamentável que alguns personagens sejam saiam de cena sem tempo de provocar uma impressão maior: se o Ulysses Klaue de Andy Serkis ao menos deve retornar nas futuras histórias com o Pantera Negra, o Barão von Strucker de Thomas Krestchmann jamais chega a dizer a que veio.
Mesmo assumindo um tom mais sombrio que a primeira parte, Whedon é bem-sucedido em evitar (com razão) uma narrativa muito pesada – e grande parte disso deve-se a Ultron: embora seu desejo de violência cresça ao longo de todo o filme, o sistema também aprende com os dados que absorve pela Internet, fazendo constantes citações literárias e identificando-se especialmente com a “libertação dos fios” de Pinóquio (a canção “I’ve Got No Strings” do clássico de 1940 é ouvida em certo momento). Isso, somado à caracterização cínica de James Spader e aos excelentes efeitos visuais, até compensa os planos de Ultron serem confusos e clichês. E se Aaron Taylor-Johnson, mesmo irreverente, acaba ficando à sombra da performance de Evan Peters em X-Men: Dias de um Futuro Esquecido (cujo Mercúrio teve bem menos tempo de tela), Elizabeth Olsen confere às habilidades de Wanda Maximoff um ar que flerta com o sadismo, sendo na prática a figura que mais dá trabalho aos Vingadores. Da equipe original, quem se beneficia com mais exposição são Jeremy Renner e Mark Ruffalo: enquanto o primeiro confere a Clint Barton um senso de humor cortante e irônico, o segundo conduz com sensibilidade a queda de confiança de Banner em suas próprias habilidades, que cresce até um novo desejo de isolamento.
Contando com composições de quadro que realmente parecem saídas de uma HQ, Vingadores 2 volta a acertar na condução das sequências de ação, tanto em estilo (vemos novamente um impossível plano sem cortes que mostra os heróis lutando em pontos diferentes) quanto em intensidade, evitando os cortes frenéticos e combinando os poderes e gadgets dos heróis de forma eficaz. Dentre essas sequências, merecem destaque o ataque ao castelo na Sokovia, ainda na abertura do filme, e a longa perseguição nas ruas na Coreia do Sul. Já a antecipada luta entre o Hulk e Tony Stark, embora eficaz em estabelecer a fúria desproporcional do verdão, acaba se prolongando bem mais do que o ideal. Por outro lado, Whedon se sai especialmente bem na atmosfera sinistra das visões induzidas por Wanda, especialmente a de Stark (que remete ao desfecho do primeiro filme) e a de Thor.
Superior a Homem de Ferro 3 e Thor: O Mundo Sombrio, mas deixando um pouco a desejar frente à excelência de Capitão América 2 e Guardiões da Galáxia, Era de Ultron é mais um passo sólido da Marvel Studios na construção de um universo compartilhado. Apesar de suas falhas e de perder um pouco de fôlego no terceiro ato, mantém uma expectativa promissora pelo futuro da franquia – o que não é pouca coisa tendo em vista a quantidade de personagens pouco conhecidos a serem introduzidos nos próximos anos (e que deixa a tarefa da Warner com a DC ainda mais complicada). Mas conter-se um pouco no fan service não fará mal algum.
OBS: Evite a versão em 3D do filme, que, além de convertida, compromete a clareza das imagens (as várias sequências em ambientes escuros visivelmente não tiveram qualquer compensação).
Não li o texto, mas esse título, pelamor. Toda imprensa especialista em cultura pop ou blogueiro ou vlogueiro que se ache apto a escrever sobre esse conteúdo já lançou variações desse tipo com “filme sombrio”, como se fosse algo bom (é genérico, simplesmente) ou falando do “bom humor”. Vamos abolir os lugares comuns, senão toda crítica acaba sendo parecida. Mesmo que não se leia o conteúdo e ele contenha um pensamento mais ou menos original, perde-se a vontade em lê-lo com essa abertura.