Mostra exibe filmes inéditos produzidos por indígenas na Sala Redenção

Filme "Para onde foram as andorinhas?" integra a programação (Foto: reprodução)
Filme “Para onde foram as andorinhas?” integra a programação (Foto: reprodução)

por Lorenzo Leuck

Visibilizar a diversidade cultural e a situação dos índios no Brasil é a proposta da Tela Indígena, mostra de filmes promovida pelo Núcleo de Antropologia das Sociedades Indígenas e Tradicionais da UFRGS, que prima por trazer obras de cineastas indígenas e  convidados/as para debatê-las com a comunidade. Com entrada gratuita, as sessões ocorrem sempre às 19h na Sala Redenção na terceira quarta-feira de cada mês.

Em  2017, a mostra chega a sua 2ª edição trazendo filmes ainda não exibidos na cidade, como o documentário Martírio, de Vincent CarelliAtravés de longas, ficções, curtas, animações e documentários os cineastas indígenas e indigenistas vêm lutando com a câmera na mão. Mostrando a visão daqueles que raramente são vistos, filmam a nós e a eles mesmos mudando a narrativa e nos provocando a sensação de estarmos com os pés fixos no chão, pois nos mostram o seu lado da história.

Na última sessão, realizada dia 15 de março, foram exibidos um mini documentário que retrata as vivências das comunidades Guarani de nova Tekoa, aldeia retomada em Maquiné, e dois curtas sobre as opressões impostas a povos indígena no regime militar. Jaider Esbel, artista visual makuxi, e Ailton Krenak, reconhecida liderança indígena (confira nossa entrevista com o escritor), foram os convidados desta sessão.

GRIN, de Isael Maxakali e Rony Freitas, apresenta relatos das violências sofridas pelos Maxakalis e Krenaks durante a formação da guarda rural indígena, em Minas Gerais.

Mato Eles?, de Sergio Bianchi, mescla fatos e encenações para mostrar como Kaingangs, Guaranis e Xetás foram obrigados a trabalhar no corte e extração de madeira de sua própria reserva, numa madeireira criada pela FUNAI no Paraná.

"Mato Eles?", de Sergio Bianchi (foto: reprodução)
“Mato Eles?”, de Sergio Bianchi (foto: reprodução)

No debate após a exibição dos filmes, Krenak cumprimentou o “parente” por levar a todos os cantos do Brasil, sem qualquer tipo de patrocínio, sua exposição “Amazon it was – Era uma vez a Amazônia”, na qual ele retrata tradições de diversas tribos e os efeitos da devastação da natureza. Na próxima quarta-feira (29), às 15h, o artista ministra uma palestra abordando seu processo criativo e o mercado da arte no ateliê O Bestiário (av. Cristóvão Colombo, 51).

Ambos saudaram a retomada da aldeia Guarani, esclarecendo dúvidas sobre o cultivo da terra o significado de ações como essa a comunidades tradicionais. Quanto às experiências repressivas relatadas nos curtas, definiram como “atos terroristas do Estado brasileiro”.

Para Krenak, esse período, em que índios eram torturados e humilhados em verdadeiros campos de concentração, é um dos mais execráveis da nossa história. Ele também questionou o quão distante estamos dessa realidade: Hoje calamidades e expurgos ainda acontecem, mas são ignorados devido a um conluio cínico que trucida os mais fracos.

“Golpe, judiciário corrupto, multidões indo às ruas com bandeiras dos Estados Unidos, o que mais precisa acontecer para entendermos o quê está em jogo? alertou. “Regimes de opressão são coisas singelas”, disse ainda, “que  aos poucos se constituem pela naturalização da violência no convívio e na mentalidade da população”.

"Martírio" acompanha a luta dos kaiowá por décadas (Foto: divulgação)
“Martírio” acompanha a luta dos kaiowá por décadas (Foto: divulgação)

Jaider revelou que sua obra concerne “Quem é o índio?”, questão que o leva a apresentar histórias ancestrais de maneira atualizada, buscando uma conectividade máxima entre os seus saberes.

“A arte consegue desvendar o que a política, a religião e a filosofia deixam de lado”, incutiu sobre esse trabalho de comunicar um sentimento individual que representa toda uma coletividade. Ele apontou que isso é tanto um ato de celebração como uma responsabilidade, pois é ao fortalecer a identidade cultural, respeitando a diversidade de cada etnia sociedade, e mostrando como a sociedade funciona, que se combate ao extermínio.

“Há quanto tempo nós estamos morrendo?”, indagou a Xamã Kaingang, Iracema Rã-nga Nascimento, que quis falar após a cena de “Mato eles?” onde se relata o óbito de um índio militante por “atropelamento normal”.

Em relação a atual crise política, Iracema pontuou “Não é só pelo povo indígena que eu choro, mas por todo povo brasileiro que trabalha noite e dia. Estamos muito cansados, e enquanto dormimos é emenda, emenda e emenda”

Resolver isso, segundo ela, só será possível se nos unirmos. “Nossa luta tem que ser lá! ” incitou a líder ao encerrar da sessão.

Confira a programação completa:motra tela indígena

15/03 – GRIN (35min) e Mato eles? (34min)

Convidados: Ailton Krenak e Jaider Esbell

19/04 – Cordilheira da amora II (10 min) e Tekowe Nhepyrun – A Origem da alma (50 min)

Convidados: Lideranças guarani

17/05 – Martírio (160 min)

21/06 – Para onde foram as andorinhas? (21 min) e Belo Monte: depois da inundação (52 min)

19/07 – Ãgtux (22min) e ETE Londres (30min)

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