Mac DeMarco e a vitória do desleixo

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Com seu estilo ‘largado’, canadense faz uma longa pausa no meio da jam

Texto e Fotos: Fernando Halal

A breve passagem do canadense Mac DeMarco pela Capital só contribuiu para aumentar o folclore em torno da figura. Notório apreciador de churrasco, o músico mal terminara o almoço num espeto corrido a.k.a. rodízio de churras e sua foto já tinha virado meme nas redes sociais; do palco, arriscou um mosh raras vezes visto no Opinião e ainda voltou com um cigarrinho suspeito no canto da boca; e encerrou a noite da única maneira possível, cantando “Total Eclipse of the Heart” num videokê. Por tudo isso, é meio chato e deprê constatar que o show do dia 25 foi, bem, um tanto quanto morno.

Estamos falando do fenômeno indie que convida fãs para um café em sua casa, lança clipes onde dá à luz bebês-repolho, que anunciou um par de tênis velhos para leilão online (vendido por 20 mil dólares) antes de ser regravado por Wiz Khalifa, torturado por Eric Andre e preso por engano durante o seu próprio show (!).

Ou seja, foi uma apresentação “morna” em relação à trajetória esquizofrênica do rapaz, mesmo porque é difícil bater tanta bizarrice. Mas não se engane: trata-se de um dos shows mais toscos e despudorados que tem por aí. É o tipo de espetáculo que um ouvinte médio de classic rock certamente teria dificuldade em assimilar. Aqui, a filosofia “zoeira never ends” reina absoluta; tanto faz se o som está bom ou não, se há um ou outro instrumento desafinado. Vamos nos divertir e o resto que se exploda.

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Andrew Charles White garante peso e suíngue ao som da banda

A começar pela estética mendigo-chique do cantor: camiseta cinza larga e empoeirada, calça nas canelas, um cinto de couro entrelaçado igual ao do meu avô, tênis bamba azul-calcinha e botons dos Simpsons enfeitando a correia da guitarra. Com um semblante meio apático, ele parece comandar uma espécie de anti-concerto de rock, com a ajuda de uma banda de apoio igualmente lesada: Joe Lent, o tecladista careteiro de boné do Star Wars, passa a noite falando sozinho, bocejando e tentando alcançar o ritmo de cada música. Ele é sempre assim? O guitarrista/tecladista Andrew Charles White toca de pés descalços, faz alongamentos entre uma música e outra como se estivesse no meio do mato e ainda pratica o bullying com o técnico de áudio (“ele tem dois paus e cinco bolas”). O próprio Mac não está nem aí para nada – se tiver que sentar por 10 minutos no centro do palco, para contemplar não-se-sabe-o-quê enquanto vai catando os cigarros que a plateia joga para ele, ele vai sentar. O público dá risada a cada improviso do grupo, que ainda tem Pierce McGarry (baixo) e Joe McMurray (bateria).

“The Way You’d Love Her” abre a noite, já com os indefectíveis timbres forjados em madrugadas regadas a psicotrópicos e FMs bregas. A partir daí, eles tocam 15 canções em pouco mais de 1h30min. A primeira a ser acompanhada com vontade por todo o povo é “Ode to Viceroy”, a sétima do setlist.

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Fãs se esbaldaram na segunda passagem do artista pela Capital

Por sinal, o séquito de fãs de Mac DeMarco só aumenta – em relação à sua estreia por aqui, pouco mais de um ano atrás, houve acréscimo de quase mil pagantes. Alguns deles se comportavam como se quisessem competir com algum vídeo sobre a beatlemania que viram no YouTube, tamanha a devoção apresentada em atitudes e no visual igualmente despojado.

Houve espaço para repassar toda a breve discografia. “Chamber of Reflection” foi recebida com u-hus, “No Other Heart” derretou corações apaixonados e a suingada “Freaking Out The Neighborhood” ganhou peso ao vivo, em outro grande momento.

A noite teve fim ao som de “Still Together”, em que Mac arrisca um falsete de doer os ouvidos, sem medo de ser feliz, para depois se atirar na plateia. Histeria coletiva, claro (confira o vídeo abaixo).

Para decepção de alguns, não teve “Dreamin”, “Brother” ou “My Kind of Woman”, esta a mais pedida nas enquetes online. Também não rolou bis. O desleixo venceu mas ninguém reclamou. Esse Mac DeMarco é uma laje.

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